segunda-feira, 26 de maio de 2014

10 - Controle de Constitucionalidade - Controle Difuso I

Controle Difuso

1) Introdução

O controle difuso é provocado por qualquer ação judicial, individual ou coletiva, que tenha por finalidade a solução de concretos conflitos de interesses; ações que buscam a defesa de direitos específicos violados por um ato inconstitucional. Nessas ações, o pedido é a defesa de direitos específicos, e a questão da inconstitucionalidade aparece na causa de pedir.

Esta forma de provocação do controle difuso para a solução de casos concretos é conhecida pela doutrina como via de exceção ou defesa. Por esta via, é possível questionar a inconstitucionalidade de lei federais, estaduais e municipais em face da CF/88.

A decisão judicial no controle difuso tem efeito inter partes, o que significa que a lei questionada não será invalidada; a decisão apenas determina que tal lei não será aplicada àquele caso concreto. A referência à inconstitucionalidade, nessas hipóteses, não aparece no dispositivo, e sim na fundamentação da decisão judicial. É o que se denomina declaração incidental de inconstitucionalidade.

Assim, a inconstitucionalidade, no controle difuso, não é pedido, mas fundamento, razão pela qual pode o Juiz declará-la ainda que as partes não o requeira expressamente. Por não ser pedido, o reconhecimento, de ofício, do incidental de inconstitucionalidade não é decisão extra petita

Por não proferir julgamento que busque invalidar a lei, no controle difuso o Juiz Estadual está autorizado a reconhecer a inconstitucionalidade de Lei Federal no caso concreto a ele distribuído. O Poder Judiciário tem caráter Nacional, sendo una e indivisível a jurisdição. O direito legislado no Brasil é eminentemente Federal, sendo aplicado tanto pelo Juiz Estadual quanto pelo Federal. A questão é de simples constatação se considerado os exemplos dos Códigos Civil, Penal, Tributário, Consumidor, etc. - Leis Federais cotidianamente estudadas pelas Varas e Tribunais Estaduais.

  • Trocando em miúdos: a Justiça Comum pode declarar incidentalmente, nos autos de um processo em julgamento, a inconstitucionalidade de leis federais.

O STF tem entendido que esta decisão com alcance inter partes tem, via de regra, efeito ex tunc entre as partes. Porém, o Judiciário poderá, por razões de segurança jurídica ou excepcional interesse social, alterar o alcance temporal do julgado entre as partes, fixando, por exemplo, efeito ex nunc ou pro futuro. Essa modulação dos efeitos da decisão é uma construção jurisprudencial derivada do comando da Lei da ADI, art. 27.

Na hipótese de ação civil pública, cuja legislação faz referência à eficácia erga omnes da decisão (art. 16), o STF tem posição consolidada no sentido de que esta ação só poderá provocar o controle difuso incidental, ou seja, a questão da inconstitucionalidade só poderá constar da causa de pedir, e jamais do pedido. Caso contrário, haveria usurpação de competência do STF, pois seria uma ADI disfarçada.


2) Cláusula de Reserva de Plenário

Os Tribunais também exercem o controle difuso, mas devem observar a CF/88, art. 97, que prevê o Princípio da Reserva de Plenário, segundo o qual os Tribunais só podem declarar a inconstitucionalidade de leis e atos normativos pelo voto da maioria absoluta de seus membros, ou do Órgão Especial, o qual pode ser criado nos Tribunais com mais de 25 magistrados para exercer as funções jurisdicionais e administrativas que seriam do Pleno.

A razão de ser da reserva de plenário é o fato de que, em nome da segurança jurídica e da estabilidade das relações sociais, o reconhecimento de inconstitucionalidade pelos Tribunais deve competir ao órgão que o representa, de modo patente - maioria absoluta.

A Constituição estabeleceu a exigência do art. 97 aos Tribunais porque, além de serem órgãos colegiados, suas decisões gozam de estabilidade. O disposto neste artigo, em momento algum, impede que o Juiz singular, ao proferir sentenças, se manifeste no sentido da inconstitucionalidade de leis.

As decisões do Juiz de 1º grau, além de serem marcadas com certo grau de precariedade decorrente do duplo grau de jurisdição (a sentença será naturalmente submetida a novo exame), afirmam a posição "unânime" daquele órgão singular. Já as decisões do Tribunal, além deste ser o último grau para exame da questão (isto é, das provas, as quais não serão revolvidas no STJ e no STF), demarcarão a posição daquele órgão, mesmo que não seja à unanimidade.

Rechaça-se, pois, nesta ordem de raciocínio, o argumento de que o Juiz não pode declarar a inconstitucionalidade incidental.

O CPC, art. 480 a 482, ajusta a atuação dos órgãos fracionários dos Tribunais (Câmaras, Turmas, Seções) ao art. 97 da Constituição da seguinte maneira:
  • Se o órgão fracionário entender que a lei questionada no processo é constitucional, poderá julgar de imediato o caso;
  • Se o órgão fracionário entender que a lei questionada é inconstitucional, não poderá julgar de imediato o caso. Lavrará Acórdão expondo sua posição sobre a inconstitucionalidade, e remeterá os autos ao Pleno do Tribunal. Ocorre uma cisão funcional de competência, ou como denominava Pontes de Miranda, "per sautum";
  • Então, a declaração de constitucionalidade não depende da cláusula de reserva de plenário, diante da presunção de constitucionalidade das leis.
O Pleno discutirá apenas esta questão da inconstitucionalidade, e lavrará acórdão firmando sua posição sobre a existência ou não, devolvendo o processo ao órgão fracionário que julgará o caso concreto, aplicando, quanto à questão da inconstitucionalidade, a posição do Pleno. Deste terceiro Acórdão é que se recorrerá. 

Se não for observada a reserva de plenário, a decisão é nula.

A reserva de plenário é dispensada nas seguintes hipóteses:

a) Se o STF, em caso anterior, no controle difuso, já tiver se manifestado no sentido da inconstitucionalidade da mesma lei. Já se reconhecia que esta seria uma hipótese de efeito transcendente das decisões do Supremo;

b) Se em caso anterior, o Pleno do próprio Tribunal já tiver se manifestado no sentido da inconstitucionalidade da mesma lei. Tem prevalecido nos Tribunais a posição de que se o Pleno, no julgamento de incidente de inconstitucionalidade, manifestar-se no sentido da constitucionalidade da lei questionada, estarão os órgãos fracionários, nos casos subsequentes, vinculados, e só poderá ser renovada a arguição de inconstitucionalidade por motivo relevante. Exemplo disso é o que consta no Regimento do TJ-SP, art. 191, §2º. Existe na doutrina posição divergente, como a do Min. Eros Grau;

c) Se o caso envolver a discussão de lei anterior à Constituição. Afinal, nessa situação, ocorre revogação, e não inconstitucionalidade.

A Súmula Vinculante nº 10 estabelece que se o órgão fracionário pretender deixar de aplicar lei ao caso concreto, mesmo sem mencionar textualmente a inconstitucionalidade, deverá respeitar a reserva de plenário. Na verdade, conforme explica o STF, isso só ocorrerá se o fundamento central da decisão conduzir à ideia de que a lei questionada é inconstitucional, mesmo sem o emprego do termo.
Súmula Vinculante nº 10: VIOLA A CLÁUSULA DE RESERVA DE PLENÁRIO (CF, ARTIGO 97) A DECISÃO DE ÓRGÃO FRACIONÁRIO DE TRIBUNAL QUE, EMBORA NÃO DECLARE EXPRESSAMENTE A INCONSTITUCIONALIDADE DE LEI OU ATO NORMATIVO DO PODER PÚBLICO, AFASTA SUA INCIDÊNCIA, NO TODO OU EM PARTE.
O STF não tem Órgão Especial, pois conta com 11 Ministros, e a maioria absoluta são apenas 6 Ministros;
  • O STF tem 2 turmas, cada uma com 5 Ministros.
O Órgão Especial do STJ se denomina Corte Especial, formada pelos 15 Ministros mais antigos. É o órgão máximo de julgamentos judiciais do STJ;
  • O Plenário do STJ é composto por no mínimo 33 Ministros, e cuida de assuntos administrativos;
  • Os Ministros são distribuídos em 6 Turmas, cada uma com 5 Ministros;
  • Cada 2 Turmas formam uma Seção:
  • A 1ª Seção (Direito Público) é formada pela 1ª e 2ª Turmas; 
  • A 2ª Seção (Direito Privado) é formada pela 3ª e 4ª Turmas; 
  • A 3º Seção (Direito Penal) é formada pela 5ª e 6ª Turmas.

3) O STF no Controle Difuso

3.1) Controle Concreto Difuso 

O Supremo Tribunal Federal também atua no controle difuso no momento em que julga casos que tratam de conflitos de interesses. De acordo com a tradição brasileira, o efeito das decisões no Supremo nesta seara também seria inter partes, podendo, a Corte, comunicar sua decisão ao Senado, comunicação esta que também pode ser feita pelo PGR. Independentemente de comunicação, o próprio Senado poderia agir de ofício. 

Enfim, havendo decisão do STF no controle difuso reconhecendo a inconstitucionalidade de lei, o Senado poderia editar uma resolução nos termos da CF/88, art. 52, X, para suspender a execução da lei declarada inconstitucional. Aí sim toda a sociedade seria atingida.

Sempre prevaleceu que o alcance temporal desta resolução seria ex nunc, apesar da posição divergente de Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso, que sustentaram o efeito ex tunc da resolução. Esta resolução só poderia suspender aquilo (o artigo ou parte daquilo) que o STF declarasse constitucional. Esta atuação do Senado sempre foi abrangente, independentemente da origem federativa da lei considerada inconstitucional.

