Adimplemento e Extinção das Obrigações
1) Pagamento
3) Imputação do Pagamento - CC, art. 352 a 355
É a indicação da dívida que deve ser extinta na hipótese de o valor oferecido ser insuficiente para a quitação de todas elas. Requisitos:
a) Que haja mais de uma dívida da mesma natureza entre o devedor e o credor;
b) Que o valor oferecido seja insuficiente para o pagamento de ao menos uma das dívidas.
Ex.: "A" deve 3 dívidas para "B": uma de 30, uma de 70 e uma de 100. Dá em pagamento 100. Quais dessas dívidas está pagando? No silêncio, quem indica a dívida, isto é, quem faz a imputação, é o devedor.
3.1) Limites à Imputação Feita pelo Devedor
O devedor não pode imputar o pagamento a uma dívida ilíquida, salvo se o credor concordar.
- Se a dívida imputada tem juros, ele não pode imputar o pagamento no principal, devendo primeiramente pagar os juros, salvo se o credor concordar;
- Se uma das dívidas ainda não estiver vencida, é possível imputar-lhe pagamento, desde que o prazo seja para beneficiar o devedor. A imputação é renúncia tácita a esse prazo que beneficiava o devedor.
3.2) Imputação Feita pelo Credor
Se o devedor não indica a dívida que pagou, o credor faz a imputação, indicando a dívida no recibo.
- Se o credor, por erro, indica uma dívida diversa da que ele queria indicar, não se anula a imputação - art. 353;
- O credor só pode anular a imputação por ele feita se foi vítima de dolo ou coação. Não cabe anulação por erro.
3.3) Imputação Legal
Se o devedor e o credor são omissos quanto à imputação, aplica-se o que diz a lei:
- Imputa-se o pagamento à dívida mais antiga, que é a que se venceu primeiro, independente de qual tenha sido contraída primeiro;
- Se as dívidas se venceram no mesmo dia, imputa-se o pagamento à dívida mais onerosa (juros mais altos, multa, hipoteca, objeto de ação judicial).
4) Sub-rogação - art. 346 a 351
É a transferência dos direitos do credor, com todas suas garantias e acessórios, a um terceiro que lhe efetuou o pagamento ou emprestou o necessário para o devedor pagar a dívida.
Ao terceiro sub-rogado transfere-se o crédito com os acessórios e garantias, como juros, hipoteca, fiança, cláusula penal, etc.
4.1) Efeitos
a) Extingue a obrigação em relação ao credor;
b) Transfere para o terceiro os direitos do credor.
- É a mesma obrigação que é transferida ao terceiro, não se tratando, portanto, de nova obrigação. É uma substituição do credor pelo terceiro, na mesma obrigação
4.2) Diferença entre Sub-rogação e Cessão de Crédito
A cessão de crédito é feita pelo credor; a sub-rogação (cessão legal) emana da lei, e em regra independe da vontade do credor.
Na cessão de crédito, o credor transfere o crédito sem tê-lo recebido; na sub-rogação ocorre pagamento, isto é, o credor é satisfeito.
A cessão de crédito deve ser notificada ao devedor; a sub-rogação dispensa essa notificação.
Na cessão de crédito, o credor-cedente responde pela existência do crédito; na sub-rogação, a lei não lhe prevê essa responsabilidade.
4.3) Espécies
A sub-rogação pode ser legal ou convencional.
a) Sub-rogação legal: é a que emana diretamente da lei, ocorrendo independentemente da vontade das partes. Hipóteses:
- Credor do devedor paga dívida que o devedor deve pra outro credor (ex.: credor paga débitos trabalhistas do devedor. Automaticamente, este credor adquire estes créditos trabalhistas, tornando-se privilegiado). O CC de 1916 só previa essa sub-rogação quando o credor pagasse um credor privilegiado do devedor (credor trabalhista, hipotecário, etc.). O CC de 2002 não faz mais essa exigência, apesar da interpretação diversa de Maria Helena Diniz. Logo, o credor se sub-roga se pagar qualquer credor de seu devedor, seja ou não privilegiado (posição dominante);
- Adquirente de imóvel penhorado ou hipotecado, que paga credor da penhora ou da hipoteca (ex.: João comprou bem penhorado ou hipotecado por 100. Ele pagou 70 diretamente para o credor daquela penhora ou hipoteca, para extinguir o gravame. Automaticamente, João se sub-roga, isto é, adquire os direitos daquele credor). Esta hipótese versa simultaneamente sobre sub-rogação e compensação, isto é, ele pode usar este crédito sub-rogado para compensar o que ele deve para o vendedor do imóvel do bem;
- Adquirente de imóvel que efetua pagamento para não ser privado de direitos sobre o bem (ex.: pagamento de IPTU e condomínio atrasados). Ele se sub-roga.;
- Pagamento efetuado por terceiro juridicamente interessado (ex.: fiador, avalista, devedor solidário, devedor de obrigação indivisível, etc.).
