terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

09 - Controle de Constitucionalidade


Controle de Constitucionalidade


1) Formas de Controle de Constitucionalidade

1.1) Controle Preventivo

É exercido durante o processo legislativo. No Brasil, cabe inicialmente ao Poder Legislativo, que o exerce em diversos momentos, sendo o mais conhecido o exame dos projetos pelas Comissões de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara e do Senado, cabendo recurso ao Plenário.

Há ainda outros momentos, como por exemplo a atividade do Presidente da Casa que pode arquivar de plano o projeto manifestamente inconstitucional, cabendo recurso ao Plenário.

Na verdade, a qualquer momento que os Parlamentares detectarem uma inconstitucionalidade, poderá argui-la, sendo este um dever dos mesmos no exercício do mandato.

Na Câmara dos Deputados, todos os projetos, após passar por uma das 20 Comissões temáticas (apreciação do mérito), passam pelas mãos da CCJC.

No Senado, a Comissão temática analisa também a constitucionalidade, e o projeto só seguirá para a CCJC em casos especiais previstos no Regimento Interno, como solicitação da CPI, ou requisito do Presidente da Casa.

Também o Poder Executivo exerce o controle preventivo de constitucionalidade. Afinal, o Presidente da República pode vetar os projetos por motivo de inconstitucionalidade (veto jurídico).

Além disso, o Poder Judiciário também exerce o controle preventivo, mas em uma situação específica. Isso ocorrerá se durante o processo legislativo ocorrer a prática de ato que contrarie diretamente norma constitucional sobre processo legislativo. No âmbito federal, apenas o STF exercerá este controle, mediante provocação de qualquer parlamentar federal, pois os parlamentares possuem o direito público subjetivo de participar do devido processo legislativo.

O STF, no controle judicial preventivo, resolverá apenas o caso concreto, não existindo controle abstrato preventivo (não há ADI preventiva). Geralmente, a ação utilizada é o mandado de segurança.

O controle judicial preventivo é meramente formal. 

Admite-se também controle judicial preventivo na hipótese de PEC tendente a abolir cláusula pétrea, pois a CF/88, art. 60, §4º, estabelece que esse tipo de proposta não será objeto de deliberação. O conteúdo será analisado (e somente o Min. Teori diz que aqui há controle material, já que o mérito precisa ser estudado).

Se não houver ofensa direta à Constituição, mas sim mera divergência interpretativa dos regimentos do legislativo, não será exercido o controle judicial, por tratar-se de questão interna corporis do Poder Legislativo (Princípio da Separação dos Poderes).


1.2) Controle Repressivo

É exercido após a publicação da lei, ainda que durante a vacatio legis. No Brasil, o controle repressivo é predominantemente judicial, e apenas em situações específicas será exercido pelos demais Poderes.

O Poder Legislativo exercerá o controle repressivo nas seguintes hipóteses: 

a) Excesso no poder regulamentar - CF/88, art. 49, V: o Congresso poderá, mediante Decreto Legislativo, sustar atos do Executivo que exorbitem os limites de seu poder regulamentar (há PEC para alteração deste dispositivo para permitir que o Legislativo suste atos normativos "dos demais Poderes", como uma reação contra o ativismo judicial, em que o Judiciário acaba normatizando situações através do entendimento de juristas, e não pela efetiva vontade democrática dos legítimos detentores do poder, o povo);

b) Excesso no uso da lei delegada - CF/88, art. 49, V (o mesmo dispositivo): o Congresso poderá, mediante Decreto Legislativo, sustar atos do Executivo que extrapolem os limites da delegação legislativa. É uma referência à Lei Delegada editada pelo Presidente, desrespeitando os limites estabelecidos pelo Congresso no momento em que autorizou o Presidente a legislar;

c) Inconstitucionalidade na medida provisória - CF/88, art. 62: o Congresso poderá rejeitar medida provisória por motivo de inconstitucionalidade.


Quanto ao Poder Executivo, exercerá controle repressivo no momento em que a Administração anula ato da própria Administração por motivo de inconstitucionalidade. Além disso, parte da doutrina entende que ainda foi preservado o costume constitucional que autoriza o Executivo a deixar de cumprir leis que considere inconstitucionais. Seria um controle repressivo exercido pelo Executivo.


2) Sistemas de Controle (JAS)

O tema refere-se à natureza do Poder ou órgão que exerce o controle de constitucionalidade. 

