segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

01 - Direito Penal - Noções, Fontes e Princípios


Direito Penal


1) Introdução

É a ciência que estuda o crime e suas consequências jurídicas. Nesse estudo, conjuntos de pensamentos foram formados para analisar três principais aspectos:

a) Natureza jurídica do crime;

b) Fundamento da legitimidade do direito de punir;

c) Finalidades da pena.

  • São várias as escolas penais. Todavia, duas se destacam por conta da originalidade de suas ideias.

1.1) Escola Clássica, de Francesco Carrara

Nesta escola, o crime é:
  • Um ente jurídico, isto é, uma criação feita pelo homem;
  • A responsabilidade penal está fundamentada na imputabilidade, diante do livre arbítrio do indivíduo em praticar condutas;
  • A finalidade da pena é predominantemente retributiva.

1.2) Escola Positivista, que está dividida em três fases:

1.2.1) Fase Antropológica, de Cesare Lombroso (autor da obra "O Homem Delinquente", que supõe haver um perigoso nato, com características físicas próprias, predestinado a praticar crimes). Suas ideias foram seguidas no Brasil por Nina Rodrigues;

1.2.2) Fase Sociológica, de Enrico Ferri, que afirma que o meio social influencia na prática de delitos;

1.2.3) Fase Jurídica, de Rafaele Garófalo, segundo a qual o crime é:
  • Um fenômeno natural, decorrente do meio social e da própria natureza de convivência do ser humano;
  • A responsabilidade penal está fundamentada na periculosidade, na probabilidade de alguém delinquir;
  • A finalidade da pena é, acima de tudo, preventiva, pois visa evitar a prática de novos delitos, seja pelo seu exemplo, seja pela retirada do criminoso do seio social.

Escola decorrentes: na sequência, várias escolas surgiram, dentre as quais a 3ª Escola Italiana, a Escola Moderna Alemã, a Escola da Defesa Social, etc., que misturam as ideias acima em maior ou menor proporção.


2) Fontes do Direito Penal

Fonte é aquilo que estabelece a origem de alguma coisa. No Direito Penal, as fontes estão separadas em duas espécies: 

2.1) Material, ou de Criação

Como regra, a União é a única fonte material de direito penal. Excepcionalmente, os Estados-membros poderão legislar sobre direito penal, desde que autorizados por Lei Complementar e estritamente em questões regionais - CF/88, art. 22, Parágrafo único (competência privativa delegável);


2.2) Formal, ou de Cognição

Estão separadas em duas espécies:

a) Mediatas ou indiretas: costumes, princípios gerais do direitos; a equidade, etc.;

b) Imediatas ou diretas: lei. A lei penal, enquanto única fonte formal imediata de direito penal, está dividida em duas espécies:
  • Incriminadora: é aquela que cria crimes e estabelece penas, que está estruturada da seguinte maneira:
  • Preceito primário: consistente na descrição da conduta proibida ou exigida; 
  • Preceito secundário: consistente na sanção penal; 
  • Lei penal não incriminadora: cuida de direito penal, mas não estabelece crimes, nem penas, admitindo várias espécies, tais como:
  • Permissivas; 
  • Explicativas; 
  • Outras  (ex.: norma que define funcionário público para fins penais - CP, art. 327).

3) Interpretação da Norma Penal, ou Hermenêutica

É a atividade que busca estabelecer o conteúdo ou a abrangência da lei. Os principais critérios que buscam classificar esta atividade são os seguintes:


3.1) Quanto ao Sujeito

a) Autêntica, ou legislativa: a própria lei estabelece a sua explicação. Neste caso, tem força obrigatória,. Inclusive, quando isto ocorrer em lei posterior, verifica-se efeito ex tunc;

b) Judicial, ou jurisprudencial: a explicação é feita pelo Juiz. Como regra, não tem força obrigatória, exceto a Súmula Vinculante - CF/88, art. 103-A;

c) Doutrinária: a explicação é feita pelos teóricos e estudiosos do direito, e não tem força obrigatória.


3.2) Quanto ao Resultado

a) Declaratória: a lei disse exatamente o que queria dizer;

b) Interpretação restritiva: a lei disse mais do que queria dizer, cabendo ao intérprete restringir o seu alcance;

c) Interpretação extensiva: a lei disse menos do que queria dizer, cabendo ao intérprete ampliar o seu alcance, sempre utilizando um método de dedução lógica.