PGFN 2012
3 - Sobre o sistema brasileiro de controle de constitucionalidade, é correto afirmar que:
GABARITO: b) nos expressos termos da Constituição de 1988, compete ao Senado Federal suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal.


2.2) Abstrativização do Controle Difuso

Há alguns anos, o Min. Gilmar Mendes lançou a tese de que seria preciso reconhecer a eficácia erga omnes das decisões do STF, proferidas no controle difuso, desde que emanadas do Plenário e pelo quórum da maioria absoluta. Sustentou, ainda, uma nova interpretação ao inciso X do art. 52 da CF/88, admitindo uma mutação constitucional deste dispositivo. Com isso, o papel da resolução do Senado seria apenas o de dar publicidade à Decisão do STF. 

Esta tese foi levantada na Reclamação nº 4335, proposta em 2007 pela DPE do Acre, e julgada em 20 de março de 2014. Neste julgamento, apesar do placar de 6 x 5 pelo provimento da Reclamação, não prevaleceu o entendimento da "eficácia expansiva" das decisões do Supremo no controle difuso de constitucionalidade, e não foi consolidado ainda o fenômeno da abstrativização ou objetivização do controle concreto.

Na verdade, a Reclamação em questão foi provida em razão da súmula vinculante nº 26, editada contemporaneamente:
Ementa: 1. Reclamação. 2. Progressão de regime. Crimes hediondos. 3. Decisão reclamada aplicou o art. 2º, § 2º, da Lei nº 8.072/90, declarado inconstitucional pelo Plenário do STF no HC 82.959/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 1.9.2006. 4. Superveniência da Súmula Vinculante n. 26. 5. Efeito ultra partes da declaração de inconstitucionalidade em controle difuso. Caráter expansivo da decisão. 6. Reclamação julgada procedente.
Há quem defensa que aconteceu sim a abstrativização nesse julgado, e que com esta decisão deveria ser dada uma nova interpretação ao inciso X do art. 52, e o papel da resolução do Senado seria apenas o de dar publicidade à decisão do STF.



2.2.1) Descendo a Detalhes da Questão

Sabe-se que legal e tradicionalmente as decisões proferidas em controle difuso de constitucionalidade vigoram entre as partes do caso concreto submetido à apreciação.

Excepcionalmente, poderiam as decisões do STF em controle difuso ser adotadas como parâmetro para julgamento de casos semelhantes, tanto por expressa declaração de extensão de seus efeitos, como em adoção por outros Juízes (certos de que o processo chegará às mãos do Supremo pela via recursal).

Mencione-se por esta última conclusão os exemplos dos HC 82.989 e HC 111.840, em que o STF declarou a inconstitucionalidade do regime inicialmente fechado e da impossibilidade de progressão de regime para condenados pelas Leis de Crimes Hediondos e de Drogas:
PENA - CRIMES HEDIONDOS - REGIME DE CUMPRIMENTO - PROGRESSÃO - ÓBICE - ARTIGO 2º, § 1º, DA LEI Nº 8.072/90 - INCONSTITUCIONALIDADE - EVOLUÇÃO JURISPRUDENCIAL. Conflita com a garantia da individualização da pena - artigo 5º, inciso XLVI, da Constituição Federal - a imposição, mediante norma, do cumprimento da pena em regime integralmente fechado. Nova inteligência do princípio da individualização da pena, em evolução jurisprudencial, assentada a inconstitucionalidade do artigo 2º, § 1º, da Lei nº 8.072/90.

EMENTA Habeas corpus. Penal. Tráfico de entorpecentes. Crime praticado durante a vigência da Lei nº 11.464/07. Pena inferior a 8 anos de reclusão. Obrigatoriedade de imposição do regime inicial fechado. Declaração incidental de inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei nº 8.072/90. Ofensa à garantia constitucional da individualização da pena (inciso XLVI do art. 5º da CF/88). Fundamentação necessária (CP, art. 33, § 3º, c/c o art. 59). Possibilidade de fixação, no caso em exame, do regime semiaberto para o início de cumprimento da pena privativa de liberdade. Ordem concedida.
Estas decisões têm fundamentado até mesmo revisões penais, considerando o disposto na Súmula 611-STF: "Transitada em julgado a sentença condenatória, compete ao juízo das execuções a aplicação de lei mais benigna". A questão não é pacífica, já que decisão judicial não é Lei:
"Ou seja, se o Supremo Tribunal Federal em 27/06/12, no HABEAS CORPUS nº 111.840 (controle difuso), reconheceu a inconstitucionalidade do parágrafo 1º do artigo 2º, da Lei n.8.072/90, com redação dada pela Lei 11.464/07, para um caso concreto que chegou à sua competência, é de se ponderar, pelo princípio da isonomia (art.5º, caput e inciso I, da CF), que a decisão deve ser aplicada a todos os reeducandos que nesta situação se encontram. Isso nada mais é do que reconhecer e reafirmar, sempre, que a pessoa do condenado jamais perderá sua condição humana e por isso será sempre merecedora de irrestrito respeito em seus direitos e garantias fundamentais." Comarca de Joinville/SC, Autos n.038.11.049270-3

2.2.2) Força Expansiva das Decisões do STF em Controle Difuso

O instituto da Repercussão Geral (existência de questão relevante que ultrapasse os requisitos subjetivos da causa) é requisito do Recurso Extraordinário, e não de todas as ações difusas que chegam ao STF. Este destaque é importante ao perfilhar seguinte raciocínio:
  • O STF só julga o RE cujo assunto seja do interesse da coletividade (repercussão geral), inadmitindo-o se o tema interessar somente para aquelas partes envolvidas;
  • Ora, se é do interesse da coletividade, não deveria o STF estender-se-lhe (à coletividade) o resultado? A repercussão não é geral? A questão não ultrapassa os interesses dos sujeitos da causa?
Ressalte-se, porém, que há outras ações de competência do STF que não dependem do requisito do §1º do art. 543-A do CPC (não dependem de repercussão geral). Reserve-se.

Em 21 de março de 2014, o STF concluiu o julgamento da Reclamação nº  4335, reconhecendo a progressão de regime nos crimes hediondos (algo que, aliás, já estava cristalizado na Súmula Vinculante nº 26):
Súmula Vinculante nº 26 PARA EFEITO DE PROGRESSÃO DE REGIME NO CUMPRIMENTO DE PENA POR CRIME HEDIONDO, OU EQUIPARADO, O JUÍZO DA EXECUÇÃO OBSERVARÁ A INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 2º DA LEI N. 8.072, DE 25 DE JULHO DE 1990, SEM PREJUÍZO DE AVALIAR SE O CONDENADO PREENCHE, OU NÃO, OS REQUISITOS OBJETIVOS E SUBJETIVOS DO BENEFÍCIO, PODENDO DETERMINAR, PARA TAL FIM, DE MODO FUNDAMENTADO, A REALIZAÇÃO DE EXAME CRIMINOLÓGICO.
Assim, há quem entenda que o STF consagrou a força expansiva de suas decisões. O Exmo. Sr. Ministro Teori afirmou:
“É inegável que, atualmente, a força expansiva das decisões do STF, mesmo quando tomadas em casos concretos, não decorre apenas e tão somente da resolução do Senado, nas hipóteses do artigo 52, inciso X, da Constituição”, e o fenômeno “está se universalizando por força de todo um conjunto normativo constitucional e infraconstitucional direcionado a conferir racionalidade e efetividade às decisões dos Tribunais Superiores e especialmente à Suprema Corte”.

2.2.3) Mutação Constitucional

É a hipótese de alteração da Constituição pela via interpretativa (sem mexer no texto).

Se a decisão inter partes do STF passa a ter eficácia erga omnes, própria das decisões proferidas em ADI, então estamos diante de verdadeira mutação constitucional, pois inexiste qualquer alteração da Constituição, pelo Poder Legislativo, a esse respeito.

Em razão da previsão da CF/88, art. 52, X, o STF costuma enviar ao Senado Federal Ofício informando que determinado dispositivo da Lei está em desacordo com a Constituição, tendo sido julgado inconstitucional, portanto. A partir daí, competiria ao Senado suspender a norma (ou ao Congresso modificá-la).

Já há, porém, interpretações no sentido de que esta comunicação é meramente informativa. Realmente, o dispositivo não diz que o STF deva obrigatoriamente informar o Senado. Independentemente disso, deveria o Senado realizar o que determina a Constituição. 

Aqui, novamente, havia controvérsias a respeito de uma possível invasão dos Poderes e violação do Princípio Democrático, pois o Judiciário estaria indo além da previsão constitucional de atuar como legislador negativo apenas nos casos de controle concentrado (ADI e ADC).


2.2.4) Teoria da Transcendência dos Motivos Determinantes

Por esta teoria, julgando processo em controle difuso ou concentrado, o STF poderia estender (transcender) as razões ali adotadas (os motivos determinantes) para outros casos idênticos - veja: não é estender a parte dispositiva das decisões, mas a ratio decidendi, como por exemplo o conteúdo do voto vencedor.

A teoria não é pacificamente adotada no STF, havendo divergências a respeito, mas um caso emblemático do instituto (no controle difuso) é o seguinte:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. (...) INCONSTITUCIONALIDADE, INCIDENTER TANTUM, DA NORMA MUNICIPAL. EFEITOS PARA O FUTURO. SITUAÇÃO EXCEPCIONAL. 1. (...) 8. Efeitos. Princípio da segurança jurídica. Situação excepcional em que a declaração de nulidade, com seus normais efeitos ex tunc, resultaria grave ameaça a todo o sistema legislativo vigente. Prevalência do interesse público para assegurar, em caráter de exceção, efeitos pro futuro à declaração incidental de inconstitucionalidade. Recurso extraordinário conhecido e em parte provido. (RE 197.917 - veja bem: RE, controle difuso, do MPE-SP versus município de Mira Estrela-SP).
*Apesar de perder a ação em que o MP questionava a quantidade de vereadores determinada pela lei municipal, em número maior do que determina a CF/88, o município de Mira Estrela-SP não teve seus vereadores diminuídos, pois a decisão teve seus efeitos modulados. Portanto, no futuro, o município de Mira Estrela-SP não poderia exceder a quantidade de vereadores prevista na CF/88.

