quinta-feira, 11 de setembro de 2014

15 - Crimes contra a Liberdade Sexual - Corrupção de Menores, Satisfação de Lascívia e Favorecimento à Prostituição de Incapaz


Crimes Contra a Liberdade Sexual


2) Violação Sexual Mediante Fraude - art. 215

3) Assédio Sexual - art. 216-A, introduzido pela Lei nº 10.224/01

4) Estupro de Vulnerável - art. 217-A

5) Corrupção de Menores - art. 218

Embora tenha o mesmo título, este crime não se confunde com aquele do ECA, art. 244-B, pois aquele não é contra a dignidade sexual (corromper ou facilitar a corrupção de menor de 18 anos, com ele praticando infração penal ou induzindo-o a praticá-la).

Este crime do CP, art. 218, é uma forma de lenocínio - art. 227, caput, o qual consiste em induzir alguém a satisfazer a lascívia de outrem. O que distingue este crime do lenocínio é a idade da vítima, que aqui é menor de 14 anos.

5.1) Sujeito Ativo

Qualquer pessoa. O autor deste crime é chamado de lenão, ou proxeneta, ou alcoviteiro, ou cafetão.


5.2) Sujeito Passivo

É o homem ou mulher, menor de 14 anos e, portanto, vulnerável. 
  • Se a vítima for maior de 14 anos e menor de 18, configura-se o lenocínio qualificado do art. 227, §1º;
  • Se ela já tiver 18, haverá lenocínio simples;
  • Se a conduta ocorrer no dia do aniversário de 14 anos da vítima, não há corrupção de menores, pois ela não é menor de 14 anos. Não há lenocínio qualificado porque ela ainda não é maior de 14 anos. O agente responde por lenocínio simples;

5.3) Tipo Objetivo

A conduta é induzir, que significa convencer, incentivar, etc. O agente busca a satisfação de terceiro. 
  • Se ele buscar a própria satisfação, responderá por estupro de vulnerável, dependendo do que praticar, tentado ou consumado. Esse terceiro deve ser pessoa ou pessoas determinadas;
  • Se o agente induzir a vítima a se disponibilizar para um contato sexual com número indeterminado de pessoas, seu crime será o de favorecimento à prostituição - art. 218-B;
  • Na hipótese de o terceiro efetivamente se relacionar com a vítima vulnerável, há duas correntes sobre o crime do agente que a induziu:
  • A primeira corrente diz que aquele que se relacionou com a vítima e aquele que a induziu responderão, ambos, o primeiro como autor, e o segundo como partícipe, por estupro de vulnerável, o qual absorve, para o segundo, a corrupção de menores. Para esta corrente, portanto, a corrupção de menores só se configura se a vítima não se relacionar com o terceiro; 
  • A segunda corrente afirma haver aqui uma exceção pluralística à teoria monista do concurso de agentes, adotada pelo art. 29, segundo a qual todos os que concorrem para um crime respondem pelo mesmo crime. Para esta corrente, nesta hipótese, eles responderão por crimes diversos: quem induziu a vítima responde por corrupção de menores e quem se relacionou com ela por estupro de vulnerável; 
  • Não se pode afirmar haver uma corrente prevalente neste caso.

5.4) Tipo Subjetivo

É o dolo, o qual inclui a ciência sobre a idade da vítima ou que o agente ao menos assuma o risco dela. Se ele acredita que ela já tem 14 anos, ele responde pelo lenocínio do art. 227.


5.5) Consumação

Trata-se de crime formal, que se consuma com o mero induzimento, independentemente de a vítima se relacionar com o terceiro. A tentativa só é possível na forma não presencial (ex.: o agente manda uma carta induzindo a vítima, mas ela não a recebe).


6) Satisfação de Lascívia Mediante Presença de Criança ou Adolescente - art. 218-A

O crime consiste em praticar conjunção carnal ou ato libidinoso na presença da vítima menor de 14 anos, ou induzi-la a presenciar atos de terceiros atos de terceiros, sempre com a finalidade de satisfazer a própria lascívia.