A sub-rogação legal não pode ter efeito especulativo, isto é, visar lucro. O terceiro sub-rogado só pode cobrar do devedor o que desembolsou, e não todo o valor do crédito - art. 330 (ex.: dívida de 100, fiador pagou 70, e o credor deu a quitação total. O fiador sub-rogou-se apenas em 70).
b) Sub-rogação convencional: é a feita por acordo entre as partes. Só é possível em duas hipóteses:
- Terceiro efetua pagamento ao credor em troca de este lhe transferir expressamente os direitos que tem perante o devedor. Trata-se de sub-rogação que emana da vontade do credor, e por isso segue as regras da cessão de crédito - art. 348. A diferença é que na cessão de crédito, o credor transferiu o crédito sem que se lhe houvesse feito o pagamento. Na sub-rogação, o pagamento foi feito;
- Terceiro empresta dinheiro para o devedor pagar a dívida em troca de este lhe transferir os direitos do credor. É a única sub-rogação cujo pagamento é feito pelo próprio devedor, e não por terceiro. Se realiza independentemente do consenso do credor. A cláusula de sub-rogação deve ser inserida antes de o devedor pagar. Se for inserida depois do pagamento, não é sub-rogação, e sim uma nova obrigação, um novo negócio.
O Código Civil é omisso sobre o efeito especulativo da sub-rogação convencional (ex.: dívida de 100, terceiro paga 70. Credor dá a quitação):
- 1ª corrente: não pode ter efeito especulativo, pois é proibido o enriquecimento sem causa;
- 2ª corrente: é possível o efeito especulativo, mediante cláusula expressa;
- 3ª corrente: no silêncio, é possível o efeito especulativo, pois a lei proibiu expressamente apenas na sub-rogação legal. Ademais, este efeito é permitido na cessão de crédito, que é similar à sub-rogação convencional.
4.4) Sub-rogação Parcial
Terceiro efetua pagamento de apenas uma parte da dívida. Se o patrimônio do devedor for insuficiente, paga-se primeiro o antigo credor, e depois terceiro sub-rogado em seu direito de regresso.
4.5) Sub-rogações Pessoal e Real
No Direito das Obrigações, o Código Civil prevê a sub-rogação pessoal, que é a substituição do credor pelo terceiro sub-rogado.
Já a sub-rogação real (ou do vínculo) é a substituição de um bem por outro, que passa a ter os mesmos atributos do primeiro (ex.: Juiz autoriza venda de bem que tinha cláusula de inalienabilidade, mas exige que se adquira outro bem, para o qual se sub-rogará essa cláusula).
5) Dação em Pagamento - art. 356 a 359
Datio in solutum. É a extinção da obrigação pela entrega de uma prestação diversa da devida, mediante concordância do credor (ex.: dívida de 100, o devedor dá um carro em pagamento, e o credor concorda).
Só há dação em pagamento se o credor concordar, pois o credor não é obrigado a receber outra prestação, ainda que mais valiosa (princípio da identidade física da prestação).
Se o credor concorda com a substituição da prestação por outra antes do vencimento, o negócio não é dação em pagamento, mas sim obrigação facultativa. Portanto, dação em pagamento pressupõe acordo feito após o vencimento da dívida.
Na dação em pagamento, o credor recebe a prestação aliud pro alio, uma coisa pela outra, ou seja, a prestação lhe é entregue para extinguir a obrigação, quer valha mais, quer valha menos que a prestação devida. Logo, ninguém pode pleitear diferenças de prestação.
Se as partes determinam o valor da coisa dada em pagamento, o negócio segue as regras da compra e venda, e não da dação em pagamento - art. 357 (ex.: recebimento de bem por valor determinado para pagamento parcial de uma dívida).
A prestação dada em pagamento pode ser uma coisa móvel ou imóvel, ou um fato - obrigação de fazer ou não fazer (ex.: dívida de 100 quitada pelo devedor via construção de um muro).
A prestação substituída pode ser de qualquer natureza (dinheiro, bem ou fato).