4) Princípios Orientadores de Direito Penal

O direito penal, sempre que entra em cena, incomoda o indivíduo, na medida em que afeta alguns direitos, principalmente a sua liberdade. Por esta razão, surgem alguns princípios que buscam restringir a incidência do direito penal nas relações sociais. Portanto, esses princípios orientadores também são chamados de limitadores do direito penal. São vários princípios, alguns explícitos e outros implícitos na CF/88, sendo que o da dignidade da pessoa humana é o que comanda todos os demais.

Respeitado este princípio estruturante, surgem os seguintes:


4.1) Intervenção Mínima

O direito penal somente deve ser utilizado em última hipótese (ultima ratio) para tutelar as relações sociais, baseado em duas características:

a) Subsidiariedade: somente quando os demais ramos do direito não forem suficientes para proteger determinado bem jurídico é que o penal deve entrar em ação;

b) Fragmentariedade: deve se ocupar somente das ofensas graves.


4.2) Intransmissibilidade da Pena, ou da Pessoalidade da Sanção Penal

A pena não passa da pessoa do condenado. A parte final do inciso XLV do art. 5º da CF/88 estabelece duas hipóteses em que efeitos da condenação podem ser transmitidos aos sucessores, mas na medida do patrimônio herdado:

a) Dever de reparar o dano;

b) Perdimento de bens e valores.
  • O CP, art. 1º, estabelece o princípio da reserva legal, que também está previsto na CF/88, art. 5º, XXXIX, segundo o qual não há crime e não há pena sem lei.

4.3) Legalidade

Não há crime sem lei que o defina. Não há pena sem cominação legal. A lei define a conduta punível, definindo também a pena - CP, art. 1º. O que a lei não proíbe, é permitido.
  • Os fatores de integração da norma (costumes, princípios gerais do direito, analogia) não se aplicam ao crime, pois somente a lei determina o crime. Porém, os mesmos podem ser adotados para dar um direito ou um benefício ao réu. Não, se admite, portanto, analogia em malam partem, mas sim em bonam partem. A única exceção está na Lei Penal não incriminadora excepcional, isto é, aquela que abre uma exceção a uma regra geral, que não admite nenhuma forma de analogia.
CESPE Juiz CE 2013 - 38) Em relação à analogia, assinale a opção correta:
E) O uso do instituto da analogia pressupõe, necessariamente, uma lacuna involuntária da norma em vigor.
O termo "crime" é utilizado no sentido amplo, e abrange também a contravenção penal.

Alguns autores diferenciam legalidade e reserva legal:
  • FMB diz que o termo "lei" está empregado em seu sentido genérico, admitindo qualquer forma normativa prevista na CF/88, art. 59, enquanto reserva legal abrange exclusivamente aquela situação em que a Constituição exige a previsão de "lei";
  • Outros autores estabelecem que legalidade é sinônimo de reserva legal, entre eles Luiz Regis Prado;
  • Finalmente, alguns autores afirmam que legalidade é gênero que admite duas espécies: reserva legal e anterioridade (Capez).

4.4) Taxatividade

O rol incriminador é taxativo, não admitindo ampliação sem atividade legislativa. A lei penal deve ser clara e precisa, não podendo ter muitas lacunas, as quais poderiam ferir a segurança jurídica do autor da infração penal, pois para fatos iguais poderiam ocorrer decisões diametralmente opostas.

Este princípio é importante para afastar o arbítrio do julgador. O mesmo raciocínio se aplica às "margens penais", que são os limites mínimos e máximos das penas previstas. Esses limites devem ser próximos para que em casos similares não hajam decisões desequilibradas. Respeitada a taxatividade, admite-se em Direito Penal as chamadas "leis incompletas", cuja estrutura não está totalmente formada, necessitando do implemento de outros veículos nas seguintes hipóteses:

a) Tipo aberto: o complemento é realizado pelo Juiz, como ocorre com os crimes culposos, nos quais o legislador não diz o que é imprudência, negligência ou imperícia, e o operador do direito vai identificar a conduta.

b) Norma penal em branco: o complemento é realizado por outro ato normativo:
  • Norma penal em branco homogênea: o complemento é feito com ato normativo da mesma espécie da norma penal;
  • Norma penal em branco heterogênea: o complemento é feito com ato normativo de espécie diferente da norma penal, como Portaria da ANVISA que informam as substâncias vedadas pela Lei nº 11.434/2006 (Antidrogas).