6.1) Sujeito Ativo

Qualquer pessoa.


6.2) Sujeito Passivo

Qualquer pessoa, homem ou mulher, menor de 14 anos.


6.3) Tipo Objetivo

Trata-se de tipo misto alternativo, que prevê duas condutas:

a) Praticar: o próprio agente realiza a conjunção carnal ou ato libidinoso com terceiro, ciente de que a vítima o está assistindo e permitindo esta presença como forma de satisfazer a lascívia própria ou de terceiro;

b) Induzi-lo a presenciar: o agente convence a vítima a presenciar atos libidinosos. Neste crime, a vítima não participa de qualquer prática libidinosa, mas apenas assiste atos de terceiros. Se ela participar, o agente responderá por estupro de vulnerável, que absorve este crime;
  • Presenciar não exige uma presença direta, física, no mesmo local e no mesmo tempo em que o ato é praticado. O crime se verifica mesmo que a vítima assista ao ato de outro local, através de câmeras, ou mesmo em outro momento, através de vídeos. Por isso, configura este crime a exibição para a vítima de filmes pornográficos.

6.4) Tipo Subjetivo

É o dolo específico de satisfazer a lascívia própria ou de outrem. Não basta a mera prática sexual na presença da vítima (ex.: pai e mãe que dormem no mesmo cômodo da vítima e se relacionam sexualmente), sendo necessário que essa presença seja meio para o agente satisfazer sua lascívia.


6.5) Consumação

Na forma "praticar", o crime se consuma com a efetiva realização do ato na presença da vítima, havendo tentativa se o ato não se realizar por circunstâncias alheias à vontade do agente (ex.: o casal começa a se despir na presença da vítima e é surpreendido).

Na forma "induzir", há duas correntes:
  • Em uma primeira, o crime se consuma com o mero induzimento, ainda que o menor não venha a presenciar o ato. Para esta corrente, que é majoritária, só haverá tentativa na forma não presencial (ex.: o agente manda uma carta à vítima convidando-a e induzindo-a a presenciar o ato, mas a vítima não a recebe);
  • Em uma segunda, o crime, também na forma induzir, só se consuma com a efetiva prática do ato na presença da vítima, sem a qual haverá mera tentativa.

7) Favorecimento à Prostituição ou Outra Forma de Exploração Sexual de Criança, Adolescente ou Vulnerável art. 218-B

Este título do crime foi alterado recentemente pela Lei nº 12.978/14.

Trata-se de crime semelhante em tudo ao favorecimento à prostituição do art. 228, exceto quanto à vítima, que aqui é menor de 18 anos ou possui enfermidade ou deficiência mental.

7.1) Sujeito Ativo

Qualquer pessoa. 


7.2) Sujeito Passivo

Qualquer pessoa, homem ou mulher, menor de 18 anos ou portadora de enfermidade ou deficiência mental que lhe retire o discernimento para o ato. Trata-se de situação que exige prova pericial.


7.3) Tipo Objetivo

Trata-se de tipo misto alternativo, que prevê seis condutas. 

As quatro primeiras se referem à prostituição: induzir, submeter, atrair ou facilitar. Nessas hipóteses, a vítima ainda não é prostituta nem explorada sexualmente, e o agente quer torná-la (ex.: o agente coloca a vítima no prostíbulo - submeter; ele a convence a se prostituir - induzir; ele convida moças do norte para se prostituírem no sul - atrair; ele fornece o transporte - facilitar).

As duas últimas condutas visam à vítima que já é prostituta ou explorada sexualmente, e quer deixar de sê-lo, atuando o agente para impedir ou dificultar o abandono desse estado (ex.: sabendo que a vítima quer deixar o prostíbulo, ele lhe ameaça de morte - impedir; ele não lhe dá meios para retornar à sua casa - dificultar).

