terça-feira, 11 de março de 2014

05 - Desoneração Fiscal - Imunidades


1) Formas de Exoneração Fiscal

Há conceitos conexos no âmbito jurídico e prático que, todavia, não se confundem (têm conformação jurídica e efeitos bastante diferentes no plano normativo). Imunidade, isenção, não-incidência e alíquota zero, do ponto de vista prático resultam em nada a pagar (obrigação principal, muito embora essa desoneração possa ainda exigir obrigação acessória), mas a estruturação jurídica é bem distinta.

a) Isenção: estudada na análise do tópico Exclusão do Crédito Tributário

b) Não Incidência: todos os fatos não abrangidos pela tributação. Ex.: Imposto de Renda sobre verbas indenizatórias.

c) Alíquota Zero: trata-se de instrumento de regulação da economia. A obrigação tributária existe, mas, em face de seu cálculo, o resultado é zero.

d) Imunidade: trata-se de limitação ao poder de tributar. Pode ser conceituada como a proibição constitucional de se tributar determinadas matérias e pessoas. Para alguns doutrinadores, seria uma norma de incompetência constitucional. Tendo em vista que abrange situações que o constituinte entendeu como muito importantes para o país, sua interpretação, segundo o STF, será extensiva.
"A norma da alínea a do inciso VI do art. 150 da CF obstaculiza a incidência recíproca de impostos, considerada a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. Descabe introduzir no preceito, à mercê de interpretação, exceção não contemplada, distinguindo os ganhos resultantes de operações financeiras." (AI 172.890-AgR)

2) Descendo à Imunidade

O constituinte (originário ou reformador) estabelece, em regra, o campo de incidência de um tributo cuja competência é atribuída a um Ente Federativo, o que, por consequência, gera o campo de não-incidência (tudo o que não ficou abrangido pela delimitação do campo de incidência). Ex.: ao prever a incidência de IPI, cuja competência foi atribuída à União, o campo de incidência (produto industrializado, expressão mais ampla do que industrialização) resulta na não-incidência de IPI em todos os produtos in natura.

A imunidade é, em princípio, hipótese que estaria no campo de incidência delimitado pela Constituição, mas a própria Constituição exclui tal hipótese do campo de incidência. Assim, a distinção entre não-incidência e imunidade é sutil, pois ambas decorrem de previsão constitucional, diferenciando-se apenas na potencial (mas não realizada) inclusão da hipótese imune no campo de incidência. Há muitos casos nos quais a Constituição emprega a expressão "isenção" para desonerar determinadas incidências, mas por certo, se trata juridicamente de imunidade. Ex.: art. 184, §5º (ITBI na transferência de imóveis para fins de reforma agrária) e 195, §7º (contribuições sociais para entidades assistenciais).

Já a isenção é a desoneração de uma operação que está no campo de incidência estabelecido pela Constituição, porém, por ato normativo do titular da competência infraconstitucional. Em regra, a isenção é estabelecida por lei ordinária, mas há casos de outros atos normativos exigidos. Ex.: isenções de ICMS por Convênios do Confaz. Há complexa discussão teórica se na isenção ocorre o fato gerador ou não (tema estudado na sequência da matéria).

A alíquota zero corresponde à hipótese na qual não há imunidade nem isenção, mas o elemento quantitativo "alíquota" é zero, de tal modo que a incidência resulta em nada a pagar. Essa distinção se justifica por vários aspectos, dentre eles a possibilidade de decretos alterarem alíquotas de alguns tributos. Ex.: art. 153, §1º (permite ao Decreto Presidencial reduzir alíquotas a zero e elevá-las dentro dos limites de lei). Esta é uma mobilidade que a isenção não proporciona, por estar submetida à Lei em sentido estrito como regra (art. 150, §6º). O STF aceita a distinção entre isenção e alíquota zero.

Há divergências quanto as imunidades serem cláusulas pétreas. Por certo algumas hipóteses o são, até porque o STF reconheceu em ADI que a imunidade recíproca prevista no art. 150, VI, a, é cláusula pétrea em favor da autonomia financeira necessária às Unidades Federativas (art. 5º. §2º c/c art. 60, §4º, I c/c art. 150, VI, a). Contudo, já houve revogação, por Emenda tida constitucional, de imunidade prevista no art. 153 para proventos de aposentadoria pagos a idosos (atualmente remanesce isenção na legislação ordinária).

Por se tratar de desoneração, as hipóteses de imunidade são tidas como "benefícios" (embora não seja adequado falar em "favor"), de tal modo que preceitos normativos que as estabelecem devem ser interpretados restritivamente - CTN, art. 111.