5.1) Dação em Pagamento com Dinheiro
Se a prestação dada em pagamento for dinheiro (ex.: "A" deve um carro para "B". "A" oferece R$100 e "B" concorda):
- 1ª corrente: é dação em pagamento, pois o CC não prevê nenhuma restrição (diferentemente do antigo CC de 1916 - Carlos Roberto Gonçalves);
- 2ª corrente: não é dação em pagamento, pois se há dinheiro não é dação em pagamento, mas compra e venda (Maria Helena Diniz). Especificado o valor do bem, o negócio segue as regras da compra e venda. Logo, se dá dinheiro em pagamento, com maior razão se segue também tais regras.
5.2) Diferença entre Dação em Pagamento e Compra e Venda
a) Compra e venda tem natureza jurídica de contrato, isto é, é um negócio que dá nascimento à obrigação; dação em pagamento tem natureza de pagamento especial ou anômalo, e é um negócio que extingue a obrigação;
b) A compra e venda é negócio jurídico consensual, isto é, forma-se com o simples acordo de vontades, independentemente da entrega do bem; a dação em pagamento é um negócio jurídico real, isto é, para se formar, para existir, além do acordo de vontades, exige-se a entrega do bem (tradição). Mero acordo de vontades, sem a entrega do bem, não é dação em pagamento;
c) Evicção é a perda do bem por sentença, que o atribui a um terceiro. Na compra e venda, se ocorrer a evicção, resta ao comprador pleitear indenização, mas a compra e venda não é rescindida nem anulada pela evicção. Na dação em pagamento, se ocorrer a evicção, rescinde-se a dação em pagamento, isto é, restaura-se a dívida que estava extinta, com todas as garantias e acessórios, exceto a fiança, isto é, o fiador estará liberado ainda que ocorra a evicção - art. 838, III.
- Dação em pagamento de bem imóvel, tal qual a compra e venda, exige autorização de cônjuge, salvo o regime de separação de bens.
5.3) Pagamento com Título de Crédito
Se o sujeito dá em pagamento um cheque, uma nota-promissória, etc., para extinguir a dívida, o negócio não é dação em pagamento.
- Em regra, pagamento com título de crédito é pro solvendo, isto é, só extingue a obrigação após o recebimento do título. Referido pagamento é, na verdade, uma cessão de crédito, e não uma dação em pagamento;
- Pagamento pro soluto é aquele em que a simples entrega do título de crédito já extingue a dívida, somente sendo possível mediante cláusula expressa nesse sentido (ex.: contrato com cláusula dizendo que a simples entrega do cheque já extingue a dívida, ainda que não tenha fundos). Quem paga aluguel com cheque sem fundo, em regra, pode ser réu em ação de despejo, pois o pagamento é pro solvendo. Cheque sem fundo não é pagamento. Se, porém, houver cláusula pro soluto no contrato, não é cabível o despejo, pois houve o pagamento. Cabe apenas a execução do cheque.
O pagamento pro soluto não é dação em pagamento. Trata-se de novação. Na dação em pagamento, a dívida é extinta sem que outra dívida surja em seu lugar. Na novação, a dívida é extinta, mas surge outra em seu lugar (no ex.: extingue-se a dívida do aluguel, mas surgiu a dívida do cheque).
5.4) Espécies de Dação em Pagamento
a) Total;
b) Parcial: extingue apenas uma parte da obrigação;
c) Dação em função do cumprimento (datio pro solvendo): o devedor realiza uma prestação diversa da devida, não para extinguir a obrigação, mas para facilitar o credor a receber seu crédito (ex.: "A" deve 200 num bar. Faz acordo para indicar amigos para irem ao bar, até esses amigos consumirem 200. Não é prevista no Código Civil, mas é possível estipula-la com base na liberdade de contratar).
- Na verdadeira dação em pagamento, a simples entrega da prestação extingue a obrigação (bastaria a simples indicação do bar para amigos). Na datio pro solvendo isto não ocorre (não bastaria simplesmente indicar o bar para amigos).
5.5) Diferenças entre Dação em Pagamento e Adjudicação em Execução
Em ambos, o credor concorda em receber uma prestação diversa da que lhe é devida.
Na dação em pagamento, o próprio devedor entrega a prestação ao credor; na adjudicação, o Estado-Juiz entrega o bem penhorado ao credor-exequente.
Na dação em pagamento, credor e devedor não podem pleitear diferenças de valores, pois a coisa é entregue aliude pro alio (para extinguir a obrigação); na adjudicação, o credor requer a entrega do bem pelo valor da avaliação. Se seu crédito for superior ao bem, ele pode pleitear a diferença. Se seu crédito for inferior ao bem, ele tem que pagar a diferença.
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