Prostituição é apenas uma das muitas formas de exploração sexual da pessoa. É a mercancia do próprio corpo para fins sexuais; é a disponibilização da pessoa, para fins sexuais, em favor de um número indeterminado de pessoas, com fim de lucro. 

Em si mesma, a prostituição é uma conduta atípica, e a pessoa submetida a ela é vítima de crime contra sua dignidade sexual, e não autora de crime. Embora atípica, o legislador vê a prostituição como perniciosa, e por isso pune neste dispositivo todos aqueles que a favorecem ou a exploram.

Além da prostituição, punem-se as condutas relacionadas a quaisquer outras formas de exploração sexual da pessoa (ex.: escravidão sexual, dançarinas stripper, participação em cenas pornográficas, etc.).


7.4) Tipo Subjetivo

É o dolo, o qual não depende da finalidade de obter lucro. 
  • Se essa finalidade também estiver presente, configura-se a forma qualificada do §1º, que acrescenta a pena de multa à privativa de liberdade.

7.5) Consumação e Tentativa

Nas quatro primeiras condutas o crime se consuma, na forma prostituição, quando a vítima se coloca à disposição de uma clientela para fins sexuais, ainda que ela não se relacione sexualmente (ex.: no primeiro dia, a vítima se dirige ao prostíbulo e ali permanece à espera de clientes, mas nenhum comparece. O crime do agente está consumado).

Na forma exploração sexual, o crime se consuma quando a vítima é submetida pela primeira vez ao ato de exploração. Nas duas últimas condutas, o crime se consuma quando surge para a vítima o obstáculo ou a dificuldade para abandonar a prostituição ou a exploração sexual. 

Todas as formas admitem tentativa (ex.: o agente atrai ou induz, mas a vítima não se prostitui; ele manda uma carta ameaçando a vítima se ela deixar a prostituição, mas a vítima não recebe a carta e a abandona; etc.).


7.6) Condutas Equiparadas - art. 218-B, §2º

a) Quem pratica conjunção carnal ou outro ato libidinoso com vítima que se encontre em uma das situações do caput, ou seja, já submetida à prostituição ou a outra forma de exploração sexual. No entanto, a vítima não pode ser vulnerável, pois se for, o crime será de estupro de vulnerável. Resta, como vítima deste crime, a vítima que já completou 14 anos e é menor de 18 anos, não sendo vulnerável. Assim, o agente que se relaciona com prostituta menor de 18 anos, mas já com 14 anos, pratica este crime;

  • Isto é um argumento à favor do caráter absoluto da vulnerabilidade. Se é crime relacionar-se com prostituta menor de 18 anos que já completou 14, com muito mais razão é crime relacionar-se com pessoa menor de 14, por maior que seja a experiência sexual desta, e ainda que seja prostituta.


b) Pune-se o proprietário, o gerente ou o responsável pelo local onde se realiza a prostituição ou a exploração sexual do caput. É preciso que o agente conheça essa circunstância (ex.: o proprietário do imóvel o aluga ciente de sua destinação à pratica do crime; o gerente do bar permite que em seu estabelecimento se verifique a prostituição de menores, etc.).

  • O agente deste crime não pratica nenhuma das condutas do caput, mas é vinculado ao local onde elas acontecem.

