segunda-feira, 22 de setembro de 2014

11 - Processo de Conhecimento - Recursos em Espécie - Apelação


1) Apelação - CPC, art. 513 a 521

1.1) Introdução

O recurso de apelação é dos mais antigos do sistema direito processual. A doutrina de Cândido Dinamarco, assim como a de Marinoni, indica que esse recurso tem origem no processo civil romano. Assim, o processo romano na época do império desenvolveu um sistema de recursos para que o imperador pudesse estabelecer um controle mais efetivo sobre as decisões dos pretores, etc. Naquela época, a denominação do recurso era appellatio, por meio do qual o Imperador e sua assessoria jurídica resolviam os questionamentos sobre as decisões pretorianas daquela época.


1.2) Conceito

Apelação é o recurso por meio do qual a legislação permite a impugnação de decisões que tenham natureza de sentença;
  • Como se vê, trata-se de um recurso cuja finalidade é a de se estabelecer um controle sobre o teor das decisões com fisionomia de sentença, na conformidade com o conceito posto pelo art. 162.

1.3) Admissibilidade

a) Considerações gerais: os requisitos de admissibilidade do recurso de apelação são aqueles geralmente exigidos para todos os recursos em geral. Obviamente, existem os que são intrínsecos e os extrínsecos, merecendo a análise alguns desses requisitos que se destacam:
  • Requisitos intrínsecos - cabimento: o recuso e apelação tem o seu cabimento sempre que a impugnação desejada pelo recorrente tenha como alvo uma decisão com natureza de sentença. Será este o recurso, aliás, tanto nos casos de sentença terminativa como na situação de sentença definitiva. Fredie Didier, no entanto, faz citações em suas obras sobre situações capazes de gerar dúvida, e com as quais exige a necessidade de cuidado: 
  • Uma delas está ligada à Lei nº 1.060/50, art. 17, dispositivo em que o legislador afirma que o recurso cabível da decisão que defere ou indefere o benefício será sempre a apelação. Neste caso, todavia, não é assim que a jurisprudência tem entendido, tampouco a doutrina. Nesses dois campos, firmou-se uma opinião no sentido de que decisão dessa natureza desafia o recurso de agravo. E assim é porque no mais das vezes ela não tem caráter de sentença, mas de decisão interlocutória. O que se verifica aí é que, embora o legislador da lei de assistência judiciária gratuita procura atribuir a condição de sentença a uma decisão que realmente não tem essas características. É por isto que exige-se um certo cuidado quanto à definição da modalidade de recurso, pois o cabimento se dará em razão daquilo que a decisão apresenta como sua natureza própria; 
  • Entretanto, por vezes o legislador processual ignora propositadamente este dado, para preservar certos princípios processuais indispensáveis. Foi o que se deu na hipótese referida pelo CPC, art. 475-H. Note-se que nessa disposição o legislador define o cabimento do recurso de agravo para o ataque à decisão que julga o procedimento de liquidação. Não há ninguém na doutrina que deixe de reconhecer o caráter de sentença da decisão que julga o processo de liquidação. Nada obstante isso, o legislador preferiu apontar o agravo como o recurso cabível. Ele quis preservar o sincretismo processual, acatando esta decisão como se fosse uma mera interlocutória. E não há nenhuma irregularidade nisso; 
  • É importante lembrar também que nem toda sentença desafia o recurso de apelação. O legislador, mesmo quando reconhece o caráter de sentença, pode atribuir outro recurso como cabível em determinada situação. O exemplo normalmente lembrado pela doutrina é o relativo à Lei de Execuções Fiscais, art. 34, para a qual determinado tipo de sentença, cujo valor do crédito não seja elevado, o recurso cabível serão os embargos infringentes, decididos pelo próprio Juiz. 
  • Requisitos extrínsecos: 
  • Tempestividade: segundo a disposição do art. 508, o recurso de apelação deve ser interposto no prazo de 15 dias, contados a partir da ciência da decisão. Não se pode esquecer aqui que algumas partes gozam do benefício de prazo em dobro para recorrer, como é o caso estampado no art. 188, que estabelece esse privilégio do MP e da Fazenda Pública; 
  • Regularidade formal: o recurso de apelação deve observar a forma prevista pelo art. 514 do CPC. Isto significa que as razões endereçadas ao tribunal competente por petição não somente precisam ser escritas, mas também necessitam abarcar a matéria impugnada, com destaque não só para o pedido, mas também para seus fundamentos, de maneira a nitidamente estampar, através da crítica devida à sentença, a pretensão de sua reversão pelo tribunal. Como se trata de recurso de fundamentação livre, o apelante poderá se valer de todos os argumentos que entenda convincentes e relevantes à reversão do julgado.

b) Súmula Impeditiva de Recurso e Admissibilidade: diz o CPC, no art. 518, §1º, que o Juiz não poderá admitir apelação se estiver sendo impugnada uma sentença prolatada conforme súmula do STJ ou do STF. Por isto é que a doutrina rotula este caso como hipótese de "súmula impeditiva de recursos". A regra deriva do sistema de precedentes obrigatórios implantado desde a EC nº 45/04. Como é notório, o legislador busca por intermédio deste sistema resolver duas grandes questões, ou seja, a relativa à segurança jurídica e a pertinente à solução de causas repetitivas:
  • O problema da segurança jurídica é constatado pelo grande volume de decisões díspares sobre causas idênticas, fenômeno que inquieta bastante os operadores do direito. Não há argumento que justifique o fato de uma mesma situação receber julgamentos diferentes quando o sistema jurídico é um só;
  • O segundo problema, relativo às causas repetitivas, diz respeito à necessidade de se agilizar a solução judicial nessas hipóteses. Assim, quando se firma um precedente único para uma situação de fato frequentemente trazida aos tribunais, o precedente obrigatório influir na solução mais célere da questão, embora veiculada em muitos procedimentos.
Natureza jurídica da súmula impeditiva de recurso: inexistem dúvidas quanto ao fato de que ela expressa um requisito de admissibilidade, a ser apreciado já no momento da interposição do recurso pelo juízo de primeiro grau. Questiona-se, todavia, se se trata de um requisito intrínseco ou extrínseco. Neste ponto, é perfeitamente plausível o entendimento de que se trata de um requisito intrínseco, porque fica claro pelo dispositivo a impossibilidade ou inexistência do próprio direito de recorrer contra sentença fundada em súmula do STJ ou do STF.