A decisão, entretanto, nada fala sobre ser aplicável a outros casos, a outros municípios, erga omnes. E nem deveria mesmo, pois a decisão em controle difuso, como se sabe, tem efeitos inter partes.

Entretanto, a Resolução do TSE nº 21.702/04 adotou tais parâmetros para regulamentar a situação de forma genérica:
Art. 1º Nas eleições municipais deste ano, a fixação do número de vereadores a eleger observará os critérios declarados pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE nº 197.917, conforme as tabelas anexas.
O seja, o TSE emitiu Resolução dizendo que aquela decisão do STF passaria a ter efeito erga omnes. Um comando totalmente inovador no ordenamento jurídico brasileiro.
  • Dois mandados de segurança foram impetrados contra tal resolução, mas o STF se disse incompetente para tal - MS nº 25.170 e AO 1.137 AgR;
  • Duas ADIs nº 3.345 e 3.365 fora propostas contra tal resolução (pois é norma geral), mas o STF concluiu que:
EMENTA (...) CONSAGRAÇÃO, PELO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL, COM A EDIÇÃO DA RESOLUÇÃO Nº 21.702/2004, DOS POSTULADOS DA FORÇA NORMATIVA DA CONSTITUIÇÃO E DA SEGURANÇA JURÍDICA. - O Tribunal Superior Eleitoral, ao editar a Resolução nº 21.702/2004, consubstanciadora de mera explicitação de anterior julgamento do Supremo Tribunal (RE 197.917/SP), limitou-se a agir em função de postulado essencial à valorização da própria ordem constitucional, cuja observância fez prevalecer, no plano do ordenamento positivo, a força normativa, a unidade e a supremacia da Lei Fundamental da República. EFEITO TRANSCENDENTE DOS FUNDAMENTOS DETERMINANTES DO JULGAMENTO DO RE 197.917/SP - INTERPRETAÇÃO DO INCISO IV DO ART. 29 DA CONSTITUIÇÃO. - O Tribunal Superior Eleitoral, expondo-se à eficácia irradiante dos motivos determinantes que fundamentaram o julgamento plenário do RE 197.917/SP, submeteu-se, na elaboração da Resolução nº 21.702/2004, ao princípio da força normativa da Constituição, que representa diretriz relevante no processo de interpretação concretizante do texto constitucional. - O TSE, ao assim proceder, adotou solução, que, legitimada pelo postulado da força normativa da Constituição, destinava-se a prevenir e a neutralizar situações que poderiam comprometer a correta composição das Câmaras Municipais brasileiras, considerada a existência, na matéria, de grave controvérsia jurídica resultante do ajuizamento, pelo Ministério Público, de inúmeras ações civis públicas em que se questionava a interpretação da cláusula de proporcionalidade inscrita no inciso IV do art. 29 da Lei Fundamental da República. (...)
Com isso, excepcionalmente, o STF admitiu a transcendência dos motivos determinantes, em exercício intelectual que fora feito pelo TSE, com emissão de uma Resolução que foi julgada constitucional.

Contudo, nos mais recentes julgados sobre a transcendência dos motivos determinantes, o STF tem assim se manifestado:
Ementa: AGRAVO REGIMENTAL. RECLAMAÇÃO. ALEGAÇÃO DE AFRONTA AO QUE DECIDIDO POR ESTA CORTE NAS AÇÕES DIRETAS DE INCONSTITUCIONALIDADE 3.715/TO, 1.779/PE e 849/MT. AUSÊNCIA DE IDENTIDADE MATERIAL. AGRAVO DESPROVIDO. I – A jurisprudência desta Corte é contrária à chamada “transcendência” ou “efeitos irradiantes” dos motivos determinantes das decisões proferidas em sede de controle abstrato de normas. Precedentes. II – O ato reclamado não guarda identidade material com as decisões apontadas como supostamente afrontadas. III - A reclamação não pode ser utilizada como sucedâneo ou substitutivo de recurso próprio. Precedentes. IV – Agravo regimental a que se nega provimento.
(Rcl 11484 AgR, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 05/08/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-157 DIVULG 14-08-2014 PUBLIC 15-08-2014)


* * *

Mutação constitucional nos elementos orgânicos da Constituição? Particularmente, não me sinto confortável, pois me cheira a destempero no sistema de freios e contrapesos. Emanada do Povo, por seus representantes eleitos, a lei pretende ser fria, aplicável ampla e genericamente, ao passo que a interpretação pelo STF no controle difuso se dá caso-a-caso. É a previsão e a tradição constitucional no Brasil. Já bastavam as Súmulas, especialmente as vinculantes, que dão suficiente poder “legislativo” ao Judiciário.

Ora, se em uma composição episódica*, o STF, por 6 votos à favor e 5 contra, afirma a força erga omnes de suas decisões plenárias em controle difuso, então restariam esvaziadas as súmulas. Súmula pra quê? Basta uma decisão em HC ou outro processo qualquer; dispensou-se a reiteração; dispensou-se os 2/3 de membros.

Conviver com a possibilidade declarada de mutação constitucional via interpretação do Supremo soa trágico, e parece beirar uma assunção ilegítima do Poder Constituinte Derivado. Afinal, há limites para a "interpretação técnica" da vontade coletiva da Nação? Creio que o Constituinte desenhou uma estrutura formal a ser respeitada, e não pra ser mudada unilateralmente, interpretativamente, por um Poder.

É inegável que os avanços de uma sociedade demandam a alteração da visão do intérprete constitucional. Não, porém, da organização da estrutura da Federação. Mudança na distribuição de competências do Estado é papel do legislador. Altere-se o pensamento dos Tribunais nas questões objetivas, materiais do direito; não nas formais, pois fere a rigidez constitucional, nega a sua força normativa.

Abriria-se, pois, a possibilidade de o STF alterar os elementos orgânicos da Constituição. É dizer, admitir-se-ia que o STF, eventualmente, redistribua, por exemplo, as competências dos Juízes e Tribunais, ao argumento de que há precedentes para a mutação constitucional.

Meu desconforto não é com a aplicação erga omnes das decisões Plenárias em controle difuso. Meu desconforto é com a maneira com que o STF avoca, inapelavelmente, uma competência.

Eu concordo que um caso decidido em Plenário pelo STF deva ser aplicado a todos os casos semelhantes, principalmente se envolver matéria penal (para garantir um direito, uma liberdade, de forma isonômica), desde que, porém, a Constituição o permita expressamente. Desde que o Legislativo pavimente o caminho. Desde que haja participação da Nação.

Eu não concordo com o desbalanceamento da repartição de Poderes, o exagero no ativismo judicial. É o mesmo caso do abuso no uso de Medidas Provisórias pelo Executivo. Isso faz fervilhar no Congresso propostas afirmativas de Poderes que desgastam o país (o qual segue adiante, enquanto Suas Excelências se aposentam e morrem).

Portanto, eu não concordo com a interpretação do STF de que ele seja mais do que guardião da Constituição. Eu não concordo que o STF admita mutação constitucional na estrutura do Poder e das competências. O STF não deve passar a admitir a desnecessidade de avisar o Congresso sobre a declaração inconstitucional de uma lei em um processo difuso, para que aquela lei seja pelo Congresso retirada de vigência. O STF não deve expandir os efeitos das decisões de casos concretos, a não ser que a Constituição seja alterada para tal.

Se o STF pretende dar proeminência a seu papel de Tribunal Político (isto é, pra influir na estrutura do Poder), que então faça lobby no Congresso para se alterar a Constituição por Emenda, e não por "entendimento", ainda mais sem unanimidade; 6 sujeitos legislar pelo Brasil; não se está muito próximo do conceito de aristocracia?

Que o Legislativo se atente, e se torne mais funcional, mitigando a mutação constitucional exercitada pelo Judiciário. E que o Judiciário seja forte para rejeitar a jurisprudência defensiva. O Judiciário está fissurado em cumprir metas e apresentar números.

E que chova revisões criminais para reestudo da pena aplicada aos condenados por formação de quadrilha nesse País!
Revisão Criminal nº 2009.04.00.030480-6/RS, Relator Des. Federal Tadaaqui Hirose, publicado em 24/02/2011.
EMENTA: PENAL E PROCESSUAL. REVISÃO CRIMINAL. ART. 621, I , DO CPP. DESCONSTITUIÇÃO DE SENTENÇA CONDENATÓRIA. ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL. QUESTÃO CONTROVERTIDA. ALTERAÇÃO. CRIME DE SONEGAÇÃO FISCAL. INSIGNIFICÂNCIA. APLICAÇÃO. PARÂMETROS JURISPRUDENCIAIS ALTERADOS APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO DA CONDENAÇÃO. CONDUTA TORNADA ATÍPICA. EXCEPCIONALIDADE. ABSOLVIÇÃO.
Em regra, não se admite a revisão criminal sob o fundamento de alteração de entendimento jurisprudencial em questão controvertida. Na hipótese, contudo, revela-se incongruente manter a condenação por crime de descaminho, pois a nova jurisprudência consolidada tornou atípica a conduta quando o valor dos tributos iludidos for inferior a R$ 10.000,00 (critério objetivo). Assim, tratando-se a revisão criminal de instituto que visa justamente atacar a coisa julgada, cumpre seja conhecida, e ao final provida, absolvendo-se o requerente. 
"A aplicação da jurisprudência mais favorável, nas mesmas hipóteses da incidência da lex mitor, inclui-se na limitação do ius puniendi pois, ao jurisdicionado, não se pode retirar a confiança de que receberá dos magistrados uma igualdade de tratamento diante da mesma situação fática. Proibir a retroatividade da jurisprudência, como afirmou Hassemer, suporia a paralisação de sua função de recriação da lei, observando-se “situações em que a comunidade jurídica tem um conhecimento maior do conteúdo da jurisprudência penal que da lei penal, confiando em sua aplicação.”

sábado, 24 de maio de 2014

09 - Direito Civil 1 - Dos Bens

Dos Bens

1) Conceito

São valores materiais e imateriais que têm conotação econômica e que podem, portanto, ser objeto de uma relação jurídica. Se esses valores não têm valor econômico, não são objeto deste estudo.