3) Classificação da Imunidade

Há diversas maneiras de se classificar as imunidades no Sistema Tributário Nacional.

3.1) Quanto à Abrangência:

a) Gerais: alcançam dois ou mais tributos, ou espécies tributárias (ainda que impostos). Ex.: imunidades do art. 150, VI, alcançam todos os impostos sobre patrimônio, renda e serviços;

b) Especificas: alcançam apenas uma parte de um tributo. Ex.: imunidades em relação à exportação de produtos industrializados para fins de IPI.

Essa classificação é presente na doutrina, mas nem sempre de forma adequada, pois há vários casos que mereceriam ser considerados como imunidades gerais e ainda vêm apresentados como específicas. Ex.: em regra, não incide tributo na exportação de produto industrializado.


3.2) Quanto a Condições

a) Condicionadas: a Constituição ou leis autorizadas pelo constituinte estabelecem requisitos que condicionam a imunidade. Ex.:imunidade para instituições de assistência social, na forma do art. 150, VI, c;

b) Não condicionadas: não há exigência da parte do constituinte. Ex.: imunidade recíproca do art. 150, VI, a.


3.3) Quanto ao Destinatário

a) Pessoais: a imunidade destina-se a pessoas físicas ou jurídicas, ou até a universalidades;

b) Materiais: a imunidade destina-se a um bem ou serviço, ainda que fornecido ou prestado por pessoa tributada. Ex.: art. 150, VI, d - livros, jornais e periódicos.

Há diversas previsões cuidando de imunidades na CF/88, dentre elas art. 149, §2º; art. 150, VI; art. 153, §§3º e 4º; art. 155, §2º, X, a e b; art. 155, §3º; art. 156, §2º, I; art. 184, §5º; art; 195, §7º.


4) Imunidades em Espécie

4.1) Imunidade Genérica: CF/88, art. 150, VI.

Essas imunidades gerais restringem-se apenas a impostos, vale dizer, nenhuma delas alcança qualquer outra modalidade tributária (embora algumas modalidades tributárias possam ter imunidades equivalentes. Ex.: art. 150, VI, c, é parcialmente semelhante à imunidade do art. 195, §7º).

Em regra, as imunidades pessoais do art. 150, VI, cuidam de impostos sobre patrimônio, renda e serviços, ao passo que as imunidades materiais cuidam de qualquer imposto. Considerando que imunidades devem ser interpretadas restritivamente, a expressão "renda" compreende o IR, patrimônio alcança tanto o estático (IPTU, IPVA e ITR) quanto o em movimento (ITBI, ITCD), havendo grande discussão em relação a tributos circulatórios indiretos (IPI, ICMS transferidos do vendedor para o comprador), e serviços (ICMS e ISS).

Há argumentos no sentido de que todo imposto repercute sobre o patrimônio, razão pela qual qualquer imposto não poderia ser cobrado em relação às pessoas beneficiadas com a imunidade do art. 150, VI.


a) Imunidade Recíproca: visa fortalecer a Federação. Entes Federativos, suas autarquias e fundações públicas estão proibidos de cobrar impostos uns dos outros sobre a renda, o patrimônio e os serviços. Atinge as autarquias e fundações apenas naquilo que tiver relação com suas atividades essenciais. Ex.: União destina um imóvel para que seja um campo de golfe. Neste caso, o imóvel é imune ao IPTU. Por outro lado, caso o INSS (autarquia federal) faça a mesma coisa, não haverá imunidade, pois a atividade principal do INSS é ligada à previdência social.

Obs.: a imunidade recíproca:
- não abrange as concessionárias de serviços públicos; 
- exclui os Entes da Administração Direta e Indireta nas atividades econômicas regidas por regime jurídico de direito privado;
- não exime promitente comprador do recolhimento do IPTU e ITBI de imóvel transcrito em nome de Ente Público (CF/88, art. 150, §3º).
CESPE AGU 2012, Questão 5) As empresas públicas e as sociedades de economia mista não se sujeitam à falência e, ao contrário destas, aquelas podem obter do Estado imunidade tributária e de impostos sobre patrimônio, renda e serviços vinculados às suas finalidades essenciais ou delas decorrentes.
A questão 5 acima está ERRADA, já que a eventual concessão de imunidades para as sociedades de economia mista (pessoa jurídica de direito privado) violaria a isonomia que deve vigorar entre as pessoas que disputam mercado.


b) Imunidade dos Templos: visa proteger a liberdade de culto. Incide sobre as atividades essenciais de determinada religião, e não apenas sobre os prédios das instituições.
Ex.: não incide IR sobre o dízimo, ou ISS sobre os valores cobrados para celebração de casamento.


