quarta-feira, 24 de setembro de 2014

16 - Organização do Estado - Intervenção


Intervenção Federal e Intervenção Estadual - arts. 34 a 36

1) Introdução 

Em razão do Princípio Federativo, toda intervenção é medida excepcional e temporária. Portanto, em caráter excepcional, e nos casos taxativamente previstos pela Constituição, a União intervirá nos Estados e no DF, com base no art. 34, e nos municípios dos Territórios Federais, com base no art. 35, e os Estados intervirão nos seus municípios também com base no art. 35.

2) Intervenção Federal

2.1) Pressupostos Materiais - art. 34

São as hipóteses geradoras de intervenção e que constam do rol taxativo do art. 34. A doutrina divide essas hipóteses em grupos de acordo com a finalidade principal de cada uma delas da seguinte maneira:

a) Defesa da soberania nacional:
  • Inciso I: prevê intervenção para garantir a unidade nacional por meio da integridade territorial do país. Seria o caso de ameaça concreta e iminente de separação;
  • Inciso II, primeira parte: prevê intervenção no caso de invasão estrangeira em um Estado-membro, o que independente de declaração de guerra ou decretação de estado de sítio;
b) Defesa do princípio federativo;
  • Inciso II, segunda parte: prevê intervenção se um Estado-membro invadir outro Estado-membro. Em geral, este cenário indica a necessidade de intervenção no Estado invasor, mas se for preciso, nada impede que ocorra também a intervenção no Estado invadido. Esta hipótese não contempla os casos de disputas judiciais entre Estados por área territorial;
  • Inciso III: prevê intervenção para resolver grave comprometimento da ordem pública em um Estado. Cabe ao Presidente da República avaliar o significado de "grave comprometimento";
  • Nos casos, desde o início da década de 1990, de emprego do Exército com função policial em certos Estados (Rio de Janeiro, Bahia, Ceará, episódios de greve da PM), não houve decretação de intervenção Federal. O emprego do Exército, sem decreto de intervenção, foi legitimado pela Lei Complementar nº 97/99, que disciplinou a utilização dos militares das forças armadas com função policial, para garantia da lei e da ordem, nos termos da CF/88, art. 142; 
  • Inciso IV: prevê intervenção no Estado para assegurar o livre exercício dos Poderes Públicos estaduais. A doutrina cogita exemplos tais como a hipótese de uma assembléia legislativa impedida pelo Governador de reunir-se ou de deliberar, ou então uma assembléia legislativa que se recuse a dar posse ao Governador, ou ainda um Governador que se recuse a transferir aos demais Poderes verbas orçamentárias que lhes competem, etc.;
c) Hipóteses que visam a defesa das finanças dos entes da Federação - inciso V:
  • Alínea a: prevê intervenção no Estado que deixar de pagar dívida fundada por mais de 2 anos seguidos, salvo força maior;
  • Para a Lei nº 4.320/64 - art. 98, dívida fundada é aquela que decorre de empréstimos contraídos por um ente, com prazo de pagamento superior a 12 meses, com a finalidade de reorganizar as finanças daquele ente ou para o custeio de obras determinadas; 
  • Para a LRF, art. 29, I, dívida fundada ou consolidada é o montante total das obrigações financeiras contraídas com um ente, decorrentes de leis, tratados, operações de crédito, com prazo de amortização superior a 12 meses;
  • Alínea b: prevê intervenção no Estado que deixar de transferir verbas para seus municípios, conforme determina a Constituição;
d) Hipóteses de intervenção que visam a defesa da própria Constituição e de seus princípios:
  • Inciso VI - prevê dois casos:
  • Intervenção para assegurar a execução de Lei Federal;
  • Intervenção para assegurar o cumprimento de ordem ou decisão judicial. No caso do não pagamento de precatório, o STF entendeu que só será possível intervenção com base neste inciso VI se o não pagamento decorrer de dolo, intencional, voluntário;
  • Inciso VII: prevê intervenção no Estado que violar os chamados princípios constitucionais sensíveis, relacionados nas cinco alíneas deste inciso: 
  • a) Forma republicana, regime democrático e sistema representativo (o que pressupõe a necessidade de preservação, pelos Estados, das noções de eletividade, temporariedade do mandato, responsabilidade e transparência da Administração); 
  • b) Direitos da pessoa humana (neste caso, o STF entendeu que só haverá intervenção na hipótese da violação contínua e sistemática dos direitos da pessoa humana, devido a ação ou omissão de Poder Público Estadual. Uum caso isolado, ainda que seja violação de porte, não gera a intervenção - ex.: rebeliões carcerárias em Rondônia e Maranhão);
  • c) Autonomia municipal; 
  • d) Prestação de contas pela Administração Pública direta e indireta; 
  • e) Aplicação de parte dos recursos dos Estados nos setores de ensino e saúde;

