Extorsão - CP, art. 158
Trata-se da conduta de constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, com a finalidade de obter indevida vantagem econômica, a adotar um comportamento que é imprescindível para a obtenção dessa vantagem.
1.1) Sujeito Ativo
Qualquer pessoa.
1.2) Sujeito Passivo
São vítimas da extorsão aquele que sofre o dano patrimonial, aquele que sofre a violência ou grave ameaça e também aquele que adota o comportamento exigido pelo agente (ex.: agente sequestra filho do gerente do banco exigindo que este desvie dinheiro do banco para determinada conta, o que ele faz. São vítimas da extorsão neste caso o filho do gerente, o gerente e o banco).
1.3) Tipo Objetivo
A conduta é constranger, que significa forçar, coagir a algo. A extorsão é um constrangimento ilegal com objetivo econômico.
Os meios de execução são a violência própria ou a grave ameaça. Não se prevê, como acontece no roubo próprio, o emprego da violência imprópria, ou seja, um outro meio que reduz a vítima à incapacidade de resistência. Se isto acontecer, não haverá extorsão, mas outro crime (ex.: o agente hipnotiza a vítima e faz ela dizer a senha do cofre ou da conta bancária, sacando dinheiro. Ele responderá por furto).
A violência ou grave ameaça podem ser empregadas contra aquele que o agente pretende forçar a adotar o comportamento ou contra terceiro, como no exemplo do gerente do banco.
O constrangimento tem o objetivo de levar a vítima a fazer algo, deixar de fazer algo, ou tolerar que se faça algo, no intuito de proporcionar ao agente a indevida vantagem econômica (ex.: depositar dinheiro em uma conta - fazer algo; não delatar ou não processar o extorsionário - deixar de fazer; permitir que o devedor rasgue o cheque dado por ele - tolerar que se faça).
A vantagem deve ser indevida e econômica. Se a vantagem for devida, o agente responderá por exercício arbitrário das próprias razões - art. 345; e eventual crime relativo à violência (ex.: agredir o devedor para que este pague a dívida).
Se a vantagem não for econômica, o crime será outro (ex.: se o agente constrange a vítima objetivando vantagem sexual, o crime é estupro; se ele pretende que ela não delate o homicídio praticado por ele, o crime é constrangimento ilegal ou coação no curso do processo).
Ao contrário do que ocorre no furto e no roubo, o objeto material da extorsão não é apenas a coisa móvel, mas também pode ser coisa imóvel. Assim, pratica extorsão quem constrange a vítima, por exemplo, a assinar uma escritura de doação de um imóvel.
1.4) Elemento Subjetivo
É o dolo específico de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica.
1.5) Consumação
A extorsão é crime formal, que se consuma independentemente da obtenção, pelo agente, da vantagem pretendida (Súmula nº 96-STJ).
Discute-se, apesar da súmula, o exato momento consumativo da extorsão. O iter criminis tem três fases:
a) Emprego de violência ou grave ameaça pelo agente;
b) Comportamento da vítima;
c) Obtenção da vantagem.
É indiscutível que a última fase constitui mero exaurimento, pois, como o crime é formal, ele se consuma independentemente da obtenção da vantagem. O que se discute é se o crime se consuma logo após a primeira fase ou somente após a segunda.
- Uma corrente sustenta que para a consumação basta a primeira fase, ou seja, basta que o agente adote a conduta constrangedora, e o crime estará consumado, ainda que a vítima não adote o comportamento pretendido (ex.: o agente telefona para a vítima e lhe diz que sequestrou seu filho, exigindo um depósito de dinheiro. A vítima não acredita e não deposita). Para essa corrente, o agente responde por extorsão consumada. Só caberia a tentativa se o agente fosse impedido de constranger a vítima por circunstâncias alheias à sua vontade (ex.: ele manda uma carta ameaçadora, mas esta não chega);
- A segunda corrente, majoritária, entende que o crime só se consuma quando o corre a segunda fase, ou seja, quando a vítima adota o comportamento exigido pelo agente, ainda que ele não obtenha a vantagem econômica (ex.: o agente telefona para a vítima dizendo que sequestrou seu filho e ela faz o depósito. No momento em que ele vai sacar o dinheiro, ele é preso. Ele responde por extorsão consumada, embora não tenha obtido a vantagem econômica (o que seria mero exaurimento). No entanto, para esta corrente, se a vítima não adotar o comportamento, ele responderá por tentativa de extorsão.