c) Imunidade dos Livros, Jornais e Periódicos, e do papel utilizado em sua confecção: visa facilitar a difusão da cultura e a liberdade de expressão. Segundo o STF, abrange o ISS sobre listas telefônicas, apostilas, filmes e papeis fotográficos necessários para a confecção de jornais:
Súmula 657-STF: A imunidade prevista no art. 150, VI, d, da CF abrange os filmes e papéis fotográficos necessários à publicação de jornais e periódicos.
Por outro lado, não abrange encartes comerciais em revistas e jornais e por hora não abrange o livro eletrônico (apesar da tendência de abranger estes últimos).


d) Imunidade das Entidades de Assistência Social e Educacional, Partidos Políticos e suas Fundações, Sindicatos de Trabalhadores, quanto suas atividades essenciais.

As entidades assistenciais e educacionais devem atender os requisitos do CTN, art. 14: não distribuir lucro ou parcela do patrimônio, ter a contabilidade em ordem e não remeter recursos para o exterior.

Os partidos políticos e suas fundações devem ter suas contas aprovadas pela Justiça Eleitoral (Lei nº 9.096/95).

CESPE AGU 2012, 
Questão 6) Para que as sociedades comerciais e cooperativas obtenham a qualificação de organizações da sociedade civil de interesse público, é preciso que elas não possuam fins lucrativos e que tenham em seus objetivos sociais a finalidade de promoção da assistência social.A questão 6) acima está ERRADA, já que é uma antinomia falar-se em sociedade comercial e ausência de fins lucrativos.


Caso uma entidade assistencial venda bens para arrecadar fundos, não recolherá o ICMS: 
O Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o RE 210.251 - EDv/SP, fixou entendimento segundo o qual as entidades de assistência social são imunes em relação ao ICMS incidente sobre a comercialização de bens por elas produzidos, nos termos do art. 150, VI, "c" da Constituição. Embargos de divergência conhecidos, mas improvidos. (RE 186.175)
Por outro lado, caso adquira bens, haverá normalmente a tributação (na aquisição, ela não é contribuinte, apesar da repercussão econômica do tributo, que será incluído no preço a ser pago pela mercadoria).

4.2) Imunidades Específicas

4.2.1) Relativas a Impostos

a) São imunes do IPI os produtos industrializados destinados ao exterior. O IPI será reduzido para aquisição de bens de capital, na forma da lei;

b) É imune do ITR a pequena gleba rural (Lei nº 9;393/96, art. 2º);

c) É imune do ISS a exportação de serviços;

d) É imune do ICMS a exportação de mercadorias e serviços;

e) É imune de impostos a transmissão de terras desapropriadas para fins de reforma agrária.


4.2.2) Relativas a Taxas

a) Assistência Judiciária Gratuita (custas);

b) Emolumentos pagos nas certidões de nascimento e de óbito;

c) Custas judiciais no habeas corpus e no habeas data;

d) Custas na ação popular.


4.2.3) Relativas a Contribuições

a) Aposentadorias e pensões do regime própria dos servidores públicos, cujos proventos sejam inferiores ao teto do regime geral de previdência social;

b) Aposentadorias e pensões do regime geral de previdência social (CF/88, art. 195, II);

c) Contribuições Sociais e CIDE sobre as receitas decorrentes de exportação (CF/88, art. 195, IV);

d) Contribuições para financiamento da seguridade social das entidades beneficentes de assistência social (CF/88, art. 195, §7º)


PGFN 2012
26- Sobre o alcance da chamada imunidade constitucional recíproca, de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, é correto afirmar que:
a) tanto os objetivos como os efeitos do reconhecimento da aplicação da imunidade constitucional recíproca são passíveis de submissão ao crivo jurisdicional, em um exame de ponderação, não bastando a constatação objetiva da propriedade do bem.
b) sociedade de economia mista prestadora de serviço público de água e esgoto não é abrangida pela imunidade tributária recíproca.
c) tal imunidade, em alguns casos, pode ter como efeito colateral relevante a relativização dos princípios da livre concorrência e do exercício de atividade profissional ou econômica lícita.
d) o reconhecimento da imunidade tributária às operações financeiras não impede a autoridade fiscal de examinar a correção do procedimento adotado pela entidade imune. Constatado desvio de finalidade, a autoridade fiscal poderá, sendo o caso, constituir o crédito tributário e tomar as demais medidas legais cabíveis.
e) é relevante para definição da aplicabilidade da imunidade tributária recíproca a circunstância de a atividade desempenhada estar ou não sujeita a monopólio estatal.
GABARITO: A

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