1.4) Efeitos do Recurso de Apelação - art. 520

O dispositivo é no sentido de que este recurso deve ser recebido, em geral, no efeito devolutivo e suspensivo. Em algumas hipóteses, como a do indeferimento da inicial, ou a do julgamento liminar no art. 285-A, haverá também o efeito regressivo.

Deve-se observar, todavia, que os incisos do art. 520 cuidam de uma exceção ao enunciado geral por dizerem respeito a situações em que não haverá efeito suspensivo na apelação. São várias as hipóteses, como por exemplo aquela em que a apelação se volta contra decisão proferida em ação de alimentos, ou em ação demarcatória. Nesses casos listados pelo legislador, haverá apenas o efeito devolutivo. 

Dito isto, parte importante da doutrina, como Didier, Marinoni, etc., observa que os casos em que a lei não permite o efeito suspensivo nos recursos podem ser entendidos como exceção, de modo a se permitir ao Judiciário a concessão desse efeito negado pela lei. Obviamente, a fundamentação para esta hipótese é a urgência retratada no art. 558. 

O fato é que há decisões cuja execução imediata podem conduzir a um dano irreversível, de modo a se tornar aconselhável a concessão judicial do efeito suspensivo para se evitar este quadro. O próprio relator do recurso poderá conceder este efeito mediante decisão fundamentada.


a) Efeito Regressivo

Em algumas situações específicas, o legislador prevê o efeito regressivo para o recurso de apelação. As hipóteses mais marcantes são aquelas trazidas pelos art. 296 e 285-A, ou seja, na apelação cabível contra decisão de indeferimento da inicial ou de seu julgamento liminar de improcedência. Nesses dois casos, como se sabe, uma vez interposto o recurso e apresentadas as razões, o Juiz poderá retratar-se da decisão anterior caso se convença da legitimidade da argumentação do recorrente.


b) Teoria da Causa Madura

Consequência de uma das últimas reformas processuais, o art. 515, §3º, estabelece que o tribunal, nas hipóteses de apelação contra sentenças terminativas, poderá, depois de prover o recurso, prosseguir no julgamento e deliberar sobre o mérito da causa, desde que se refira a matéria exclusivamente de direito, ou à matéria de fato e de direito com provas bastantes dos autos (causa madura).

É óbvio que esta medida visa à agilização da solução do litígio, mas apenas cabe diante de dois pressupostos, a saber:

  • Apelação contra sentença fundada no art. 267;
  • Causa madura.
Essa solução sempre foi muito bem avaliada pela doutrina porque atende ao princípio da economia processual e ao princípio da duração razoável do processo. Questiona-se, todavia, se o tribunal poderá passar ao julgamento do mérito quando não exista pedido expresso da parte recorrente nesse sentido. Autores como Fredie Didier, por exemplo, entendem imprescindível essa medida, ante a força do princípio dispositivo. Todavia, não é equivocado pensar-se que o tribunal possa agir independentemente disto, uma vez que a lei expressamente o autoriza, e uma vez que lhe cabe o impulso oficial. 

De qualquer maneira, o que é certo é a necessidade de que as partes se pronunciem sobre o mérito antes que o tribunal o aprecie, o que é uma exigência dos princípios do contraditório e do processo cooperativo.

Seria possível a aplicação analógica deste dispositivo em hipóteses de julgamento fundado nos arts. 269, 285-A ou 296? Essa discussão tem haver com situações análogas decorrentes de sentenças fundadas no art. 269, como por exemplo aquela que reconhece a prescrição ou a decadência. Nesses casos, como é fácil perceber, o processo é extinto sem julgamento de mérito propriamente dito, embora a decisão tenha essa natureza. Assim, se o tribunal reverte esta decisão que havia extinguido o processo por força de prescrição, que motivo haveria para impedir a aplicação do art. 515, §3º, com a consequente decisão da questão principal pelo tribunal? Obviamente, nada poderia impedir, pois as situações são análogas, desde que se trate de causa madura.

Doutrina e jurisprudência tem admitido largamente o emprego desse dispositivo na hipótese. Em alguns casos, inclusive, admite-se a mesma postura frente a decisões fundadas no art. 285-A. Vale lembrar que esta regra se encontra presente no projeto do novo CPC, com a previsão expressa da ampliação de seu uso para os casos referidos. 


c) Nulidade Sanável e Apelação

O art. 515, §4º, buscando também agilizar a solução da lide, determina que o tribunal, ao constatar uma nulidade sanável, suspenda o julgamento do recurso, e determine às partes sua sanação, com os autos no tribunal. Com isto, evita-se a restituição dos autos à origem e se resolve o problema da invalidade mais rapidamente, com a retomada do julgamento do recurso logo após. 


1.5) Processamento do Recurso no Tribunal

Atente-se para o fato de que o processamento do recurso no tribunal seguirá as regras delimitadas pelos art. 547 e ss.


Nenhum comentário:

Postar um comentário