quarta-feira, 10 de setembro de 2014

10 - Processo de Conhecimento - Recursos - Teoria Geral II



I - Procedimento Comum Ordinário

II - Dos Recursos - continuação


7) Classificação dos Recursos

A classificação dos recursos é exposta pela doutrina a partir da consideração de alguns critérios relevantes. Normalmente fala-se nos critérios do âmbito do recurso, segundo o momento de interposição, ou ainda segundo a fundamentação ou o objeto. Vale a pena observar cada qual.


7.1) Quanto ao Âmbito do Recurso

Trata-se de classificação que leva em consideração a abrangência do recurso frente à matéria impugnável da decisão. Como se sabe, as decisões podem conter uma matéria mais ou menos extensa como objeto de eventual recurso. Nessa medida, existem dois tipos de recurso:

a) Recursos totais: é o recurso que abrange o total da matéria impugnável. Mesmo que hajam vários capítulos favoráveis da sentença, mas apenas um tema foi julgado desfavorável, o recurso será total, pois recorrível é todo o tema, e não necessariamente toda a sentença (ex.: sentença que garanta todo o direito do autor, exceto juros e correção. O recurso será total, mesmo que apenas nessa parte recorrível, em que o Judiciário tem até entendido que estes são pedidos implícitos);

b) Recursos parciais: é o recurso que ataca apenas parte da matéria recorrível (ex.: sentença que garante todo o direito do autor, inclusive juros e correção, mas em percentuais equivocados);


7.2) Quanto ao Momento da Interposição - art. 500

Um segundo critério utilizado pela doutrina é o relativo ao momento da interposição. Esse critério decorre da análise do art. 500, cuja disposição esclarece que as partes podem interpor recursos de modo autônomo ou subordinado. 

a) Recurso autônomo: assim, diante de uma decisão que atenda apenas em parte a pretensão do autor, haverá a possibilidade de que tanto ele como o réu recorram. Neste caso, ambos poderão interpor o recurso de forma autônoma, de tal maneira que o tribunal conhecerá de cada um deles e os julgará também de modo autônomo. 

b) Recurso subordinado: ao lado daquela possibilidade, o legislador abre espaço para que uma das partes possa recorrer de forma subordinada, por intermédio do denominado "recurso adesivo", caso em que aquele que interpuser o recurso de modo subordinado, o fará no prazo de suas contrarrazões, ciente de que o seu recurso só será admitido e conhecido pelo tribunal se assim também for o recurso principal. Então, é nítido que o recurso adesivo segue a sorte do recurso principal, como manda o princípio da gravitação, sendo atingido por qualquer ocorrência que diga respeito a este último. Dessa forma, por exemplo, se a parte que interpôs o recurso principal vier a desistir dele - art. 501, o recurso adesivo se quer será admitido pela corte superior.
  • Vale lembrar que o recurso adesivo só cabe nas hipóteses referidas pelo art. 500, II, ou seja, nos casos de apelação, embargos infringentes, recursos especial e extraordinário;
  • Pontos controvertidos:
  • Cabe recurso adesivo em se tratando de recurso ordinário constitucional? Conforme sabido, o recurso ordinário constitucional, previsto na CF/88, art. 102, II, e 105, II, para algumas hipóteses de mandado de segurança e habeas corpus, tem um formato e conteúdo similares àqueles que dizem respeito à apelação. Dessa maneira, embora sejam de competência do STJ ou STF, visam à reforma de uma decisão nas ações referidas. Por esse motivo, existe quem defenda em doutrina, tanto quanto se constatam precedentes, admitindo o adesivo nessa hipótese;
  • O recurso adesivo, nas hipóteses de recursos especial e extraordinário, dependerá dos mesmos requisitos de interposição? Não há dúvida, até em função daquilo que dispõe o art. 500, Parágrafo único, que no recurso adesivo em RE e REsp, também dependerá da existência de questão Federal, do esgotamento das vias ordinárias, do prequestionamento da matéria, e bem assim da repercussão geral, quando caso. Um recurso adesivo nessas hipóteses é sempre um recurso adesivo Especial ou Extraordinário;