2) Espécies

Assim, os bens podem ser:

a) Corpóreos, ou coisas: que são os valores materiais, ou seja, dotados de existência física (ex.: dinheiro, carro, joias, etc.);

b) Incorpóreos, ou direitos: que são os valores imateriais e que só podem ser compreendidos pela inteligência do homem, porque não possuem estrutura física (ex.: crédito, ponto comercial, etc.).


3) Classificação Legal dos Bens

3.1) Dos Bens Considerados em Si Mesmos

Os bens serão analisados individualmente, tendo em vista uma característica que lhe é peculiar.

a) Bens Imóveis: são as coisas que não podem ser transportadas de um lugar para outro sem a sua destruição. Os bens imóveis podem ser:
  • Imóveis por natureza: compreendem o solo e tudo quanto nele se lhe incorporar. Somente serão assim considerados enquanto estiverem aderentes ao solo ou sub-solo, pois depois de retirados serão considerados bens móveis (ex.: água no solo e sub-solo é imóvel por natureza, mas seu engarrafamento a transforma em bem móvel);
  • Imóveis por acessão física artificial: compreende tudo aquilo que o homem incorpora artificialmente ao solo ao ponto de não poder ser removido sem alteração de sua substância ou de sua destinação social. O CC/1916, art. 43, II, exigia que a incorporação ao solo fosse permanente. Pelo atual CC, essa incorporação pode ser temporária ou permanente, pois o que importa para classificar o bem como imóvel é a impossibilidade de sua remoção;
  • Imóveis por força de lei: a razão da imobilização é a segurança das relações jurídicas, pois o regime de proteção aos bens imóveis é mais rígido que aquele que cuida dos bens móveis. 
  • Inexiste no atual CC a figura dos imóveis por acessão intelectual, que no CC/16 permitia tornar imóveis os móveis utilizados como acessório de bens imóveis, mediante vontade do proprietário: CC/16, art. 43. São bens imóveis: III. Tudo quanto no imóvel o proprietário mantiver intencionalmente empregado em sua exploração industrial, aformoseamento, ou comodidade.
b) Bens móveis - art. 82: são móveis os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social. 

No que tange aos navios e aeronaves, são bens naturalmente móveis, mas para fins de hipoteca e alienação, são considerados bens imóveis (art. 1.473, VI e VII). Ambas as hipotecas se efetuam por escritura pública, com autorização do cônjuge, sob pena de nulidade, devendo ser inscritas no Tribunal Marítimo e no Registro Aeronáutico Brasileiro respectivamente.
  • Móveis por natureza: são aqueles suscetíveis de movimento próprio, como os semoventes (ex.: animais de rebanho), e os suscetíveis de remoção por força alheia sem alteração de sua substância (ex.: carros, gás e água engarrafados, etc.);
  • Móveis por antecipação: são aqueles incorporados temporariamente ao imóveis para depois serem removidos sem alteração de sua destinação econômica e social (ex.: árvores para corte para a indústria de papéis);
  • Móveis por disposição legal: são aqueles previstos no CC, art. 83 (ex.: energia; direitos pessoais de caráter patrimonial e respectivas ações, como direito patrimonial sobre um livro, que cai no domínio público).

c) Bens fungíveis - art. 85: são fungíveis os móveis que podem substituir-se por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade.
  • Infungíveis são aqueles que não o podem. A infungibilidade pode resultar da própria natureza da coisa, que apresenta características físicas que a torne insubstituível (ex.: capacete do Senna quando foi tri-campeão mundial), da vontade das partes que convencionam no sentido da infungibilidade de bem normalmente fungível. Mas a infungibilidade não resulta apenas da própria natureza da coisa e apenas da vontade das partes, resultando também da vontade do dono (ex.: objeto de estima, que na ausência se converte em perdas e danos).
  • "A fungibilidade é características dos bens móveis. Em alguns casos, no entanto, pode alcançar bens imóveis como no caso de lotes do mesmo loteamento, que pertençam a sócios que desmancham a sociedade e dividem entre si os lotes existentes, quando ainda não lavrada a escritura desses lotes. Nesse caso, os lotes, apesar de imóveis, serão considerados fungíveis, porque ainda não estão individualizados, o que só ocorre com o registro no CRI."

d) Bens consumíveis - art. 86: são consumíveis os bens móveis cujo uso importa destruição imediata da própria substância, sendo também considerados tais os destinados à alienação.
  • A consuntibilidade pode ser:
  • De fato: ocorre com os bens que se destroem com o primeiro uso (ex.: cigarro);
  • De direito: bens destinados a alienação (ex.: livro na loja, que pode ser consumido pelo adquirente através da aquisição).
  • Bens inconsumíveis: comportam uso reiterado, sem que haja destruição de sua substância (ex.: livro já comprado pelo adquirente).
  • Os imóveis são sempre inconsumíveis.

e) Bens divisíveis - art. 87: são os que se podem fracionar sem alteração na sua substância, diminuição considerável de valor, ou prejuízo do uso a que se destinam.
  • Indivisíveis são os bens que não se pode fracionar, pois seu fracionamento destrói sua natureza, diminui seu valor ou prejudicar sua destinação. A indivisibilidade pode ser:
  • Física: o fracionamento altera a substância do bem (ex.: boi em pé); 
  • Econômica: o fracionamento implica em perca considerável do valor do bem (ex.: diamante); 
  • Intelectual ou jurídica: a lei veda o fracionamento (ex.: módulo rural);
  • Voluntária: as partes acordam no sentido da indivisibilidade;
  • Finalística: o fracionamento implica na alteração do uso a que se destina a coisa (ex.: peças de xadrez).
A indivisibilidade pode também atingir os bens incorpóreos (ex.: direito à herança - CC, art. 1.791).


f) Bens singulares - art. 89: são os bens que, embora reunidos, se consideram de per si, independentemente dos demais (ex.: carteiras na sala de aula).

g) Bens coletivos: são constituídos de dois ou mais bens singulares que se encontram agregados em um todo (ex.: coleção). A coletividade compreende:
  • Universalidade de fato: conjunto de duas ou mais coisas corpóreas que se acham agregadas em um todo (ex.: rebanho) - art. 90;
  • Universalidade de direito: herança e patrimônio (ativo e passivo) - art. 91.
No caso do par de sapatos, dizem-se naturalmente coletivos. No entanto, há quem sustente serem bens singulares.
No CC/1916, havia previsão de que, no caso das coisas coletivas, em desaparecendo todos os indivíduos menos um, se tinha por extinta a coletividade. Assim, o legado de uma coleção de selos caducava quando o testador alienasse os selos em vida, remanescendo apenas um. O atual código não repetiu esta regra. Portanto, no exemplo dado, permanece  a eficácia do legado.

3.2) Dos Bens Reciprocamente Considerados

Os bens serão analisados uns em face dos outros.

a) Principais - art. 92: são os bens que existem por si, abstrata ou concretamente; 