2.1) Controle Judicial (Sistema de Matriz Norte Americana) 

EUA, 1803: como o nome diz, esse é o sistema que autoriza o Poder Judiciário a manifestar-se sobre inconstitucionalidade. Surgiu nos EUA no momento em que a Suprema Corte, em 1803, reconhecia a possibilidade de declaração de inconstitucionalidade dos atos do Legislativo e do Executivo por parte do Judiciário. Aquela Suprema Corte manifestou-se, dessa maneira, no caso Marbury X Madison (judicial revew):
Diante de sua derrota para o concorrente Thomas Jefferson, o 2º Presidente dos EUA John Adams (que tentava se reeleger) aproveitou para nomear diversos Juízes em seus últimos dias de governo, pretendendo manter certo controle sobre o país cuja independência ajudou a proclamar (ele é também o primeiro Vice-Presidente, com George Washington). Nos EUA, o Vice-Presidente é o candidato com segundo número de votos, que assume em caso de morte do primeiro (curiosamente, 8 presidentes dos EUA morreram no exercício do mandato).

Um dos Juízes então nomeados foi William Marbury, mas cuja formalização da nomeação dependida da entrega do diploma. Encerrado o mandato sem que isso acontecesse, o novo Secretário de Justiça James Madison recusou-se a fazê-lo, levando Marbury a impetrar um writ of mandamus.

Ao final, Willian Marbury garantiu sua nomeação, pois apesar de não estar com o documento em mãos, o mesmo havia sido assinado e selado.

Porém, à princípio, o próprio Juiz Marshal havia constatado que a Suprema Corte não tinha competência para julgar o caso. Contudo, foi desenvolvido um raciocínio na seguinte sequência: assim como a Suprema Corte não tinha competência para julgar aquele processo, também o novo Governo não tinha competência para baixar norma que limitasse o poder constitucionalmente distribuído ao Judiciário no sistema da tripartição com freios e contrapesos (como tinha feito o Governo Jefferson). Então, nessa impossibilidade de invasão mútua da esfera dos Poderes uns pelos outros, também não poderia Jefferson revogar a nomeação consolidada do Juiz Marbury. Outra conclusão não poderia haver senão a de que era válida a nomeação do Juiz Marbury.

Se por um lado o Juiz Marshal defendia que esta era a visão de repartição dos poderes de Montesquieu, o Secretário Madison publicou texto em jornal de New York onde lamentava a concentração de poder nas mãos do judiciário, contrário à visão de Montesquieu. O Juiz Marshal rebateu afirmando que o que Montesquieu vislumbrava era o perigo do total poder nas mãos de um dos Poderes, como o Executivo pretendia fazer.

A partir desta interpretação de que toda lei deve ser compatível com a Constituição, passou-se a um período que foi denominado por alguns como o "governo dos Juízes", pois a Constituição passou a ser aquilo que o Judiciário diz que é, tendo inclusive julgado um grande caso em que se concluiu, à luz da Constituição, que os escravos não eram pessoas, mas propriedade de seus senhores. Isto naturalmente levou descrédito à Suprema Corte.

É inegável, pois, que, em certa medida, o mesmo processo acontece no Brasil, onde o direito cada vez mais é aquilo que o STF diz que é. A lei não definirá situações como "o momento em que começa a vida", por exemplo. Porém, um Tribunal que absolutamente não representa a vontade política do povo (seus membros não foram eleitos), impõe a concepção de talvez 6 cabeças (julgamentos por maioria) à nação.
Nos EUA, não há manifestação do Judiciário em controle abstrato.


2.2) Controle Político (Sistema de Matriz Austríaca)

O controle é exercido por órgão que não integra o judiciário. Esta é a concepção tradicional de controle político. Para Elival da Silva Ramos, o controle também pode ser denominado político, ainda que exercido por órgão judicial, se a avaliação promovida para o julgamento for exclusivamente política. É a hipótese, segundo o autor, do julgamento, pelo STF, da Representação Interventiva, na hipótese da CF/88, art. 34, VII.

Um dos modelos de controle político de maior destaque foi desenvolvido por Kelsen e adotado pela primeira vez pela Constituição da Áustria de 1920. Segundo este sistema, não cabe ao Judiciário manifestar-se sobre inconstitucionalidade. Esta tarefa deve ser exercida exclusivamente por um Tribunal Constitucional autônomo (desvinculado do Judiciário). Via de regra, os membros deste Tribunal Constitucional possuem mandato temporário. Este Tribunal pode ser provocado diretamente a manifestar-se sobre a inconstitucionalidade de leis, promovendo um controle abstrato de constitucionalidade, julgando representações de inconstitucionalidade. Julga, também, incidentes de inconstitucionalidade oriundos do Judiciário.

