sábado, 1 de março de 2014

03 - TGP - Jurisdição

Direito Processual Civil: Ramo do direito no qual predominam normas de matéria pública, que trata das regras e princípios que regem a Jurisdição civil, ou seja, a aplicação da lei aos casos concretos com o objetivo de solucionar conflitos de interesses não penais pelo Estado-Juiz.

Institutos Fundamentais do Direito Processual

O Direito Processual tem como institutos fundamentais, ou estruturais de seu conteúdo, 3 instituições que são: o processo, a ação, e a jurisdição. São institutos fundamentais à medida que não há possibilidade de uma relação processual sem qualquer deles. Logo, a Teoria Geral do Processo exige um enfoque inicial sobre cada um deles, para que se facilite a compreensão dos temas mais gerais do Direito Processual.


I - Jurisdição (CPC, art. 1º e 2º)

1) Conceito

Jurisdição é uma das formas existentes para solução de conflitos, dentre as quais podemos citar as seguintes:

1.1) Autotutela: é a satisfação de uma pretensão por força própria de um dos envolvidos. Não há participação de um terceiro, mas apenas a imposição da decisão de uma das próprias partes aos demais.


1.2) Autocomposição: a solução obtida quando uma das partes (ou ambas) renunciam a seu interesse total ou parcialmente. Pode ou não haver a participação de um terceiro, mas é obtida por meio dos próprios envolvidos que constroem a solução por meio de concessões. É estimulada em nosso ordenamento jurídico (ex.: CPC, art. 125, IV; art. 331).


1.3) Arbitragem: a solução é obtida por meio da intervenção de um terceiro de confiança mútua das partes, que decidirá de forma obrigatória. Portanto, o conflito é resolvido por uma pessoa escolhida pessoalmente pelos envolvidos (árbitro) por meio de trâmites bastante simplificados e sem parâmetros legais rígidos. As partes escolhem que o seu conflito será resolvido pela arbitragem por meio da convenção de arbitragem, que pode ser de duas espécies:

a) Cláusula Compromissória: é uma Cláusula de um Contrato, convencionando que eventual litígio dele decorrente será submetido ao árbitro (conflito futuro e incerto);

b) Compromisso Arbitral: ajuste que cria a arbitragem para um caso concreto, escolhendo o árbitro e o critério para julgamento (conflito atual e específico).

  • Divergências sobre a natureza jurídica da arbitragem. Alguns entendem que é espécie de Jurisdição. A maioria defende que é um equivalente jurisdicional, ou seja, alternativo para solução de conflitos, e que não faz coisa julgada (ou seja, pode ser anulado pelo Judiciário), sendo a Jurisdição indelegável, ressaltando que somente o Estado tem o direito de usar de medidas de execução e cautelar.

1.4) Jurisdição: a solução é obtida por meio da intervenção de um terceiro que, substituindo as partes de forma cogente, impõe sua decisão.

Tradicionalmente, a Jurisdição era entendida como o poder de dizer o direito no caso concreto, visando a justa composição da lide. Modernamente, os doutrinadores diferenciam lide real da lide presumida:

a) Lide real: conflito entre as partes, condenando uma efetivamente à pretensão da outra;

b) Lide presumida: ocorre quando não há conflito entre as partes, mas a lei impõe alguma resistência à pretensão delas. Ex.: separação consensual, mas com filho menor (o Estado deve dizer a respeito do filho, guarda, visitas, alimentos);

Nessa linha, na chamada Jurisdição contenciosa, fala-se que a lide é real, e que na Jurisdição voluntária, ela é presumida.

Jurisdição é o poder, dever, função ou atividade do Estado que, substituindo os envolvidos, resolve os conflitos com definitividade, visando a pacificação social.


2) Escopos ou finalidades específicas da Jurisdição

a) Escopos sociais (metas): pacificação social e aproximação do Judiciário da sociedade;

b) Escopos educacionais: educação das partes e demais jurisdicionados sobre seus deveres/interesses;

c) Escopo jurídico: aplicação do Direito ao caso concreto;

d) Escopo político: afirmação do Poder do Estado, culto às liberdades públicas e permissão da participação do povo nas decisões sobre os destinos da sociedade (ações populares, ações civis públicas).


3) Princípios da Jurisdição

3.1) Indeclinabilidade: o Juiz não pode se escusar de julgar, ainda que exista lacuna na Lei;


3.2) Inevitabilidade: as partes não podem se recusar a se submeter à atividade jurisdicional; 

  • Exceções: arbitragem; nomeação à autoria (o nomeado é citado e se recusa a assumir o polo passivo).


3.3) Juiz Natural: a Jurisdição é exercida por um Juiz independente e imparcial, indicado por normas constitucionais e legais. Possui dois aspectos:

a) Proíbe o Estado de criar tribunais de exceção. Obs.: as varas especializadas, mesmo quando criadas quando já iniciados os processos, não ferem este princípio, pois sua competência foi fixada por regras gerais, abstratas e objetivas;

b) Proíbe as partes de escolherem o Juízo onde irão demandar. É por isso que o CPC, art. 253, II prevê que se uma ação for extinta e depois repetida, ainda que com alteração parcial dos polos, deve ser distribuída àquele mesmo Juízo (prevento).


3.4) Investidura: a Jurisdição só pode ser exercida por autoridade regularmente investida na função jurisdicional.