b) Acessórios - art. 92: são aqueles cuja existência supõe a do principal.
  • Corpóreos: frutos, produtos, benfeitorias, acessões e pertenças. O princípio da gravitação jurídica (de que o acessório segue o principal) continua em vigor no atual CC, porém não abrange as pertenças. Atingirá as hipóteses do art. 94. Os negócios jurídicos que dizem respeito ao bem principal não abrangem as pertenças, salvo se o contrário resultar da lei, da manifestação de vontade, ou das circunstâncias do caso;
  • Frutos: são as produções normais e periódicas cuja percepção deixa intacta a coisa que os produziu. 
  • Quanto a sua origem, podem ser:
  • Naturais: se reproduzem pela força orgânica da coisa (ex.: frutas e crias de animais);
  • Industriais: se reproduzem pelo trabalho do homem (ex.: produção de fábrica); 
  • Civis: são os rendimentos tidos por um bem (ex.: juros, alugueis).
  • Quanto ao estado em que se encontram, podem ser: 
  • Pendentes: ainda se encontram unidos à coisa que o produziu;
  • Percebidos: já colhidos;
  • Estantes: já colhidos e que se encontram armazenados para a venda;
  • Percipiendos: já deveriam ter sido colhidos, mas ainda não o foram;
  • Consumidos: não mais existem, porque foram utilizados.
Referida classificação também atinge os direitos (ex.: em um contrato, o crédito é principal, e a cláusula penal é acessória). 
Diferença entre fruto e fruta: fruto é gênero, do qual a fruta é espécie (fruto natural, ao lado do fruto industrial e do fruto civil).
  • Produtos: são as utilidades que se extraem de uma coisa com destruição da sua substância ainda que de forma paulatina (ex.: o mineral ou o metal quando retirado da mina).
  • Apesar de ainda não separados do principal, os frutos e os produtos podem ser objeto de negócios jurídicos autônomos e independentes, caso em que deixam de ser tidos como bens acessórios - art. 95 (ex.: bezerro não nascido).
Diferença entre fruto e produto: o fruto destacado do principal, não acarreta a destruição do principal, e se reproduz periodicamente (ex.: frutas em relação a uma árvore). O produto extraído do principal acarreta sua destruição, e não se reproduz periodicamente (ex.: ouro em relação ao garimpo); 
  • Benfeitorias: são as obras ou despesas efetuadas numa coisa para conservá-la, melhorá-la ou, simplesmente, embelezá-la - art. 96. Portanto, as benfeitorias podem ser:
  • Necessárias: terão direito à indenização pelo seu valor tanto os possuidores de boa-fé como os de má-fé;
  • Úteis: apenas o possuidor de boa-fé terá direito à indenização pelo seu valor;
  • Voluptuárias: o possuidor de boa-fé terá o direito de levantá-las (jus tollendi) quando isso for possível sem qualquer dano à coisa. Se o seu levantamento não for possível, ele as perde sem qualquer indenização. Se o seu levantamento for possível, mas o proprietário quiser ficar com ela, ele fica, mas deverá indenizar o possuidor de boa-fé.
  • O possuidor de má-fé, não tem direito de indenização pelas úteis e, tampouco, o de levantar as voluptuárias. Ele simplesmente as perde, sem qualquer indenização; 
  • Os acréscimos ou melhoramentos advindos à coisa por força da natureza são acessões - art. 97 (ex.: avulsão, aluvião, formação de ilhas, abandono de álveo).
  • Acessões: acessão é a junção de uma coisa à outra por força externa. Pode ser:
  • Natural (ex.: aluvião, avulsão, formação de ilhas e abandono de álveo);
  • Industrial ou artificial (ex.: a construção de uma obra);
  • Mista (ex.: plantação).
Diferença entre benfeitoria e acessão industrial: as benfeitorias são melhoramentos feitos em obras já existentes (ex.: reforma de uma casa, construção de uma garagem), e as acessões industriais são obras que criam coisas novas (ex.: construção de uma casa num terreno vazio - art. 1.253 e ss.).  
Súmula n 335-STJ: Nos contratos de locação, é válida a cláusula de renúncia à indenização das benfeitorias e ao direito de retenção.
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE MANUTENÇÃO DE POSSE. DIREITO DE RETENÇÃO POR ACESSÃO E BENFEITORIAS. CONTRATO DE COMODATO MODAL. CLÁUSULAS CONTRATUAIS. VALIDADE.
1. A teor do artigo 1.219 do Código Civil, o possuidor de boa-fé tem direito de retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis e, por semelhança, das acessões, sob pena de enriquecimento ilícito, salvo se houver estipulação em contrário.
2. No caso em apreço, há previsão contratual de que a comodatária abre mão do direito de ressarcimento ou retenção pela acessão e benfeitorias, não tendo as instâncias de cognição plena vislumbrado nenhum vício na vontade apto a afastar as cláusulas contratuais insertas na avença.
3. A atribuição de encargo ao comodatário, consistente na construção de casa de alvenaria, a fim de evitar a "favelização" do local, não desnatura o contrato de comodato modal.
4. Recurso especial não provido.
(REsp 1316895/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Rel. p/ Acórdão Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/06/2013, DJe 28/06/2013)
(VOTO VENCIDO) (MIN. NANCY ANDRIGHI) É devida indenização ao comodatário pela construção feita em imóvel objeto do contrato de comodato, na hipótese em que ele, de boa-fé, cumpriu o encargo contratual consistente na construção de casa de alvenaria para sua própria residência e aderiu a cláusula de renúncia à indenização por tal benfeitoria, pois, no caso, o encargo exigido, que em verdade consistiu em acessão ao comodante, mostra-se desproporcional ao contrato típico de comodato, cuja essência é gratuita e benéfica, sendo abusiva a cláusula que impôs a construção e a renúncia à indenização, sobressai a manifesta boa-fé do comodatário, constituindo requisito ao direito à indenização nos moldes dos arts. 1.255 e 1.219 do CC/2002. 
  • Pertenças: embora sejam coisas acessórias, as pertenças conservam a sua identidade, pois elas não se incorporam à coisa a que se juntam (ex.: CD player do carro) - art. 93;
  • A separação das pertenças não acarreta na destruição da coisa principal, que permanece intacta;
  • Relativamente ao princípio de que o acessório acompanha o principal, não se aplica às pertenças, devendo ser aplicado somente nas hipóteses previstas no art. 94: Os negócios jurídicos que dizem respeito ao bem principal não abrangem as pertenças, salvo se o contrário resultar da lei, da manifestação de vontade, ou das circunstâncias do caso. 
CESPE Juiz CE 2013 - 1) Caso uma pessoa adquira um trator para melhor explorar sua propriedade rural, esse bem, de acordo com o Código Civil brasileiro, caracteriza-se como:
E) Pertença

3.3) Dos Bens Públicos

São aqueles pertencentes a uma pessoa jurídica de direito público, qualquer que seja a sua afetação, e os pertencentes a uma pessoa jurídica de direito privado quando afetados à prestação de um serviço público.

3.3.1) Espécies

Os bens públicos podem ser:

a) Bens de uso comum do povo - art. 99, I: são aqueles que pela sua própria natureza ou em razão da lei têm o acesso permitido a todos (ex.: ruas, praças, estradas, rios, mares). O uso desses bens pode ser gratuito ou retribuído, conforme art. 103;

b) Bens de uso especial - art. 99, II: são aqueles usados pela Administração Pública para atingir os seus fins (ex.: carros oficiais, cemitérios públicos, terras dos silvícolas, etc.);

c) Bens dominiais ou dominicais - art. 99, III: são aqueles que não têm destinação pública e, por isso, integram o patrimônio disponível do Poder Público (ex.: os terrenos de marinha; as terras devolutas, salvo aquelas necessárias à proteção dos ecossistemas, pois neste caso elas são bens de uso especial).


3.3.2) Características dos Bens Públicos

a) Inalienabilidade: os bens de  uso comum do povo, pela sua própria natureza, são absolutamente inalienáveis, porque são insuscetíveis de mensuração pecuniária;
  • Os bens de uso comum do povo em razão da lei e os bens de uso especial são relativamente inalienáveis - art. 100; 
  • Os bens dominiais são alienáveis, desde que preenchidos os requisitos do art. 17 da Lei 8.666/93. 
b) Imprescritibilidade: os bens públicos são insuscetíveis de usucapião - art. 102;
c) Impenhorabilidade: a execução contra a Fazenda Pública deve ser feita por meio de precatórios - CF/88, art. 100, processando-se nos moldes do CPC, art. 730;
d) Impossibilidade de oneração: esses bens não podem ser objeto de penhor, hipoteca e etc.


08 - Direito Civil 1 - Das Pessoas - Do Domicílio

6) Domicílio

6.1) Conceito

O conceito de domicílio não se confunde com o conceito de residência. 

Domicílio é a residência com ânimo definitivo, ou seja, o lugar onde a pessoa habita com a intenção de ali permanecer por tempo indeterminado.

Residência é o local onde a pessoa habita com estabilidade relativa.

De acordo com o CC, art. 70, o domicílio da pessoa natural é o lugar onde ela estabelece a sua residência com ânimo definitivo.


6.2) Requisitos

Dois são os requisitos para caracterização do domicílio:

a) Requisito objetivo: residência;

b) Requisito subjetivo: animus manendi, ou seja, a intenção de aí permanecer por tempo indeterminado.


6.3) Pluralidade de Domicílios

O CC de 2012 adotou o sistema da pluralidade de domicílios, contrapondo-se ao Código de Napoleão, que adotava o princípio de unidade de domicílio. É que o art. 71 estabeleceu que se porém a pessoa natural tiver diversas residências, onde, alternadamente, viva, considerar-se-á domicílio seu qualquer delas.

No que tange às relações profissionais, o domicílio tanto pode ser a residência definitiva quanto o local em que a atividade profissional é exercida - art. 72. No CC de 1916, se a pessoa tinha residência em um lugar e exercia a profissão em outro, o domicílio era o da residência. Atualmente, ambos locais são domicílio.

No art. 73, a lei fala em domicílio aparente ou ocasional, que é aquele onde a pessoa for encontrada. Para caracterizar o domicílio ocasional, exige-se dois requisitos:

a) Ausência de ponto central de negócios;

b) Ausência de residência habitual.

  • Se o sujeito não tiver residência habitual, mas tem ponto central de negócios (local de trabalho), então não há que se falar em domicílio aparente, pois seu domicílio será onde exerce sua atividade econômica.

6.4) Mudança de Domicílio

A mudança de domicílio exige intenção manifesta de estabelecê-lo com o animus manendi. Exige-se requisitos de caráter objetivo e subjetivo:

a) Requisito objetivo: transferência efetiva da residência;

b) Requisito subjetivo: vontade efetiva de deixar a residência anterior.

  • No Brasil, a pessoa pode mudar de domicílio sem adquirir outro, por ser admitido o domicílio aparente (ex.: andarilho - não tem residência fixa nem ponto central de negócios. O domicílio será o local onde for encontrado).

6.5) Domicílio da Pessoa Jurídica

Quanto à PJ de direito privado, o seu domicílio é tanto o lugar onde funciona a diretoria e administração, como o lugar eleito no ato constitutivo.
SÚMULA Nº 363 - A PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO PODE SER DEMANDADA NO DOMICÍLIO DA AGÊNCIA, OU ESTABELECIMENTO, EM QUE SE PRATICOU O ATO.
Relativamente às PJ de direito público, o domicílio da União é o Distrito Federal; o dos Estados e Territórios, as respectivas capitais; o do Município, o lugar onde funcione a administração municipal;


6.6) Classificação do Domicílio

6.6.1) Quanto à Origem

a) Voluntário: é aquele escolhido livremente pela pessoa;

b) Necessário ou coativo: é aquele imposto pela lei, e subdivide-se em:
  • Original: adquirido ao nascer. O domicílio do recém-nascido é o domicílio dos pais;
  • Legal: fixado pela lei, conforme as várias hipóteses previstas no art. 76, Parágrafo único. O domicílio do incapaz é o do seu representante ou assistente; o do servidor público, o lugar em que exercer permanentemente suas funções; o do militar, onde servir, e, sendo da Marinha ou da Aeronáutica, a sede do comando a que se encontrar imediatamente subordinado; o do marítimo, onde o navio estiver matriculado; e o do preso, o lugar em que cumprir a sentença.
O domicílio do servidor público não é apenas para fins profissionais, mas também para fins pessoais (a lei o está estabelecendo). Por exemplo, pode ser citado para uma causa de família nesse endereço.