8) Disposições Gerais

8.1) Ação Penal nos Crimes contra a Dignidade Sexual - CP, art. 225

Na lei anterior, a regra para os crimes contra os costumes era a ação penal privada. A reforma de 2009 praticamente a aboliu, restando apenas a possibilidade da ação penal privada subsidiária da pública. Portanto, hoje todos os crimes contra a dignidade sexual são de ação penal pública, somente sendo possível a ação privada se houver inércia do MP;
  • A ação penal, nos crimes dos Capítulos I e II (art. 213 a 218-B) será pública condicionada à representação do ofendido, em todos os casos, exceto os do art. 225, Parágrafo único;
  • A ação penal será pública incondicionada (art. 225, Parágrafo único) nas seguintes hipóteses:
  • Vítima vulnerável; 
  • Vítima menor de 18 anos. 
A partir da modificação da lei, surgiu uma discussão para a hipótese do estupro de vítima não vulnerável e que já completou 18 anos, do qual resulte lesão corporal grave ou morte. Estritamente de acordo com a lei, a ação penal seria pública condicionada. Seriam os únicos crimes com resultado lesão grave ou morte em que o MP não poderia promover a ação sem a manifestação de vontade do ofendido ou de seu sucessor;

  • Por conta disso, há uma corrente doutrinária e jurisprudencial, adotada pelo STJ, no sentido de que deve continuar sendo aplicada a Súmula nº 608-STF, editada sob a lei anterior, segundo a qual nos crimes sexuais praticados com violência real a ação é pública incondicionada. No entanto, a súmula se refere ao emprego de violência, sem distinguir qual o resultado desta (nenhuma lesão, lesão leva, lesão grave ou morte);
Súmula nº 608-STF No crime de estupro, praticado mediante violência real, a ação é pública incondicionada.
  • Outra corrente sustenta que deve ser aplicado o CP, art. 101, segundo o qual no crime complexo, se um de seus componentes é de ação pública, o crime complexo também o é. Como o estupro com resultado lesão grave ou morte é uma soma de constrangimento ilegal e  lesão corporal grave ou homicídio, e a ação destas é pública incondicionada, a ação penal pelo estupro qualificado também o é. Esta corrente também tem dificuldades, pois outros autores sustentam que o art. 225 é norma especial, devendo ser aplicado em lugar do art. 101, que é norma geral.

O MP Federal promove perante o STF a ADI nº 4.301, em que sustenta a inconstitucionalidade do art. 225 do CP no que se refere à ação penal pelo estupro qualificado pelo resultado, por ofensa à dignidade da pessoa humana e à proporcionalidade das penas. O STF ainda não decidiu.

Nos demais crimes, dos outros Capítulos, a ação é pública incondicionada.


8.2) Causas de Aumento de Pena para os Crimes dos Capítulos I e II (art. 213 a 218-B) - art. 226

a) Aumento de 1/4, quando o crime é cometido com o concurso de duas ou mais pessoas: como a lei fala em concurso de pessoas, prevalece que o aumento se aplica para as duas formas de concurso, ou seja, coautoria ou participação;

b) Aumento de 1/2, se o agente é ascendente, padrasto, madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor (educador) ou empregador da vítima, ou ainda tenha autoridade sobre ela a qualquer título (ex.: padre e coroinha);

  • O aumento para o empregador não se aplica ao crime de assédio sexual, pois essa condição já é elementar do tipo desse crime, não podendo ser, ao mesmo tempo, uma causa de aumento de pena.

8.3) Causas de Aumento de Pena para todos os Crimes contra a Dignidade Sexual - art. 234-A

a) Aumento de 1/2, se do crime resultar gravidez. Este aumento se aplica quando o agente é homem e a vítima é mulher. Ele não incide no estupro conjunção carnal praticado por mulher contra homem, do qual resulte gravidez da autora do crime;





b) Aumento de 1/6 até 1/2, se o agente transmite à vítima doença sexualmente transmissível de que sabe ou deveria saber ser portador. A palavra "sabe" indica o dolo direto, e o agente tem pleno conhecimento de sua doença e da sua transmissibilidade. A expressão "deve saber" indica o dolo eventual, em que o agente suspeita de sua doença ou de sua transmissibilidade, e ainda assim pratica o ato assumindo o risco de contaminar a vítima. Para que o aumento incida, não basta que o agente seja portador da doença, sendo necessário que efetivamente ocorra o contágio, o que deve ser demonstrado por perícia.


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