Questão da prisão em flagrante: suponha-se que o agente exija da vítima um depósito e que esta o faz. Após tempo relevante, ele comparece à agência para sacar o dinheiro e é preso em flagrante. Nessa hipótese, o flagrante será ilegal, pois o crime se consumou muito antes, não estando presente nenhuma das situações de flagrância do CPP, art. 302.
1.6) Causas de Aumento de Pena - §1º
a) Crime cometido por duas ou mais pessoas: diferentemente do roubo e do furto, aqui a lei não fala em concurso de duas ou mais pessoas, mas em "crime cometido". Essa expressão indica que a majorante só se aplica na hipótese de coautoria, em que os diversos autores "cometem" o crime, ou seja, praticam atos de execução. A mera participação de um agente e autoria de outro não configura a majorante;
b) Crime cometido com emprego de arma: acerca da arma, aplica-se o que já foi estudado no roubo majorado pelo emprego de arma.
1.7) Extorsão Qualificada - §2º
O crime é qualificado pelo resultado lesão grave ou morte, desde que estes decorram da violência. Aplica-se aquilo já estudado no roubo qualificado do art. 157, §3º.
A extorsão qualificada pela morte da vítima, que não recebe o nome de latrocínio, é crime hediondo - Lei nº 8.072/90, art. 1º, III.
1.8) Extorsão Mediante Restrição da Liberdade da Vítima - §3º, acrescentado pela Lei nº 11.923/09
Trata-se da conduta conhecida como "sequestro-relâmpago". É extorsão na qual a vítima, tendo sua liberdade restringida, permanece em poder do agente (ex.: mantendo a vítima no automóvel, o agente toma seu cartão, exige que ela informe a senha e circula com ela por caixas eletrônicos e estabelecimentos comerciais, fazendo saques e compras.
Este crime se distingue da extorsão mediante sequestro porque aqui há uma mera restrição temporal da liberdade, sem encarceramento da vítima, e sem exigência de um valor a título de resgate. Aqui, a restrição da liberdade é apenas um meio empregado para constranger a própria vítima e obter a vantagem.
Este crime se distingue do roubo mediante restrição da liberdade da vítima porque aqui o comportamento dela é imprescindível à obtenção da vantagem (ex.: fornecer a senha do cartão). Segundo o STJ, se num mesmo contexto o agente subtrair bens da vítima e também exigir a senha restringindo a liberdade, ele responderá pelos dois crimes em concurso material. Esta extorsão mediante restrição da liberdade não é crime hediondo.
2) Extorsão Mediante Sequestro - art. 159
Trata-se de crime complexo, pois ele funde dois tipos penais: extorsão e o sequestro. O agente sequestra a vítima, e exige vantagem para si ou para outrem como condição ou preço do resgate.
2.1) Sujeito Ativo
Qualquer pessoa. Normalmente, este crime é cometido em concurso de agentes, respondendo por ele aquele que arrebata a vítima, quem a vigia, quem a alimenta, quem negocia o resgate, etc.
- Se o agente simula o próprio sequestro e exige dinheiro de seus familiares, ele responde por extorsão, e não por extorsão mediante sequestro, pois não houve sequestro.
2.2) Sujeito Passivo
Qualquer pessoa. São vítimas deste crime tanto a pessoa sequestrada quanto aquela que sofre o dano patrimonial. A vítima é necessariamente um ser humano, pois a lei fala em "sequestrar pessoa". Se o agente subtrair, por exemplo, um animal de estimação e exigir resgate, seu crime será extorsão.