6.6.2) Quanto à Natureza

a) Domicílio geral: fixado para todos os atos e negócios jurídicos (ex.: domicílios voluntário e necessário);

b) Domicílio especial, ou contratual, ou de foro de eleição: fixado para alguns atos ou negócios jurídicos de acordo com a vontade das partes. Está disciplinado no art. 78 e apresenta as seguintes características:
  • Deve ser fixado por escrito;
  • É fictício, pois não corresponde com a residência dos contratantes;
  • É temporário, pois está condicionado ao inadimplemento da obrigação contraída;
  • É limitado, pois diz respeito a certos direitos e obrigações expressamente fixados no ato ou negócio jurídico.
O domicílio contratual somente pode versar sobre a comarca. É nula a eleição contratual do Juízo competente para a questão, pois esta competência é absoluta. O mesmo se dá com relação a ações reais imobiliárias, cuja competência é determinada pelo local da coisa, sendo absoluta.


07 - TGP - Competência

Competência

1) Conceito

É a quantidade de jurisdição cujo exercício é atribuído a cada órgão ou grupo de órgãos (Liebman).


2) Critérios para Fixação de Competência

Os critérios para fixação de competência são, em síntese, a matéria discutida, a hierarquia dos órgãos jurisdicionais, a qualidade das partes, as diferentes funções da atividade jurisdicional no processo, o lugar e o valor da causa.

2.1) Competência Absoluta e Relativa

Os critérios de definição de competência podem ser divididos em dois grupos:

a) Critérios de Competência Absoluta: são fixadas em razão do interesse público e por isso não podem ser alterados pela vontade das partes. O desrespeito a eles pode ser reconhecido de ofício pelo Juiz e alegado pelas partes a qualquer momento até dois anos após o trânsito em julgado, por meio de ação rescisória. Até o trânsito em julgado, as partes poderão alegá-lo por qualquer forma.

Em regra, são critérios de competência absoluta os seguintes: matéria, hierarquia, pessoa e função. Excepcionalmente, o cumprimento de sentença deve ser feito no juízo onde tramitou originariamente o processo (critério funcional), mas em alguns casos, a parte pode pedir que tramite em outro foro em prol da celeridade - CPC, art. 475-P, Parágrafo único (ex.: ação sentenciada em um Estado pode ter o cumprimento de sentença tramitando em outro Estado onde se situam os bens).


b) Critérios de Competência Relativa: são fixados em razão de interesse das partes, e por isso podem ser por elas alterados. Não podem ser reconhecidos de ofício pelo Juiz, e devem ser alegados no prazo legal, pela forma adequada (exceção de incompetência) sob pena de preclusão.
  • Argui-se, por meio de exceção, a incompetência relativa - art. 112, suspendendo-se o processo - art. 265, III. Essa suspensão paralisa temporariamente a contagem do prazo da contestação, prazo este cujo remanescente volta a fluir (não se inicia novamente a contagem do prazo da contestação, continua de onde parou) com a intimação do Excipiente do recebimento dos autos pelo Juiz declarado competente (REsp nº 973.465). Se da decisão interlocutória que julga procedente a exceção forem opostos agravo de instrumento, ainda assim a fluência do prazo é retomada, posto que este recurso não tem efeito suspensivo (REsp nº 848.954);
  • Se a exceção for rejeitada, retoma-se a contagem do restante do prazo da contestação da publicação ou intimação da decisão que rejeitou o incidente;
  • Há hipótese em que o Juiz pode reconhecer de ofício o descumprimento de uma regra de competência relativa: quando reconhece a nulidade de uma cláusula de foro de eleição em contrato de adesão - art. 112, Parágrafo único.
Os critérios do território e do valor da causa, em regra, integram este grupo. Dentre as exceções, podemos citar que a competência do Juizado Especial Federal é fixada pelo valor da causa, mas é absoluta.


2.2) Identificação da Competência

Em linhas gerais, para a identificação do órgão jurisdicional competente, deve-se seguir os seguintes passos:

a) Verificar se a ação pode ou não ser proposta perante a Justiça brasileira (competência internacional tratada no CPC, art. 88 e 89);
  • Em caso positivo, verificar se é hipótese de competência originária do STF ou do STJ - CF/88, arts. 102, I e 105, I;
  • Em caso negativo, passa-se ao seguinte;
b) Analisar se é caso de competência das Justiças Especiais (Eleitoral, do Trabalho ou Militar - arts. 114, 121 e 124);

c) Em caso caso negativo, verificar se a competência é da Justiça Comum Federal - art. 109, pois se isso não ocorrer, será da Justiça Comum Estadual (residual) - art. 110;

d) Definida qual a Justiça competente, e sendo de primeiro grau o órgão jurisdicional responsável, deve ser analisado qual o foro competente, o que exige consulta ao CPC ou a uma Lei Federal Especial;

e) Por fim, deve ser visto qual o Juízo competente, o que se faz pela consulta às normas de organização judiciária.


2.3) Competência "Internacional"

São as normas que definem as hipóteses em que a jurisdição nacional atuará, bem como se esta atuação se dará de forma exclusiva ou concorrente com a jurisdição de outros países. Isso é diferente das regras que definem quais as normas de direito material que serão aplicadas na solução da lide (ex.: LINDB, art. 10).

a) Competência Internacional Concorrente - CPC, art. 88: são causas em que o Brasil se considera competente, mas aceita que outro Estado estrangeiro também as julgue. Hipóteses:
  • Réu domiciliado no Brasil (não importa sua nacionalidade);
  • Obrigação a ser cumprida no Brasil;
  • Causa que verse sobre fato ocorrido ou praticado no Brasil.
Se a questão foi submetida no Brasil e em outro país do exterior, não há que se falar em litispendência internacional - CPC, art. 90. No entanto, o Brasil poderá se obrigar a reconhecer a litispendência entre ações ajuizadas no Brasil e no exterior por meio de tratados internacionais.

A sentença estrangeira só produzirá efeitos no Brasil depois de homologada pelo STJ - CF/88, art. 105, I, i.


b) Competência Internacional Exclusiva - CPC, art. 89: são ações para as quais somente a Justiça brasileira tem competência. Por razões de soberania, o Brasil não reconhece decisão estrangeira a respeito, as quais não serão homologadas:
  • Ações relativas a imóveis situados no Brasil;
  • Inventário e partilha de bens situados no Brasil (bens móveis ou imóveis). Esta regra rompe com o princípio de Direito Internacional da unidade do inventário, porque se houver bens em outro país onde haja uma regra semelhante, serão necessários dois inventários.

2.4) Competência Interna

A competência das Justiças Especializadas, bem como das Justiças Comuns Federal e Estadual, é fixada pela CF/88. A competência das Varas Especializadas e dos foros é fixada por normas de organização judiciária. O CPC trata praticamente só da competência territorial ou de foro. 

a) Justiça Federal - CF/88, art. 109: a competência se baseia em vários critérios:
  • O principal é o da Pessoa. Esta competência existirá sempre que for parte a União, suas Autarquias, Fundações Públicas ou Empresas Públicas Federais (o rol não inclui as SEM). Também, quando for parte o Estado Estrangeiro ou Organismo Internacional;
  • Da Matéria, como ações baseadas em Tratado ou Contrato Internacionais ou sobre Direitos Indígenas.
As Sociedades de Economia Mista Federais não atraem a Competência da Justiça Federal. 

O Juízo universal da falência obriga os Entes Federais a habilitarem seus créditos na Justiça Estadual.
  • Competência delegada: são casos em que a competência originária é da Justiça Federal, mas onde não houver Vara Federal (Subseção Judiciária) ela é supletivamente exercida em 1º Grau pelo Juiz Estadual, e os eventuais recursos vão para o TRF;
  • Habitualmente, isto ocorre nas ações previdenciárias contra o INSS e nas execuções fiscais Federais (obs.: as ações que tratem de incapacidade por acidente do trabalho serão da Justiça do Trabalho - benefício acidentário trabalhista - ou da Justiça Estadual - benefício meramente previdenciário, como acidente fora do trabalho).
  • Competência de foro na Justiça Federal: 
  • Se a União ou o ente Federal for autor, é competente a Seção Judiciária do domicílio do réu; 
  • Se a União ou o ente Federal for réu, a competência é: 
  • Da Seção Judiciária do domicílio do autor, ou 
  • Do local do fato ou ato que fundamenta a ação, ou ainda 
  • Da Seção onde está situado o imóvel, ou por fim 
  • Da Seção Judiciária do DF. 
  • O STF tem entendido que esta disposição do art. 109, §2º, é aplicável também às Autarquias.