4.5) Anterioridade e Irretroatividade:

Não há crime sem lei anterior. Não há pena sem a prévia cominação. A lei deve viger por ocasião da conduta nela descrita. A lei que incrimine não se aplica a fatos anteriores.

Porém, a lei mais benéfica, assim entendida aquela que beneficie o réu, deve ser aplicada a fatos já acontecidos - CP, art. 2º e seu parágrafo único.


4.5.1) Abolitio Criminis

Aplica-se a lei que deixou de considerar crime fato que antes o era considerado, a qual retroage para arquivar inquéritos (só o Juiz arquiva inquérito), extinguir processos, revogar sentenças, inclusive as que estiverem transitadas em julgado (ato do Juiz da Execução), pondo o preso em liberdade.

A abolitio criminis afasta os efeitos da sentença penal condenatória, tanto os efeitos primários (pena) quanto os secundários (antecedentes ou "ficha", "zerando" a reincidência, etc.). Foi o que aconteceu com o adultério, a sedução, o rapto consensual.

Porém, a abolitio criminis não gera efeitos de natureza civil (não afasta o dever de indenizar, reparar, nem será razão para a ação rescisória, etc.) - também chamados efeitos extra-penais.


4.5.2) Novatio Legis in Mellius

É a lei posterior que beneficia o agente em relação a fato que era típico.

a) Lei que transforma crime em contravenção penal (situação difícil de se verificar na prática no Brasil, mas o contrário acontece bastante, isto é, contravenções que passaram a ser crimes no Estatuto do Desarmamento e no CTB);

b) Lei de Drogas, art. 28 e 33, §2º.
  • Quem aplica a lei mais benéfica é o órgão jurisdicional que está com o processo, isto é:
  • Durante o inquérito e o processo de conhecimento: Juiz da causa; 
  • Durante o recurso: o Relator (Desembargador ou Ministro); 
  • Durante a execução (após transitada a condenação): o Juízo da condenação, conforme Súmula nº 611-STF:
Súmula nº 611-STF: TRANSITADA EM JULGADO A SENTENÇA CONDENATÓRIA, COMPETE AO JUÍZO DAS EXECUÇÕES A APLICAÇÃO DE LEI MAIS BENIGNA.
Esse pedido dirigido ao Juiz da execução, de aplicação da lei mais benéfica, deve ser veiculado em requerimento simples, não sendo hipótese de revisão criminal, cujas hipóteses estão taxativamente previstas no CPP, art. 621 (há entendimentos contrários). O habeas corpus é cabível se for caso de violação da liberdade de locomoção.
CPP, art. 621. A revisão dos processos findos será admitida:
I - quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos;
II - quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos;
III - quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena.
Pode ser que uma lei modifique uma pena de RECLUSÃO DE 1 A 2 ANOS para DETENÇÃO DE 2 A 4 ANOS. Caso o Juiz fique em dúvida sobre qual é a lei mais benéfica, há duas correntes:
  • A primeira corrente, mais técnica, entende que persistindo a dúvida, aplica-se o princípio do tempus regit actum (lei vigente à época da conduta);
  • A segunda corrente, mais justa, entende que persistindo a dúvida, indaga-se ao réu, por seu defensor, qual "prefere".

4.5.3) Combinação de Leis

Significa misturar duas ou mais leis, geralmente em seus aspectos mais benéficos, para se alcançar o benefício para o réu. Tratando da questão, há duas correntes.
  • A primeira corrente afirma ser inconstitucionalidade a combinação de leis, pois o Juiz estaria criando uma terceira lei (lex tertia), e portanto legislando e violando a separação dos Poderes (Nelson Hungria). No STJ, a Súmula 501 também diz ser proibido;
Súmula nº 501-STJ: É cabível a aplicação retroativa da Lei 11.343/06, desde que o resultado da incidência das suas disposições, na íntegra, seja mais favorável ao réu do que o advindo da aplicação da Lei 6.368/76, sendo vedada a combinação de leis.
  • A segunda corrente defende a constitucionalidade da combinação de leis, pois o Juiz deve aplicar a lei com equidade, isto é, a distribuição da melhor justiça no caso concreto - José Frederico Marques.
No STF, admite-se a aplicação da pena de reclusão de 3 a 6 anos (sem multa) prevista no art. 8º da Lei dos Crimes Hediondos para o crime de associação para o tráfico, o qual é previsto na Lei de Drogas, mas com pena de 3 a 10 anos (com multa). Entendendo não haver razão para essa discrepância entre as penas, o Supremo misturou as leis, fazendo incidir a pena mais branda. Compare:
Lei de Drogas, art. 35. Associarem-se duas ou mais pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 desta Lei:
Pena - reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e pagamento de 700 (setecentos) a 1.200 (mil e duzentos) dias-multa.