7.3) Quanto à Fundamentação

A doutrina também trata da fundamentação como critério classificatório dos recursos. Assim é porque a parte recorrente nem sempre terá a ampla liberdade para fundamentar a sua irresignação. Dentro desta perspectiva, existem os recursos de fundamentação livre e aqueles de fundamentação vinculada. Claro que

a) Fundamentação livre: os de fundamentação livre deixam a parte recorrente à vontade para aduzir os fundamentos que entenda mais convenientes à obtenção do seu propósito (ex.: apelação, agravo, embargos infringentes. Quanto a este último, é importante notar que se o recorrente ficar limitado em seu recurso à matéria tratada no voto dissidente, por outro lado tem ampla liberdade de fundamentar seu recurso como queira);

b) Fundamentação vinculada: exigem um fundamentação específica, sem conferir à parte recorrente qualquer liberdade para arrazoá-lo (ex.: RE e REsp, nos quais o fundamento só poderá ser a matéria da questão constitucional ou federal eventualmente prequestionada. Mais ainda, a fundamentação terá sempre de dizer respeito à negativa de vigência, ou à interpretação imperfeita, ou divergente no que diz respeito a normas constitucionais ou legais).


7.4) Quanto ao Objeto/Finalidade

Aqui os recursos são classificados segundo seu objeto, isto é, segundo sua finalidade especial. A doutrina aponta duas espécies de recursos:

a) Ordinários: seu objetivo maior e exclusivo é o de se obter, em prol do recorrente, uma melhoria de sua situação jurídica individual. Então, quando alguém maneja uma apelação, um agravo de instrumento, etc., deseja objetivamente uma melhoria de sua situação jurídica. Por isto, estes são exemplos de recursos ordinários;

b) Extraordinários: neste caso, a finalidade maior e imediata é a manutenção da integridade do sistema jurídico. Por isto mesmo, são recursos endereçados a cortes especiais, tais como o STJ, o STF, que têm a missão constitucional de garantir a plena eficácia do sistema jurídico ordinário e constitucional. Assim, quando alguém interpõe um REsp, previsto na CF/88, art. 105, III, a pretensão maior é a de garantir a integridade do sistema legal, para que vingue uma unidade de interpretação relativamente às leis aplicáveis à matéria. Da mesma maneira, quando alguém interpõe um RE, previsto na CF/88, art. 102, III, seu desejo é reclamar do STF a aplicação exata do texto constitucional naquela matéria levada a seu conhecimento.


8) Efeitos dos Recursos

Efeitos dos recursos são as circunstâncias de relevância jurídica decorrentes de sua interposição. Esses respeito, em geral, dizem respeito à eficácia da decisão recorrida, aos limites da apreciação do recurso pelo tribunal, à extensão das consequências do julgamento dos recursos a outros recursos, etc.

A doutrina reconhece ordinariamente os efeitos obstativo, suspensivo, devolutivo, regressivo, substitutivo e expansivo. Cada qual deles tem uma característica especial e uma importância peculiar.

8.1) Efeito Obstativo

Como se sabe, toda decisão proferida tende a uma estabilização ou definitividade. Uma interlocutória que seja admite questionamento recursal dentro de certas balizas, porque se as partes não a atacam a tempo, sofrem os efeitos da preclusão. De outra parte, ocorre a mesma situação com as decisões definitivas, sentenças ou acórdãos, que como se sabe têm uma tendência à coisa julgada. Dentro desse raciocínio, a interposição de um recurso gera habitualmente um efeito reconhecido como obstativo, já porque ele impede a preclusão ou a coisa julgada. Por isto se reconhece que este é um efeito natural presente em todos os recursos. 


8.2) Efeito Suspensivo

O efeito suspensivo é aquele que atua no campo da eficácia da decisão questionada. Dessa maneira, ele impede, quando presente, os efeitos normais que ela teria dentro do processo. O efeito suspensivo não é essencial aos recursos, razão pela qual não estará presente em todos os casos. Sua previsão e imposição decorrerão sempre ou da lei (ope legis) ou da decisão judicial no caso concreto (ope judicis). 

A lei é a primeira fonte desse efeito, como se constata pela disposição do art. 520, que prevê exatamente o efeito suspensivo como um daqueles efeitos naturais ao recurso de apelação. 

Todavia, é possível que ele seja estabelecido também por meio de uma decisão judicial, até mesmo quando a lei não o permita. É o caso existente na previsão do art. 558, que autoriza o relator a conceder o efeito suspensivo sempre que houver uma situação de urgência, ou seja, uma situação em que o cumprimento imediato da decisão questionada possa gerar um dano irreparável ou irreversível.