3.5) Territorialidade ou Aderência ao Território: o Estado brasileiro tem Jurisdição em todo o território nacional. No entanto, os órgãos jurisdicionais exercem a Jurisdição dentro de uma área pré estabelecida pelas regras de competência. Exceções:

a) CPC, art. 107 - quando o imóvel se situa em mais de uma comarca, o Juízo de qualquer uma delas pode decidir sobre o imóvel inteiro;

b) CPC, art. 230 - permite a citação e intimação por Oficial de Justiça nas comarcas contíguas e de fácil acesso, e nas comarcas da mesma região metropolitana;

c) CPC, art. 659, §5º - permite a penhora de um imóvel em qualquer lugar do país, com base em sua certidão de matricula, situação em que cumprirá ao exequente providenciar a averbação no ofício.


3.6) Indelegabilidade: o poder jurisdicional não pode ser delegado, pois pertence ao Estado, e não ao Juiz. Possui dois aspectos importantes:

a) Aspecto externo: o Poder Judiciário não pode delegar suas funções a outro Poder;

b) Aspecto interno: um órgão jurisdicional não pode delegar suas funções a outro órgão jurisdicional. Exceções:

  • A CF/88, art. 93, XI autoriza que os Tribunais com mais de 15 membros criem um Órgão Especial para exercer as funções do Tribunal Pleno. Este Órgão Especial terá entre 11 e 25 membros;
  • A CF/88, art. 102, I, m, autoriza que o STF delegue aos órgãos de Primeiro Grau a execução de seus julgados, aí incluídos apenas atos materiais, como penhora, avaliação e leilão. Os atos decisórios não serão delegados. Essa possibilidade de delegação se estende a todos os tribunais.
Obs.: a carta precatória não faz delegação, pois para delegar é preciso ter competência para tal ato, e o Juiz deprecante não o tem.


3.7) Inafastabilidade ou Acesso à Justiça: nenhuma lesão ou ameaça de lesão a direto será afastada da apreciação do Poder Judiciário. Acesso a uma ordem jurídica justa. Desse princípio decorrem duas regras:

a) As decisões administrativas podem sempre ser revista pelo Judiciário. No Brasil, ao contrário de outros países como França, não existe o chamado contencioso administrativo pelo qual algumas matérias são julgadas apenas na via administrativa, não podendo ser revisto pelo Judiciário.

b) Não é necessário esgotar as vias administrativas para submeter a questão ao Poder Judiciário (salvo no caso da Justiça Desportiva, por expressa previsão constitucional - CF/88, art. 217, §1º);
  • Atualização: O Supremo Tribunal Federal (STF), em sessão plenária de 27/08/2014, deu parcial provimento ao RE nº 631.240, com repercussão geral reconhecida, em que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) defendia a exigência de prévio requerimento administrativo antes de o segurado recorrer à Justiça para a concessão de benefício previdenciário. Por maioria de votos, o Plenário acompanhou o relator, ministro Luís Roberto Barroso, no entendimento de que a exigência não fere a garantia de livre acesso ao Judiciário, previsto no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal, pois sem pedido administrativo anterior, não fica caracterizada lesão ou ameaça de direito.

PGFN 2015
6- Tomando-se por base o direito constitucional brasileiro, é correto afirmar que:
GABARITO: e) o princípio da inafastabilidade da apreciação pelo Judiciário de lesão ou ameaça a direito autoriza que, mesmo em caso de guerra, o Judiciário mantenha sua jurisdição.



4) Características da Jurisdição

4.1) Substitutividade: ao exercer a Jurisdição, o Juiz, em regra, substitui as partes na solução dos conflitos. 
  • Exceção: meios coercitivos, como astreintes (multas diárias em obrigações de fazer, não fazer ou entrega de coisa, multa do CPC, art. 475-J, que são meios de execução indireta);
  • Outro meio de execução indireta, mas que não é coercitivo, são as sanções premiais, que são vantagens oferecidas para quem cumpre a obrigação espontaneamente, como a não condenação em custas e honorários em monitória cuja dívida é paga em até 15 dias).

4.2) Definitividade: a Jurisdição produz resultados imutáveis. Em outras palavras, gera a chamada coisa julgada material, o que somente é feito pela Jurisdição;

  • Exceção: não há coisa julgada nas cautelares, nas ações civis públicas e nas ações populares julgadas improcedentes por falta de provas.


4.3) Inércia: a Jurisdição somente atua mediante provocação da parte;
  • Exceção: hipóteses em que o Juiz atua de ofício, como na Jurisdição Voluntária (CPC, art. 1.113) e inventário de ofício (CPC, art. 989);
  • No entanto, depois de iniciado o processo, vigora o Princípio do Impulso Oficial, que manda o juiz conduzir o processo até o fim (CPC, art. 2º e 262).


4.4) Unidade: a jurisdição é una, ou seja, não comporta divisões, sendo que apenas por razões didáticas são feitas classificações.


4.5) Contenciosidade e Voluntariedade: a Jurisdição pode ser também classificada quanto a existência ou não de confronto de direitos dos envolvidos na relação processual:

a) Jurisdição Contenciosa: há confronto de direitos dos envolvidos, cabendo ao Juiz apontar qual deles deve prevalecer;

b) Jurisdição Voluntária: não há confronto de direitos dos envolvidos, mas o ordenamento impõe que o resultado pretendido pelos envolvidos somente possa ser alcançado após o processo judicial. É o que a doutrina também chama de administração pública de interesses privados;
  • Existe divergência quanto a Voluntária ser realmente Jurisdição. Para alguns, não se trata de jurisdição porque não há lide, ou seja, não há pretensão resistida nesses casos, mas para outros trata-se de Jurisdição, pois haveria uma lide ficta, uma vez que o ordenamento exige essa participação da jurisdição diante dos diversos interesses envolvidos.


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