Se a vítima da extorsão mediante sequestro for menor de 18 anos ou maior de 60, incidirá a qualificadora do §1º.
2.3) Tipo Objetivo
A conduta é sequestrar, que significa privar da liberdade por tempo relevante. Não é preciso que a vítima seja levada para longe, podendo seu cativeiro ser até mesmo em sua casa.
Embora o tipo penal não as mencione, a violência ou grave ameaça estão implícitas no verbo sequestrar.
Discute-se se a vantagem objetivada pelo agente deve ser patrimonial, pois a lei aqui não fala em vantagem econômica, mas em "qualquer vantagem". Apesar disso, prevalece que a vantagem deve ser, tal como na extorsão, econômica e indevida:
- Deve ser econômica, pois o crime é patrimonial. Se a vantagem tiver outra natureza, o crime será outro (ex.: o agente sequestra o filho exigindo que a mãe se relacione sexualmente com ele - responderá por sequestro em concurso material com estupro; o agente sequestra o diretor da cadeia exigindo a libertação de um preso - responderá por sequestro em concurso material com facilitação da fuga de preso - art. 351);
- Deve ser indevida. Se a vantagem for devida, o agente responderá por sequestro em concurso com exercício arbitrário das próprias razões - art. 345.
A vantagem é exigida como condição ou preço do resgate:
- Condição do resgate é qualquer comportamento da vítima que dê causa a uma vantagem patrimonial para o agente (ex.: assinar um cheque, rasgar uma promissória, abrir um cofre, etc.);
- Preço do resgate é um pagamento em dinheiro ou outro valor.
2.4) Tipo Subjetivo
É o dolo específico de obter para si ou para outrem a vantagem. Sem essa finalidade, o crime será o de sequestro ou cárcere privado - art. 148.
Não é preciso que esse dolo de obter a vantagem econômica anteceda a privação da liberdade, sendo possível que ele surja depois disso (ex.: o agente sequestra um inimigo para vingar-se e depois resolve pedir dinheiro para libertá-lo, caso em que responderá por extorsão mediante sequestro, a qual absorve o sequestro; o agente priva a vítima da liberdade para praticar roubo, e quando vê seus bens percebe que ela é rica e decide exigir dinheiro para libertá-la, caso em que há concurso material de roubo mediante privação da liberdade com extorsão mediante sequestro).
2.5) Consumação
O crime se consuma com a privação da liberdade por um tempo relevante, independentemente da obtenção da vantagem econômica. Portanto, é crime formal, bastando haver prova de que a finalidade do agente era a obtenção dessa vantagem. Nem é preciso, portanto, que o agente chegue a fazer a exigência do resgate, bastando que a finalidade seja essa.
O crime é permanente, pois a consumação se prolonga durante todo o período em que a vítima é mantida privada de sua liberdade. Assim, se o agente tinha menos de 18 anos no momento em que arrebatou a vítima e completa esta idade enquanto ela ainda está no cativeiro, ele responde pelo crime, pois continuou consumando-o após os 18 anos.
Se a privação de liberdade ultrapassar 24 horas, surgirá a qualificadora do §1º.
Como crime se consuma com a privação da liberdade, é competente para a ação penal o juízo do local em que esta privação ocorreu, e não eventual outro juízo do local do cativeiro ou do recebimento do resgate (ex.: a vítima é capturada em São Paulo, levada para o cativeiro em Santo André, e o resgate é pago em Mauá. É competente o juízo de São Paulo).
Como o crime é permanente, permite-se a prisão em flagrante a qualquer tempo, enquanto durar a permanência - CPP, art. 303.
Admite-se tentativa quando a vítima não chega a ser privada da liberdade por tempo relevante por circunstâncias alheias à vontade do agente (ex: o agente agarra a vítima, mas esta consegue se livrar imediatamente e foge).
2.6) Formas Qualificadas
a) Duração superior a 24 horas - §1º: este tempo se conta da privação de liberdade da vítima até sua efetiva libertação, ainda que o resgate seja pago antes. Trata-se de "crime a prazo", pois sua configuração depende da passagem de um tempo.