É o modelo atualmente predominante na Europa, adotado dentre outros países pela Áustria, Alemanha, Espanha, Itália, França, etc. Esta predominância do modelo na Europa é diretamente ligada à sua cultura fortemente marcada por autores (como Rousseau) que sempre enalteceram a vontade do povo na produção legislativa, tornando difícil aceitar que uma lei feita pelo povo pudesse ser invalidada por um Poder de Estado.


2.3) Controle Misto

Nesse sistema, o controle de determinadas leis cabe ao Judiciário, e de outras a um Tribunal Constitucional autônomo. 

É o caso, por exemplo, da Suíça, onde o controle das leis federais compete ao Tribunal Constitucional, ao passo que as leis dos cantões cabe ao Judiciário. Esta classificação não se confunde com o modelo do Brasil.


3) Controle Judicial no Brasil

3.1) Evolução Histórica

O Brasil adotou, por influência dos EUA, o controle judicial em 1890, o que foi confirmado pela Primeira Constituição Republicana de 1891 - "Constituição de Rui Barbosa".

A Carta Política do Império, sob influência do Direito público francês e inglês, deixava a guarda da Constituição ao Poder Legislativo, composto por representantes da nação, embora a presença de um quarto Poder (Moderador) – exercido pelo Imperador e incumbido de velar sobre a manutenção da independência, equilíbrio e harmonia dos outros três, e que, acima de tudo, poderia dissolver o Poder Legislativo – anulasse, no plano prático, tal atribuição. Assim, conforme determinava a Constituição de 1824:
Art. 15 É da Atribuição da Assembléia Geral:
8.º) Fazer leis, interpretá-las, suspendê-las e revogá-las.
9.º) Velar na guarda da Constituição, e promover o bem geral da Nação.”
A Constituição de 1891 manteve a atribuição conferida ao Poder Legislativo de velar na guarda da Constituição, retirando-lhe, contudo, o caráter de exclusividade:
Art. 35 – Incumbe, outrossim, ao Congresso, mas não privativamente:
§1º - Velar na guarda da Constituição e das leis, e providenciar sobre as necessidades de caráter federal.
De fato, inspirada no modelo norte-americano, a Constituição abrigou a doutrina do judicial review, atribuindo ao Poder Judiciário a competência para deixar de aplicar as leis e atos normativos que estivessem em confronto com o texto constitucional e que, deste modo, careceriam de validade. Nesse sentido dispunha a Constituição:
§ 1º - Das sentenças das Justiças dos Estados, em última instância, haverá recurso para o Supremo Tribunal Federal:
a) quando se questionar sobre a validade, ou a aplicação de tratados e leis federais, e a decisão do Tribunal do Estado for contra ela;
b) quando se contestar a validade de leis ou de atos dos Governos dos Estados em face da Constituição, ou das leis federais, e a decisão do Tribunal do Estado considerar válidos esses atos, ou essas leis impugnadas.
Este sistema foi mantido pela Constituição de 1934, mas que trouxe duas novidades: previu a Resolução do Senado para suspender a execução das leis declaradas inconstitucionais pelo STF e ainda passou a prever a Representação Interventiva para viabilizar a intervenção federal.

A Constituição de 1937 manteve o controle judicial concreto, mas aboliu as novidades da Constituição de 1934, e ainda previu que o Legislativo poderia cassar as decisões judiciais que declarasse seus atos inconstitucionais. 

A Constituição de 1946 restabeleceu o modelo de 1934 (controle judicial concreto, Resolução do Senado e Representação Interventiva). Durante a vigência desta Constituição, uma emenda, em 1965, criou a figura da representação de inconstitucionalidade que poderia ser proposta exclusivamente pelo Procurador Geral da República perante o STF para provocar o controle abstrato de constitucionalidade.

Esse sistema foi mantido pela Constituição de 1967 (inclusive a representação de inconstitucionalidade), e somente o PGR era legitimado. No período militar, criou-se ainda a chamada "Ação Avocatória", que era proposta pelo PGR perante o STF, pedindo que o Supremo avocasse (chamasse para si) o julgamento das ações judiciais em trâmite nos vários órgãos do Poder Judiciário, nas quais se discutia a inconstitucionalidade de leis federais.