b) Regras do CPC: a regra geral é prevista no art. 94 e detalhada nos arts. 96 a 98, ou seja:
  • Para as ações pessoais e ações reais sobre bens móveis, é competente o foro do domicílio do réu (as regras sobre domicílio estão no CC, arts. 70 a 78);
  • Se o réu for ausente, o foro será o do seu último domicílio; 
  • Se o réu for incapaz, o foro será o do domicílio de seu representante; 
  • Se forem vários os réus, é competente o foro do domicílio de qualquer um deles; no entanto, se a ação não versar sobre direito único, e entre os pedidos não houver conexão que justifique a sua reunião, o réu demandado fora do seu domicílio pode se opor por meio de exceção de incompetência, pleiteando a separação das ações;
  • Se for incerto o domicílio do réu, é competente o foro do local onde ele for encontrado ou o foro do domicílio do autor; 
  • Se o réu for domiciliado fora do Brasil, é competente o foro do domicílio do autor; mas se o autor também tiver domicílio no Exterior, qualquer foro no Brasil será competente;
  • As ações contra o espólio, bem como o inventário e a partilha, devem ser ajuizadas no foro do domicílio do falecido.

c) Além dessa regra geral do domicílio do réu, o CPC também prevê regras especiais. As principais regras especiais estão nos arts. 95, 99 e 100.
  • No art. 95 observamos duas regras que tratam das ações reais envolvendo imóveis. O artigo pode ser dividido em duas partes:
  • Na primeira, temos uma regra de competência relativa, permitindo ao autor que ajuíze sua ação real imobiliária no foro de eleição, no foro da situação do imóvel, ou no foro do domicílio;
  • Na segunda, o dispositivo fixa competência absoluta do foro onde está o imóvel para as ações reais que tratem dos seguintes direitos: propriedade, vizinhança, servidão, posse, divisão, demarcação e nunciação de obra nova.
  • O art. 100 traz várias hipóteses e regras específicas, dentre as quais:
  • A competência é fixada com base na residência da mulher para as ações de separação, divórcio e anulação de casamento. Para o STF, é constitucional esta regra, pois equilibra uma desigualdade que, de fato, ainda existe no Brasil. O STJ tem entendido que o dispositivo não se aplica à união estável;
  • É competente o foro do domicílio ou da residencia do alimentando nas ações em que se pedem alimentos. A Súmula nº 1 - STJ prevê:
O FORO DO DOMICILIO OU DA RESIDENCIA DO ALIMENTANDO É O COMPETENTE PARA A AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE, QUANDO CUMULADA COM A DE ALIMENTOS. 
Apesar de serem regras especiais, as normas vistas e as outras presentes nos artigos mencionados tratam de competência territorial que, em regra, é relativa. Por isso, nada impede que o autor ajuíze a ação seguindo a regra geral do domicílio do réu.


d) Modificação de Competência - CPC, art. 102

Hipóteses:
  • Foro de eleição (derrogação): é a cláusula contratual que escolhe o foro onde tramitará eventual ação, vinculando os contratantes, seus herdeiros e sucessores. Somente é possível em ações envolvendo direitos das obrigações, e não pode alterar regras de competência absoluta;
  • Nos contratos de adesão, existem restrições ao foro de eleição, que poderá ser até anulado de ofício pelo Juiz (CPC, art. 112, Parágrafo único). Em regra, deve ser avaliado se a regra de eleição prejudicou ou não o direito de acesso à Justiça do aderente;
  • Não prevalece a eleição de foro perante a conexão ou a continência que determine a reunião de processos;
  • Pode haver renúncia ao foro de eleição, inclusive tácita (ex.: autor ajuíza ação no domicílio do réu ao invés de observar a eleição de foro feita para outro local);
  • Prorrogação: é o fenômeno pelo qual o juízo relativamente incompetente passa a ser competente para uma ação em razão do não oferecimento da competente exceção de competência, nem anulada de ofício a cláusula de eleição de foro - art. 114;
  • A doutrina também considera prorrogação de competência quando, em razão da conexão ou continência, a competência do juízo prevento é estendida para as demais ações conexas ou continentes;
  • Conexão: é o vínculo entre ações que tenham a mesma causa de pedir ou o mesmo pedido;
  • Continência: é uma conexão especial que ocorre ao se verificar causas de pedir idênticas e mesmas partes, mas o pedido de uma das ações é mais abrangente e contém o pedido da outra;
  • Havendo conexão ou continência entre ações, estas deverão ser reunidas para um julgamento conjunto sempre que houver necessidade de se evitar decisões conflitantes, e também para se obter economia processual (instrução conjunta);
CESPE Juiz CE 2013 - 16) Acerca da modificação de competência pela conexão, assinale a opção correta: E) Tal modificação deve ser alegada pelas partes, podendo o juiz conhecê-la de ofício. (REsp nº 1.156.306)
Existe uma divergência ou discussão se a reunião dos processos, nos casos de conexão ou continência, é ou não obrigatória. O art. 105 prevê que o Juiz, de ofício ou a requerimento das partes, poderá reunir processos. A interpretação que tem prevalecido é a de que sempre que atender ao binômio economia-harmonia, a reunião deve ser feita. Se não gerar economia processual ou se já foi proferida sentença em um dos processos, não deverá ser feita a reunião.
Súmula nº 235-STJ: A conexão não determina a reunião dos processos, se um deles já foi julgado.

3) Perpetuação da Competência - art. 87

A competência é analisada no momento da propositura da ação. As alterações de fato ou de direito posteriores, em regra, são irrelevantes, salvo se a competência tiver sido alterada com base na matéria, na hierarquia (ou outro critério absoluto como pessoa e função), ou ainda se o órgão jurisdicional tiver sido extinto (ex.: a intervenção da União em processo que tramita na Justiça Estadual determina a modificação da competência para a Justiça Federal).


4) Controle da Competência

Além do controle de ofício pelo Juiz e da alegação das partes por meio de uma preliminar de contestação ou por exceção de incompetência, o conflito de competência também é um mecanismo de controle. Ele está previsto nos art. 115 a 120 e ocorre basicamente em três situações:

4.1) Conflito Positivo:

Se dá quando dois ou mais juízos consideram-se competentes para a mesma ação.


4.2) Conflito Negativo:

Verificado quando dois ou mais juízos consideram-se incompetentes para a mesma ação.


4.3) Reunião ou Separação de Ações:

Ocorre quando juízos divergem sobre a reunião ou separação de ações.


  • O conflito pode ser suscitado pelo Juiz, encaminhando-se ofício ao seu Tribunal, ou pelas partes ou MP, por meio de petição. A peça é encaminhada ao Presidente do Tribunal com os documentos que comprovam as alegações. Não pode suscitar o conflito a parte que no processo ofereceu exceção de incompetência - art. 117. O Juiz só pode suscitar conflito de incompetência para controlar a competência absoluta; caso contrário, estaria controlando de ofício uma competência relativa.




07 - Direito Civil 1 - Das Pessoas - Pessoa Jurídica


5) Das Pessoas Jurídicas - CC, art. 40 e seguintes

Podem ser definidas como sendo as instituições formadas para a realização de um fim, e reconhecidas pela ordem jurídica como sujeitos de direito

5.1) Classificações

5.1.1) Quanto a Nacionalidade

a) Brasileiras: são aquelas constituídas de acordo com a lei brasileira, tendo sede e administração no Brasil, pouco importando a nacionalidade dos seus integrantes;

b) Estrangeira: são aquelas constituídas de acordo com a lei de seu país de origem, e que para funcionarem no Brasil dependem de autorização especial do governo brasileiro e da nomeação de um representante para responder pelos atos aqui praticados.


5.1.2) Quanto à sua Função e Capacidade

a) Pessoa Jurídica de Direito Público, Interno ou Externo

b) Pessoa Jurídica de Direito Privado


5.1.3) Quanto à Estrutura

a) Corporação: consiste na união de duas ou mais pessoas para, através da instituição de uma pessoa jurídica, atingir um fim comum. É o caso das sociedades (visam lucro) e associações (não visam lucro, apesar que podem auferi-lo);

b) Fundação: consiste num patrimônio que se personaliza, ou seja, transforma-se em uma pessoa jurídica (não possui sócios, tampouco associados, e não visam lucro, apesar que podem auferi-lo).


5.2) Início da Personalidade Jurídica - art. 45

Diversamente da personalidade civil da pessoa física, em que o registro de nascimento no órgão competente é ato meramente declaratório, no que tange às pessoas jurídicas de direito privado esse registro no órgão competente tem natureza constitutiva. 

Órgão competente será a Junta Comercial com relação às sociedades ou então o Cartório de Registro das Pessoas Jurídicas para as demais. 

Importa anotar que inúmeras entidades dependem, para seu funcionamento, de prévia autorização do governo, ou seja, sem essa autorização, o registro no órgão competente não será possível:

a) Instituições financeiras;

b) Administradores de consórcio de bens duráveis;

c) Seguradoras;

d) Operadoras de planos privados de assistência à saúde;

e) Sociedades e fundações estrangeiras - LINDB, art. 11, §1º


5.3) Consequências da Aquisição da Personalidade Jurídica

a) O poder da pessoa jurídica de praticar todos os atos jurídicos, exceto aqueles que lhe são vedados de forma expressa ou tácita;

b) O poder da pessoa jurídica de figurar como parte nas relações jurídicas materiais (celebrar contratos, ter conta bancária, titularizar bens, etc.) e processuais (outorgar procuração, receber citação, propor e contestar ação, etc.)

c) Autonomia patrimonial, pois o patrimônio dela não se confunde com o patrimônio dos seus integrantes.


5.4) Da Representação e Administração das PJ

As PJ serão representadas ativa e passivamente, judicial e extrajudicialmente, por quem os respectivos estatutos designarem, ou, se não o designarem, pelos seus diretores - CC, art. 46, III e CPC, art. 12, VI.

Nada impede que o estatuto designe mais de um administrador, discriminando ou não os poderes de cada um - art. 47.

O estatuto pode prever, ainda, que a PJ tenha administração coletiva, ou seja, por meio de um colegiado, sendo as decisões tomadas pela maioria de voto dos presentes - art. 48 e Parágrafo único.

Se a administração da PJ vier a faltar, o Juiz, a pedido de qualquer interessado, deverá nomear-lhe um administrador provisório - art. 49.