Lei dos Crimes Hediondos, art. 8º Será de três a seis anos de reclusão a pena prevista no art. 288 do Código Penal, quando se tratar de crimes hediondos, prática da tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins ou terrorismo.

4.5.4) Lei Processual Penal

A nova lei processual penal tem imediata aplicação, resguardados os atos processuais já praticados - CPP, art. 2º. Significa dizer que mesmo que ela seja mais grave e prejudicial ao agente, deverá ser aplicada (ex.: a reforma processual penal de agosto de 2008 - Lei nº 1.6689/08, que acabou com o recurso "Protesto por Novo Júri". O casal Nardoni que foi julgado e condenado em março de 2010 não teve direito a este recurso, mesmo tendo o crime sido praticado antes da reforma acima mencionada) - AgReg no RE 752988:
Ementa: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PENAL. PROCESSUAL PENAL. SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA PROFERIDA APÓS A VIGÊNCIA DA LEI QUE ABOLIU DO SISTEMA PROCESSUAL O RECURSO “PROTESTO POR NOVO JÚRI”. APLICAÇÃO DO PRECEITO PROCESSUAL PENAL REVOGADO TENDO EM CONTA O ELEMENTO OBJETIVO ANTERIORMENTE PREVISTO NA LEI: A CONDENAÇÃO À PENA SUPERIOR A VINTE ANOS. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. I - O protesto por novo júri, que constituía prerrogativa de índole processual e exclusiva do réu, cumpria função específica em nosso sistema jurídico: a invalidação do primeiro julgamento, que se desconstituía para todos os efeitos jurídico-processuais, a fim de que novo julgamento fosse realizado, sem, contudo, afetar ou desconstituir a sentença de pronúncia e o libelo-crime acusatório (HC 67.737/RJ e HC 70.953/SP, Rel. Min. Celso de Mello). II – Esse recurso sui generis era cabível nas condenações gravíssimas (vinte anos ou mais), com o escopo de realizar-se novo julgamento, sem invalidar totalmente a sentença condenatória, que, em face do princípio da soberania dos veredictos dos jurados, somente poderia ser alterada ou cassada pelo próprio Tribunal do Júri. III - Cuida-se, portanto, de recurso da decisão do júri para outro júri, provocando-se novo pronunciamento (NORONHA, Magalhães. Curso de Direito Processual Penal, Saraiva. 10 edição, São Paulo: Saraiva, 1978, p. 364), sendo certo de que a presunção que informa o protesto por novo júri é a possibilidade de redução da reprimenda estabelecida, sem se perquirir acerca da ocorrência de eventual nulidade ou injustiça da sentença condenatória (RHC 58.392/SP, Rel. Min. Soares Muñoz; HC 75.479/DF, Rel. Min. Néri da Silveira). IV - Nos termos do art. 2º do CPP, “a lei processual aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior”. Desse modo, se lei nova vier a prever recurso antes inexistente, após o julgamento realizado, a decisão permanece irrecorrível, mesmo que ainda não tenha decorrido o prazo para a interposição do novo recurso; se lei nova vier a suprimir ou abolir recurso existente antes da prolação da sentença, não há falar em direito ao exercício do recurso revogado. Se a modificação ou alteração legislativa vier a ocorrer na data da decisão, a recorribilidade subsiste pela lei anterior. V - Há de se ter em conta que a matéria é regida pelo princípio fundamental de que a recorribilidade se rege pela lei em vigor na data em que a decisão for publicada (GRINOVER. Ada Pellegrini; GOMES FILHO. Antonio Magalhães; FERNANDES, Antonio Scarence. Recursos no processo penal: teoria geral dos recursos em espécie, ações de impugnação, reclamação aos tribunais, 5ª ed. São Paulo: RT, 2008, p. 63). VI - No caso em exame, os recorrentes foram condenados pelo Tribunal do Júri de São Paulo em 26 de março de 2010. No ato de interposição do recurso de apelação, formalizaram o pedido alternativo de recebimento da impugnação recursal como “protesto por novo júri”, pleito que não foi acolhido porque esse recurso sui generis fora extinto pela Lei 11.689, que entrou em vigor em 8 de agosto de 2008, antes, portanto, da prolação da sentença penal condenatória. VII – Acolhimento do pedido alternativo de recebimento da apelação como recurso de “protesto por novo júri”, mesmo após o julgamento do recurso de apelação, contra o qual também houve a formalização de recursos de natureza extraordinária. Pretensão insubsistente e intenção de, por via oblíqua, desde logo cassar o acórdão da apelação, cujos fundamentos ainda não estão sob o crivo desta Corte. VIII – Agravo regimental ao qual se nega provimento.
Surgem duas hipóteses nas quais deverá ser aplicada a lei processual penal mais favorável. Elas estão previstas na Lei de Introdução ao CPP, art. 2º:

a) Fiança;

b) Prisão preventiva (cautelar).
  • Quanto à lei híbrida (que contém aspectos penais e processuais penais), será o aspecto penal que comandará a sua retroatividade, ou seja, quando este aspecto penal for mais grave (prejudicial ao réu), a lei híbrida não retroagirá por inteiro (ex.: o art. 366 do CPP passou a estabelecer que o réu citado por edital e revel, que não constitui advogado nos autos, terá suspensão do processo, assim como da prescrição - aspecto penal - dispositivo que não retroage por inteiro, pois suspensão da prescrição prejudica o réu. Portanto, o processo não fica suspenso):
PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. RÉU REVEL. SUSPENSÃO DO PROCESSO. SUSPENSÃO DO CURSO DO PRAZO PRESCRICIONAL. CPP, ART. 366, COM A REDAÇÃO DA LEI 9.271/96. I. - Impossibilidade de se aplicar a suspensão do processo, quando se tratar de réu revel, conforme previsto no art. 366, com a redação da Lei 9.271/96, deixando de aplicar a regra da suspensão do curso do prazo prescricional, também prevista no mesmo dispositivo legal. II. - H.C. indeferido. STF, HC 74.695
  • Quando o aspecto penal foi mais benéfico, a lei híbrida retroagirá por inteiro (ex.: a parte criminal da Lei nº 9.099/95 é predominantemente processual penal. Todavia, há um aspecto penal consistente na representação estabelecida no art. 88, para os crimes de lesão leve e lesão corporal culposa. Neste caso, o art. 90 estabeleceu que estas disposições não poderiam ser aplicadas em processos cuja instrução já havia começado);
  • O STF, na ADI 1719, deu interpretação conforme a Constituição a este art. 90 para determinar a retroatividade da lei para todos os casos (puxados pelo aspecto benéfico do art. 88, que exige representação - e réus em processo sem representação foram beneficiados):

EMENTA: PENAL E PROCESSO PENAL. JUIZADOS ESPECIAIS. ART. 90 DA LEI 9.099/1995. APLICABILIDADE. INTERPRETAÇÃO CONFORME PARA EXCLUIR AS NORMAS DE DIREITO PENAL MAIS FAVORÁVEIS AO RÉU. O art. 90 da lei 9.099/1995 determina que as disposições da lei dos Juizados Especiais não são aplicáveis aos processos penais nos quais a fase de instrução já tenha sido iniciada. Em se tratando de normas de natureza processual, a exceção estabelecida por lei à regra geral contida no art. 2º do CPP não padece de vício de inconstitucionalidade. Contudo, as normas de direito penal que tenham conteúdo mais benéfico aos réus devem retroagir para beneficiá-los, à luz do que determina o art. 5º, XL da Constituição federal. Interpretação conforme ao art. 90 da Lei 9.099/1995 para excluir de sua abrangência as normas de direito penal mais favoráveis ao réus contidas nessa lei.
Portanto, na lei híbrida, se tiver matéria penal, tudo retroage para beneficiar o réu, inclusive aspectos processuais.


4.6) Humanidade (Dignidade da Pessoa Humana):

O Direito Penal não pode violar o direito humano, nem atentar contra sua dignidade.