A Constituição de 1988 fortaleceu o controle judicial, especialmente no momento em que ampliou o rol de legitimados da representação de inconstitucionalidade que passou a ser chamada de ADI, além de outras novidades como a previsão de ações que combatem inconstitucionalidade por omissão, mandado de injunção, etc.

No Brasil, o controle judicial é exercido, em certos casos, exclusivamente pelo STF, sendo então chamado Controle Concentrado. Tem sido habitual na doutrina brasileira e no próprio STF a associação do controle concentrado ao controle abstrato, além da previsão de outras denominações para o mesmo controle como "principal", "direto", "objetivo", "fechado".

Por outro lado, em outras situações, o controle judicial não é exercido exclusivamente pelo STF, mas também por qualquer Juiz e qualquer Tribunal, recebendo o nome de Controle Difuso. Boa parte da doutrina brasileira e o próprio STF identificam este controle com o "concreto", "incidental", "indireto", "subjetivo", "aberto".


PGFN 2015
14- Sobre o sistema brasileiro de controle de constitucionalidade, assinale a opção incorreta.
a) A Constituição de 1934, mantendo o sistema de controle difuso, introduziu a ação direta de inconstitucionalidade interventiva, a cláusula de reserva de plenário e a atribuição ao Senado Federal de competência para suspender a execução, no todo ou em parte, de lei ou ato declarado inconstitucional por decisão definitiva.
b) A ruptura do chamado “monopólio da ação direta”, outorgado ao Procurador-Geral da República para o exercício de controle de constitucionalidade de leis no Brasil, ocorreu com a Constituição de 1946.
c) A partir da Constituição de 1891 consagrou-se, no direito brasileiro, a técnica do controle difuso de constitucionalidade, repressivo, posterior, pela via da exceção ou defesa, pela qual a declaração de inconstitucionalidade se implementa de modo incidental como prejudicial ao mérito.
d) A Constituição de 1824 não contemplava qualquer modalidade de controle de constitucionalidade das leis. Era outorgada ao Poder Legislativo, sob infl uência francesa, a atribuição de fazer leis, interpretá-las, suspendê-las e revogá-las, bem como velar pela guarda da Constituição.
e) A Constituição de 1937 vedou expressamente ao Poder Judiciário conhecer das questões exclusivamente políticas.
GABARITO: B


Um texto bom sobre a evolução histórica: aqui.


3.2) Classificação do Controle Judicial 

O controle judicial pode ser classificado de duas maneiras.

3.2.1) Quanto ao seu Exercício pelo STF

a) Controle Concentrado: exercido exclusivamente pelo STF;

b) Controle Difuso: exercido pelo STF e pelos demais órgãos do Poder Judiciário.


3.2.2) Quanto à Natureza da Discussão

a) Controle Abstrato: não envolve conflitos concretos;

b) Controle Concreto: feito na análise de um conflito concreto.

  • Pode acontecer de um controle ser concentrado e não ser abstrato, como no caso de Mandado de Segurança contra ato do Presidente da República, e todos as demais ações concretas em que o STF seja instância originária - CF/88, art. 102, I (salvo a alínea "a", que é controle abstrato). Por isso, essa classificação acima oferecida é mais elaborada do que aquela tratada pelo STF, que no cotidiano de seus julgamentos, usa as expressões "concentrado" e "abstrato" quase que como sinônimas.


PGFN 2015
7-  O Congresso Nacional, por ambas as Casas, aprovou um projeto de lei, posteriormente sancionado, promulgado e publicado. Após entrar em vigor, inúmeras ações foram ajuizadas contra o ato normativo (lei), todas elas sob o argumento de que a lei acolhia evidente excesso de poder legislativo (excesso de poder no exercício da função legislativa, ou simplesmente, como doravante, “excesso de poder legislativo”), sendo incompatível com os fins constitucionalmente previstos. Tomando-se por base esse argumento, assinale a opção correta.
GABARITO: d) Uma das formas de manifestação de excesso de poder legislativo é a inconstitucionalidade substancial.

PGFN 2015
17- Assinale a opção correta.
GABARITO: c) A inconstitucionalidade material envolve não somente o contraste direto do ato legislativo com o parâmetro constitucional, mas também a aferição do desvio de poder ou do excesso de poder legislativo.


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