8.3) Efeito Devolutivo

Trata-se de efeito que assegura ao juízo de destino do recurso (ad quem) a possibilidade de apreciação e prolação de nova decisão sobre matéria já resolvida por juízo diverso. Nessa linha de consideração, o chamado efeito devolutivo serve também a um objetivo importante, que é o de delimitar a matéria a ser apreciada pelo tribunal. É por isto que a doutrina de Marinoni, Scarpinella e outros autores poe em evidência o fato de que este efeito está relacionado à manifestação ao princípio da adstrição no campo dos recursos. E assim é porque o tribunal ao qual o recurso é endereçado somente poderá apreciar a matéria efetivamente devolvida, que por sua vez tem os seus limites postos pelo recorrente. Assim, a matéria devolvida só pode ser aquela exposta pelo recorrente em suas razões. O objeto do recurso é o limite à sua devolutividade para o tribunal.

É pacífico de que o reconhecimento do efeito devolutivo se projeta em duas direções, ou seja, a dimensão horizontal e a dimensão vertical.

a) Dimensão horizontal: diz respeito à extensão da matéria a ser apreciada pelo tribunal. Então, nesse plano, fica fácil concluir que a dimensão horizontal do efeito devolutivo encontra-se delimitada pela extensão da matéria impugnada pelo recurso. Daí o aforismo tantum devolutum quantum apelatum. Pode-se afirmar, portanto, que neste plano horizontal o tribunal fica sujeito ao princípio da adstrição, não podendo ir além aquilo que foi questionado pelo recorrente;

b) Dimensão vertical: relacionada ao nível de profundidade a que o tribunal pode descer na apreciação do recurso. Neste ponto, servem como regras o que está disposto pelo art. 515, Parágrafo primeiro, assim como o art. 516, nos quais se vê que o legislador autoriza o tribunal a apreciar, independentemente de provocação do recorrente, todas as questões anteriores à sentença, e mesmo aquelas que não tenham sido nela consideradas, ou quando tenham sido consideradas apenas parcialmente. Nessa linha de raciocínio, o legislador autoriza o tribunal a decidir questões não decididas e até a rever questões já decididas, à medida que as julgue importantes para o desfecho do julgamento. Dessa maneira, ao tribunal se confere um poder maior de apreciação, tendo ele de respeitar apenas os limites impostos por eventual preclusão quanto a essas questões a serem reapreciadas.


8.4) Efeito Translativo

Como percebido, o efeito devolutivo no plano vertical permite ao tribunal que, de ofício, aprecie questões anteriores, decididas ou não pelo juízo de origem. De qualquer maneira, é preciso frisar a existência também de outras questões que podem ensejar uma decisão de ofício do tribunal, por sua obrigação legal de fazê-lo. Trata-se daquelas situações referidas no art. 267, §3º.

Como sabido, todo e qualquer Juiz ou tribunal estão obrigados a reconhecer de ofício questões relevantes que digam respeito à formação do processo ou outras do tipo, como por exemplo, e ao lado daquelas referidas pelo art. 267, §3º, as situações referidas pelo art. 301. A mais essa possibilidade de apreciação de ofício pelo tribunal, a doutrina denomina como "efeito translativo".

Há uma divisão de opiniões sobre ser este um efeito autônomo, já que uma parte considerável da doutrina entende que seja apenas uma nova forma de manifestação do efeito devolutivo vertical.


8.5) Efeito Regressivo - art. 523, §2º

Trata-se de efeito que permite ao juízo prolator da decisão a possibilidade de revê-la antes que o tribunal de destino venha a apreciar o recurso. Portanto, é caso de um juízo de retratação autorizado por regras legais específicas. Somente alguns recursos contemplam esse efeito, como é o caso do agravo de instrumento, da apelação na hipótese do art. 285-A, etc. A filosofia que está por trás deste efeito é a de que ele pode possibilitar que se evite a subida de recursos desnecessários para os tribunais.


8.6) Efeito Substitutivo - art. 512

Segundo o art. 512 do CPC, a decisão que julga o recurso substituirá sempre a interlocutória ou a sentença recorridas naquilo que foi objeto da impugnação. Desse modo, como lembram Marinoni e outros, ainda que o Acórdão apenas confirme a decisão anterior, ele a substituirá no que diz respeito à matéria que foi objeto do recurso. É simples entender este efeito porque ele apenas cuida de garantir que a decisão a prevalecer em um processo seja sempre a última proferida no que diz respeito à matéria impugnada.



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