2.2) Pressupostos Formais (procedimento da intervenção) - art. 36

a) Intervenção espontânea - art. 34, I, II, III e V: cabem ao Presidente da República a iniciativa e a valoração da necessidade de intervenção;
  • Se o Presidente entender que é cabível a intervenção nestes casos, deverá ouvir o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, cujas manifestações são apenas opinativas, não vinculantes. Após as manifestações dos Conselhos, o Presidente decidirá se decreta ou não a intervenção. Sem tais manifestações, a intervenção é nula;
  • Se o Presidente optar pela intervenção, editará o decreto interventivo, fixando um prazo de duração da intervenção, e as medidas que serão adotadas. O Presidente poderá até mesmo nomear um interventor para substituir, durante a intervenção, o Governador ou mesmo o chefe dos demais Poderes estaduais, no que diz respeito ao exercício da função administrativa desses Poderes;
  • Quanto à responsabilidade por danos provocados pelo interventor, prevalece o entendimento de que a responsabilidade será da União se o interventor agiu na execução das medidas interventivas, e a responsabilidade será do Estado se o interventor agiu no exercício das funções regulares de chefe de Poder Público estadual;
  • Publicado o decreto interventivo, terá eficácia imediata, e o Presidente deverá, em 24 horas, enviar o decreto ao Congresso Nacional, e o Congresso, mediante decreto legislativo, decidirá se mantém ou interrompe a intervenção.

b) Intervenção provocada - art. 34, IV: se os Poderes coactos forem o Legislativo estadual ou o Executivo estadual, o próprio poder coacto deverá solicitar a intervenção ao Presidente da República. Feita a solicitação, o Presidente avaliará se deve ou não intervir. Entendendo que a intervenção é cabível, o Presidente ouvirá os Conselhos da República e de Defesa Nacional, e o restante do procedimento é idêntico ao anterior;
  • Se o Poder coacto for o Judiciário estadual, o TJ solicita a intervenção ao STF. Se o STF entender que é necessária a intervenção, requisitará a intervenção ao Presidente da República, que será obrigado a decretá-la, sob pena de crime de responsabilidade.

c) Ordem ou decisão judicial - art. 34, VI: trata-se de situação especificamente para o caso de descumprimento de ordem ou decisão judicial. Também é hipótese de intervenção provocada;
  • Se a decisão não cumprida for do STJ, este Superior requisitará a intervenção ao Presidente da República;
  • Se a decisão não cumprida for da Justiça Eleitoral, o TSE requisitará a intervenção ao Presidente da República;
  • Se a decisão não cumprida for do STF ou de qualquer outro órgão do Judiciário, o STF requisitará a intervenção ao Presidente da República;
  • Requisitada a intervenção, o Presidente da República será obrigado a decretá-la.

d) Execução de Lei Federal e violação aos princípios sensíveis - art. 34, VI e VII:

Se denomina intervenção normativa. Esta hipótese foi disciplinada pela Lei nº 12.562/11. Caberá exclusivamente ao PGR oferecer ao STF uma representação interventiva. Esta representação tem natureza de ação judicial. Antes da mencionada lei, a doutrina havia denominado esta ação, no caso do inciso VI, de ação de execução de Lei Federal, e no caos do inciso VII, de ação direta de inconstitucionalidade interventiva (ADI interventiva). A lei de 2011 apenas reproduziu a terminologia constitucional "representação", mas evidencia a natureza de ação judicial;
  • De acordo com a mencionada lei, esta representação poderá questionar ato normativo, ato administrativo, ato concreto e até omissão do Poder Público;
  • Admite-se pedido de concessão de medida liminar, sobre o que o relator poderá ouvir os responsáveis pelo ato questionado, o AGU ou ainda o PGR, no prazo comum de 5 dias;
  • A liminar só será concedida pela maioria absoluta do STF, e seus efeitos consistirão na suspensão de processo ou dos efeitos de decisões judiciais ou administrativas, ou ainda de qualquer outra medida relacionada com a matéria;
  • Apreciado o pedido de liminar, o relator solicitará, quanto ao mérito, informações à autoridade responsável pelo ato questionado, no prazo de 10 dias. Na sequência, solicitará manifestações ao AGU e ao PGR no prazo de 10 dias para cada;
  • Admite-se a participação de amicus curiae;
  • O relator tem a oportunidade, logo que recebe a inicial, de tentar, por conta própria, dirimir o conflito, e no curso do processo, após as mencionadas manifestações, poderá requisitar informações adicionais, pareceres de peritos, e convocar audiência pública para ouvir especialistas;
  • Julgada procedente a representação, o STF expedirá ofício ao Presidente da República, determinando que no prazo improrrogável de 15 dias, contados da publicação do acórdão, o Presidente decrete a intervenção, nos termos do art. 36, §§1º e 3º. Isto significa que o Presidente editará um decreto interventivo sustando o ato que gerou a intervenção - é a chamada intervenção jurídica;
  • Este decreto não é enviado ao Congresso. Porém, se isto não for suficiente para resolver o problema, o Presidente editará outro decreto prevendo medidas interventivas efetivas. Este segundo decreto será enviado ao Congresso.

3) Intervenção Estadual - arts. 35 e 36

Nas hipóteses de não pagamento de dívida fundada por dois anos consecutivos, de falta de prestação de contas pela Administração Pública municipal e de não aplicação de parte dos recursos municipais nos setores de ensino e saúde, caberá ao Governador avaliar se deve ou não decretar a intervenção. Se decretá-la, terá ela eficácia imediata, e em 24 horas o decreto interventivo deverá ser enviado à Assembléia Legislativa, que decidirá se mantém ou interrompe a intervenção.

Por outro lado, nas hipóteses de violação aos princípios da Constituição Estadual por parte de um município, da não execução de lei, e ainda de descumprimento de ordem ou decisão judicial, caberá ao PGJ a propositura de representação perante o TJ, que se julgá-la procedente requisitará a intervenção ao Governador, o qual se achará obrigado a decretá-la.
  • No caso de descumprimento de ordem ou decisão judicial, tem-se admitido que a parte interessada no processo em que a decisão foi descumprida ofereça a representação ao TJ.


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