As sociedades sem personalidade jurídica (em comum - art. 986, e em conta de participação - art. 981), serão representadas em juízo pela pessoa a quem couber a administração de seus bens - CPC, art. 12, VII.

Finalmente, a PJ estrangeira será representada em juízo pelo gerente, representante ou administrador de sua filial, agência ou sucursal instalada no Brasil - CPC, art. 12, VIII.


5.5) Das Associações - art. 53 a 61

Associação é uma corporação sem fins lucrativos - art. 53. É união de pessoas que se organizam para fins não econômicos.

Sua finalidade pode ser, por exemplo, cultural, beneficente, religiosa, altruísta, etc. Conforme disposto na CF/88,  art. 5º, XVII a XXI, é assegurada a liberdade de associação (também compreende as sociedades). A liberdade de associação consiste: 

a) No direito de criar associação, independentemente de autorização; 

b) No direito de não ser compelido a aderir a determinada associação; 

c) No direito de desligar-se da associação a qualquer tempo.


5.5.1) Distinção entre Associação e Fundação

a) Quanto à estrutura: a associação é uma corporação, enquanto que a fundação é um patrimônio que se personaliza;

b) Quanto à finalidade: a associação pode ter sua finalidade alterada por seus filiados, enquanto que a da fundação não;

c) Quanto à fiscalização pelo MP: a associação não é fiscalizada pelo MP, enquanto que a fundação é sim.

  • Importa anotar, no entanto, que tanto a associação quanto a fundação não têm finalidade lucrativa, distinguindo-se da sociedade. Isso não significa, no entanto, que as associações e as fundações não possam auferir lucros, mas estes serão os meios para que elas venham a atingir os seus fins.

5.5.2) Distinção entre Associação e Sociedade

a) Quanto à finalidade: a associação não tem finalidade lucrativa, enquanto que a sociedade sim;

b) Quanto aos direitos recíprocos entre os membros: na associação, não há direitos e obrigações recíprocos entre os associados (art. 53, Parágrafo único), enquanto que nas sociedades, há direitos e obrigações recíprocos entre os sócios;

c) Quanto a destinação dos bens na dissolução: dissolvida uma associação, o seu patrimônio é revertido para uma outra entidade de fins não econômicos, enquanto que na dissolução da sociedade, o patrimônio é rateado entre os seus sócios.


5.5.3) Constituição da Associação

O início da personalidade jurídica se dá com o registro dos atos constitutivos (estatuto) no cartório de registro civil das PJ. Referido estatuto, sob pena de nulidade, deverá conter os requisitos previstos no art. 54. 

Com o advento da Lei nº 11.127/05, não há mais a necessidade de o estatuto conter o modo de constituição e funcionamento dos órgãos administrativos, mas apenas dos deliberativos.


5.5.4) Direitos e Deveres dos Associados

Os direitos e deveres dos associados deverão estar definidos no estatuto, que pode definir vantagens especiais a determinadas categorias de associados - art. 55.

Nenhum associado pode ser impedido de exercer direito ou função que lhe tenha sido legitimamente conferido, salvo nos casos previstos na lei ou no estatuto - art. 58.

Nos termos do art. 56, a qualidade de associado é intransmissível, salvo se o estatuto dispuser em sentido contrário.

Quanto à exclusão do associado, ou a sua expulsão, somente será possível em havendo justa causa, assim reconhecida em procedimento que lhe assegure direito de defesa e de recurso - art. 57.


5.5.5) Da Assembléia Geral

Trata-se do órgão de deliberação máxima da associação. A sua convocação deve ser feita na forma do art. 60, sendo certo que há certas matérias que a lei reserva privativamente à assembléia geral, de modo que o estatuto não pode atribuí-las a nenhum outro órgão - art. 59.


5.5.6) Da Dissolução

A dissolução pode dar-se de duas formas:

a) Espontânea: deliberada pelos associados, reunidos em assembléia geral especialmente convocada para este fim, observando-se o quorum previsto no estatuto;

b) Judicial: é aquela decretada por sentença, e só será possível quando a associação tiver fins ilícitos ou caráter paramilitar. Se não for essas duas situações, não é possível dissolução judicial.

Dissolvida a associação, o seu patrimônio liquido será destinado, em primeiro lugar, a alguma entidade de fins não lucrativos que esteja designada no estatuto. Se o estatuto for omisso, os associados poderão deliberar em favor de alguma associação municipal, estadual ou federal, que tenha fim idêntico ou semelhante - art. 61, caput.

Em não existindo uma associação com finalidade idêntica ou semelhante, o patrimônio será devolvido à fazenda do Estado, do DF ou da União - art. 61, §2º.


5.6) Das Fundações

Não se confundem com associação ou com sociedade, sendo estas corporações (união de pessoas), e Fundação é um patrimônio que, uma vez registrados os atos constitutivos, adquire personalidade jurídica. Tal como as associações, não tem finalidade lucrativa, muito embora possa auferi-lo (não está proibida).

Portanto, dois são seus elementos: o patrimônio e o fim específico.

De acordo com o CC, art. 62, Parágrafo único, a fundação somente pode ter fim religioso, moral, cultural ou de assistência. Prevalece o entendimento de que referido rol é exemplificativo. Tanto é assim que o Enunciado nº 8 do CJF determina que a constituição de fundação para fins científicos, educacionais ou de promoção do meio-ambiente está compreendido dentre seus fins possíveis:
Enunciado nº 8 - CJF – Art. 62, parágrafo único: a constituição de fundação para fins científicos, educacionais ou de promoção do meio ambiente está compreendida no CC, art. 62, parágrafo único. 
Não se admite criação de fundações com finalidade "caprichosa", como para a promoção de eventos recreativos fechados a seus membros.


5.6.1) Formas de Instituição das Fundações

Para se criar uma fundação, seu instituidor fará por escritura pública ou testamento. Portanto, a constituição da fundação é ato solene, pois depende de escritura pública ou testamento que deverão conter:

a) A dotação de bens alodiais (livres e desembaraçados), sem que haja prejuízo ao credor ou aos herdeiros;

b) O fim a que ela se destina.

É impossível criar uma fundação sem patrimônio (ou com intenção de posterior formação desse patrimônio).

Quanto à maneira de administra-la, pode ou não ser especificada no ato constitutivo, a critério do fundador.


5.6.2) Espécies

Após a lavratura da escritura pública ou após a morte do fundador, quando esta for instituída por meio de testamento, o próximo passo é a elaboração do estatuto,  e sob este aspecto a fundação pode ser:

a) Fundação direta: quando o estatuto é elaborado pelo próprio fundador;

b) Fundação indireta ou fiduciária: quando o estatuto é elaborado por terceira pessoa a quem o fundador atribuiu este encargo.

Elaborado o estatuto, este segue para aprovação do Ministério Público e, após aprovado, é encaminhado ao cartório de registro civil das pessoas jurídicas para registro, constituindo-se, a partir de então, a personalidade jurídica da fundação.
  • Revogação do ato institucional: a fundação instituída por testamento pode ser revogada a qualquer tempo pelo testador. Todavia, após a morte deste, o ato torna-se irrevogável. Já a fundação instituída por meio de escritura pública é irrevogável, conforme se verifica pelo CC, art. 64;

5.6.3) Da aprovação do estatuto

A aprovação do estatuto é feita pelo Ministério Público, que antes de aprova-lo, deve verificar dois aspectos: 

a) Se foram observadas as bases da fundação;

b) Se os bens são suficientes ao fim a que ela se destina. Caso sejam insuficientes, serão incorporados a outra fundação que tenha finalidade idêntica ou semelhante, caso o fundador não lhe tenha dado destinação diversa.

O prazo para a deliberação do MP é de 15 dias, podendo se estender em razão da complexidade do documento. Se aprovado, não haverá intervenção judicial, seguindo o estatuto para registro no cartório das pessoas jurídicas.

Pode ocorrer, no entanto, que o MP indique modificações a serem feitas no estatuto, ou então, de pronto, não o aprove. Nesse caso, o interessado pode requerer ao Judiciário que supra a aprovação do MP, certo que o Juiz poderá ou supri-las, ou aprovar o estatuto, ou desaprova-lo confirmando a ato do MP.

Cabe ao MP a fiscalização da fundação, conforme se verifica pelo art. 66 e seus §§.


5.6.4) Da elaboração do estatuto pelo MP

Em duas situações, o MP deverá elaborar o estatuto da fundação:

a) Quando o fundador não o elaborar, nem indicar quem o faça;

b) Quando a pessoa nomeada para elabora-lo não o fizer no prazo estipulado pelo fundador, ou não havendo prazo, em 180 dias.

Quando o estatuto for elaborado pelo MP, a sua aprovação competirá ao Juiz.


5.6.5) Da alteração do estatuto

A alteração do estatuto da fundação é possível na forma prevista na lei, conforme se verifica pelos arts. 67 e 68. É importante anotar, no entanto, que o fim da fundação é inalterável.


5.6.6) Da Extinção da fundação

Depende de sentença judicial, podendo ser requerida por qualquer interessado ou pelo MP quando a sua finalidade tornar-se ilícita, impossível ou se vencido o prazo de sua duração.

Decretado por sentença o fim da fundação, seu patrimônio será incorporado, em primeiro lugar, à entidade designada na escritura pública ou no testamento. Se omissos, à entidade designada no estatuto. Se também omisso, o Juiz determinará a incorporação do patrimônio a outra entidade com finalidade idêntica ou semelhante. Em não havendo, aplica-se por analogia a regra prevista no art. 61, §2º, ou seja, o patrimônio será revertido à Fazenda Pública do Estado, do DF ou da União.


5.7) Sociedades - art. 981 a 1.141

A matéria é objeto de estudo de Direito Comercial (Empresarial).