Este princípio tem a função de proibir a aplicação e execução de penas que atentem contra a dignidade humana e os direitos humanos fundamentais (ex.: penas de morte - salvo guerra, cruéis, tortura, castigos corporais, trabalho forçado, banimento, perpétua).


4.7) Culpabilidade (Responsabilidade Penal Subjetiva):

Não há crime sem culpa (lato sensu). Todo crime pressupõe um culpado (responsabilidade do sujeito).
  • Dolo: intenção, finalidade, vontade;
  • Culpa (stricto sensu): resultado sem intenção, falta de cuidado em razão de imprudência, negligência ou imperícia (o tipo penal deve expressamente prever a hipótese de admissão da modalidade culposa).
Se não há dolo nem culpa, o fato é atípico.

O Direito Penal brasileiro adota a Teoria Finalista da Ação: o ser humano se move com alguma finalidade. Essa intenção caracteriza o crime. O que caracteriza o verbo (matar, roubar, furtar) é a intenção do agente, e não a consequência.
  • A intenção de matar, mas que causa lesão, é homicídio tentado;
  • A intenção de lesionar, mas que cause morte, é lesão seguida de morte.
Por isso, o dolo ou culpa caracteriza o verbo escrito no tipo, sendo portanto elemento do tipo. Se não há dolo ou culpa, falta o elemento do tipo. Logo, o fato é atípico.

A Teoria que contrapõe a essa é a Causalista, na qual o dolo e a culpa não são elementos do tipo (onde o crime é definido como fato típico e antijurídico, apenas). A ação humana é homicídio se houver a morte, independentemente da intenção do agente.

  • Culpabilidade: somente responde criminalmente o agente que age com dolo ou culpa, pois é proibida a responsabilidade objetiva em direito penal. Esta ideia surgiu no CP, art. 19 (em 1984, antes mesmo da CF/88), no qual, mesmo no crime preterdoloso, a responsabilidade penal exige que o agente tenha agido ao menos com culpa.
  • No caso da pessoa jurídica, a Lei Ambiental, art. 3º, Parágrafo único,  baseado nos parâmetros do caput, adotou a teoria da dupla imputação, isto é, reconhece a necessidade de uma pessoa física que haja com dolo ou culpa em nome da pessoa jurídica, e por esta razão, ambas podem ser responsabilizadas criminalmente.

4.8) Lesividade (Ofensividade)

Para que se tenha crime, é necessário lesionar bem de terceiro, de forma relevante.

A autolesão não é crime, mas se tal conduta gerar dano em patrimônio alheio, é punível (ex.: grávida que tenta o suicídio mas apenas aborta, reponde pelo aborto).

Iter criminis. Fases:

a) Cogitação

b) Preparação

c) Execução

d) Consumação
  • O Direito Penal não alcança a Cogitação e a Preparação, pois não alcançam bem jurídico alheio;
  • Porém, caso o legislador tipifique a preparação, será possível punir autonomamente (ex.: formação de quadrilha - CP, art. 288; petrecho para falsificar moeda - CP, art. 291).

4.10) Insignificância (Bagatela)

Decorrência do Princípio da Lesividade. Lesões ínfimas, pequenas, insignificantes, devem ser desconsiderados, e o fato será tratado como atípico.

De acordo com o STF, são compatíveis com a insignificância os seguintes crimes:
  • Patrimoniais não violentos (furto, dano, apropriação indébita, estelionato, receptação);
  • Contra a administração pública, principalmente de natureza tributária - Lei nº 8.137/90 e o descaminho - CP, art. 334, com valor de até R$20.000,00 (STJ: R$10.000,00);
  • Contra a honra;
  • Lesões corporais (mínimas);
  • Militares;
  • Ambientais - STF, HC nº 112.563, e STJ;
  • Atos infracionais - STF, HC nº 112.400;

O STF não admite aplicação do Princípio da Insignificância aos crimes:
  • Violentos;
  • Tráfico de drogas - Lei nº 11.343/06, art. 33;
  • Crimes de falsificação de moeda - CP, art. 289;

  • Contrabando - STF, HC nº 110.964;
  • Estelionato contra o INSS, o FGTS ou o seguro desemprego.


O Princípio da Insignificância é desdobrado em atipicidade material, apesar de sua tipicidade formal.




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