- Tratando-se de qualificadora objetiva, ela se comunica a todos os coautores ou partícipes - art. 30.
b) Sequestrado menor de 18 anos ou maior de 60 - §1º: para que incida esta qualificadora, é preciso que ela integre o dolo do agente, ou seja, que ele saiba ou ao menos que ele assuma o risco de a vítima ser menor de 18 ou maior de 60. Se ele acredita que a vítima tem outra idade, há erro de tipo, e ele não responde pela qualificadora.
- Como o crime é permanente, a qualificadora se configura se a vítima era menor de 18 anos na época do arrebatamento, ainda que ela já complete os 18 no cativeiro. Ou então se a vítima completa os 60 anos no cativeiro, embora tenha sido sequestrada antes.
c) Quadrilha ou bando - §1º: recentemente, a Lei nº 12.850/13 alterou o art. 288, eliminando a expressão "quadrilha ou bando", e passando a denominar a conduta de "associação criminosa". No entanto, o legislador esqueceu esta menção a quadrilha ou bando no art. 259, §1º. Diante disso, surgiram duas posições:
- A primeira diz que esta qualificadora não se aplica mais, pois não há mais tipificação legal de quadrilha ou bando;
- A segunda diz que como o tipo penal da associação criminosa é ainda mais amplo e abrange todas as condutas que antes configuravam a formação de quadrilha ou bando, a qualificadora continua aplicável, desde que estejam presentes todas as elementares do art. 288.
- Para os que admitem a qualificadora, os agentes respondem por extorsão mediante sequestro em concurso material com o crime do art. 288. Segundo o STF e o STJ, não há bis in idem, pois o crime de associação criminosa (antiga quadrilha) é autônomo e já se consumou antes que o primeiro seja praticado.
d) Se do fato resulta lesão grave ou morte - §2º: aqui não é preciso que o resultado decorra de violência, mas sim "do fato" (ex.: sequestrada mediante ameaça, a vítima cardíaca é privada de seus remédios e morre. A qualificadora se aplica, pois a morte resultou do fato).
- Por outro lado, se a morte ocorre em pessoa diversa do sequestrado, a qualificadora não se aplica (ex.: ao saber do sequestro da filha, o pai sofre ataque cardíaco e morre; o sequestrador mata aquele que vem pagar o resgate, etc. Nestas hipóteses, os agentes responderão por extorsão mediante sequestro em concurso material com homicídio, culposo na primeira hipótese, doloso na outra);
- Este crime qualificado pelo resultado tanto pode ser doloso como preterdoloso, cabendo ao Juiz distinguir estas hipóteses na dosagem da pena. A tipificação é a mesma para a hipótese da vítima que, por exemplo, morre de ataque cardíaco causado pela privação da liberdade e a hipótese em que os sequestradores matam a vítima porque o resgate não foi pago.
As qualificadoras do §1º não são cumulativas com as dos §§2º e 3º. Assim, por exemplo, se a vítima for menor de 18 anos e morrer, aplica-se apenas o §3º, cabendo ao Juiz levar em conta a idade da vítima na dosagem da pena.
2.7) Delação Premiada - §4º (Lei nº 9.269/96)
Trata-se de causa obrigatória de redução de pena para o coautor ou partícipe que denunciar o crime à autoridade, facilitando a libertação do sequestrado. Para a aplicação do benefício, exige-se a presença de três requisitos cumulativamente:
a) Crime praticado em concurso de agentes;
b) Delação por um dos agentes à autoridade;
c) Nexo causal entre essa delação e a libertação da vítima.
Por outro lado, a jurisprudência, por analogia in bonam partem, tem concedido a redução ao agente que, embora não denuncie o fato ao autoridade, espontaneamente liberta a vítima antes do pagamento do resgate.
A extorsão mediante sequestro, em qualquer de suas modalidades, é crime hediondo - Lei nº 8.072/90, art. 1º, IV.
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