Dos Legados
1) Conceito
É uma coisa fungível ou infungível, que por testamento é deixada por alguém. Distingue-se da herança, pois esta é composta pela totalidade da massa hereditária, ou um percentual dela.
- Ademais, o herdeiro sucede a título universal, enquanto que o legatário sucede a título singular, recebendo apenas uma coisa concreta do acervo hereditário.
- Ainda, o herdeiro responde pelas dívidas do morto até o limite do quinhão herdado, enquanto que o legatário não responde pelas dívidas do morto.
- Por fim, o herdeiro pode ajuizar ações possessórias, porque tem a posse desde a abertura da sucessão; o legatário não pode ajuizar ações possessórias, pois sua posse só advém após partilha.
- Em não havendo herdeiros necessários, nada impede que toda a herança seja distribuída em legados.
- Qualquer pessoa, natural ou jurídica, pode figurar como legatária, inclusive o próprio herdeiro.
- Quando na mesma sucessão o herdeiro é também legatário, ele se denomina prelegatário. Assim, chama-se prelegatário o sujeito que, na mesma sucessão, reúne as qualidades de herdeiro legítimo e legatário - CC, art. 1.808, §1º.
- O objeto do legado pode ser qualquer bem, móvel, imóvel, fungível, infungível, corpóreo, incorpóreo, etc., prevendo a lei, inclusive, o legado de dívida.
- Quanto ao valor do legado, deve ser fixado pelo próprio testador, sendo-lhe vedado delegar essa atribuição a terceiro, salvo para a remuneração de serviços que lhe foram prestados por ocasião da moléstia de que faleceu.
2) Espécies de Legado
2.1) Legado de Coisa Alheia - art. 1.912
De acordo com o dispositivo, é ineficaz o legado de coisa certa que não pertença ao testador no momento da abertura da sucessão. Por outro lado, se quando testou a coisa não lhe pertencia, vindo a adquiri-la posteriormente, convalida-se o ato. Contudo, admite-se o legado sobre coisa alheia nas seguintes situações:
- Se o legado for de coisa que se determina pelo gênero ou pela espécie (vide tópico 2.3 abaixo);
- Se o testador determina que o herdeiro ou o legatário entregue coisa de sua propriedade a outrem (condição). Se este não o cumprir, entender-se-á que renunciou à herança ou ao legado. Chama-se sublegado a coisa que deve ser entregue a outrem, por ordem do testador, pelo herdeiro ou legatário. O beneficiário se denomina sublegatário - arts. 1.913 e 1.914;
- Se o testador ordena que a coisa alheia seja adquirida pelo herdeiro para ser entregue ao legatário (encargo). Trata-se de encargo imposto ao herdeiro, que, se descumprido, implicará em renúncia à herança.
2.2) Legado de Coisa Comum - art. 1.914
Ocorre quando a coisa legada pertencer ao testador e a outros condôminos. Neste caso, subsistirá o legado tão somente quanto a parte pertencente ao testador.
2.3) Legado de Coisa Indicada pelo Gênero ou Espécie - art. 1.915
De acordo com o dispositivo, o legado de coisa indicada pelo gênero ou espécie deve ser cumprido, ainda que a coisa não exista entre os bens deixados pelo testador.
- Nesta espécie de legado, há a fase da escolha do bem que no silêncio do testamento, competirá ao herdeiro, mediante a observância do princípio do meio-termo (nem as melhores, nem as piores coisas) - art. 1.929;
- Se a escolha couber ao legatário, ele pode optar pelas melhores coisas que já integrarem a herança. Se a coisa não integrar a herança, o herdeiro deverá entregar-lhe outra congênere, observando-se a regra do meio-termo - art. 1.931;
- Pode o testador, inclusive, nomear no testamento terceira pessoa para concretizar a escolha. Se esta não quiser ou não puder fazer, cabe ao Juiz fazer, todos observando o meio-termo - art. 1.930.
2.4) Legado de Coisa Certa ou Singularizada - art. 1.912
Ocorre quando o testamento individualiza perfeitamente a coisa, distinguindo-a das demais. Neste caso, é ineficaz o legado se a coisa não pertencer ao testador no momento da abertura da sucessão.
2.5) Legado de Coisa Localizada
Ocorre quando o testamento refere-se à coisa que deva encontrar-se em um determinado lugar (ex.: deixo a Maria as jóias que estão no cofre do banco tal). Se por ocasião da morte do testador a coisa havia sido removida, caducará o legado, salvo se a remoção foi transitória (ex.: em razão da reforma do cofre) - art. 1.917.
2.6) Legado de Crédito
É a cessão de crédito feita por testamento (ex.: diz o testador: "cedo para Maria os créditos que tenho a receber de Lúcia"). Conforme art. 1.918, §2º, esse legado só abrange os créditos existentes até a data do testamento;
- Referido legado é cumprido entregando-se ao legatário o respectivo título;
- Caducará o legado se, em vida, o testador receber a dívida.
2.7) Legado de Quitação de Dívida - art. 1.918
É o perdão da dívida efetuado em testamento. Neste caso, o legatário é devedor do testador;
- Este legado não compreende as dívidas posteriores ao testamento;
- Cumpre-se o legado entregando-se ao legatário o respectivo título;
- Se, porém, por ocasião da morte do testador a dívida já havia sido quitada, caduca o legado, não se conferindo ao legatário ação de repetição de indébito.
2.8) Legado de Dívida
Ocorre quando o testamento ordena o pagamento de certo débito.
- Aparentemente, pode ser inócuo, pois cabe ao herdeiro pagar as dívidas do morto, até o limite do quinhão herdado. Porém, referido legado tem grande utilidade quando tratar-se, por exemplo, de dívida prescrita, dívida não documentada, dívida de caráter moral, etc.;
- O legado que o testador faz ao seu credor não se presume que é feito em pagamento da dívida. Pelo contrário, presume-se o animus donandi, por força da disposição do art. 1.919.
2.9) Legado de Alimentos - art. 1.920
Consiste em uma quantia necessária para abranger o sustento, a cura, o vestuário e a casa, enquanto viver o legatário, além da educação se ele for menor. Pode ser em dinheiro ou in natura;
- Se o testamento não fixar o valor do legado, o Juiz fixará, considerando o binômio necessidade-possibilidade;
- O legado de alimentos, ao invés de ser extraído da herança, pode ser imposto como encargo ao herdeiro ou legatário, assumindo o perfil de sublegado.
2.10) Legado de Usufruto - art. 1.921
É a instituição do usufruto por testamento (ex.: diz o testador: "deixo o usufruto da casa tal para fulano");
- No silêncio do testamento, o usufruto é vitalício, cessando apenas com a morte do usufrutuário;
- Se o usufrutuário for pessoa jurídica, sua duração máxima é de 30 anos - art. 1.410, III.
2.11) Legado de Renda ou Pensão Periódica
É aquele que deve ser pago em prestações periódicas. Pode ser vitalícia ou temporária, conforme art. 1.926;
- O período pode ser semanal, quinzenal, mensal, semestral, anual, etc., conforme o testador mencionar;
- O pagamento, no silêncio do testamento, é feito no fim de cada período - art. 1.928, salvo se tiver caráter alimentar, quando então deverá ser pago no começo de cada período - Parágrafo único.
2.12) Legado de Obrigação Alternativa
É aquele que recai sobre uma coisa ou outra (ex.: diz o testador: "deixo para fulano a casa tal ou o apartamento tal");
- No silêncio do testamento, a escolha cabe ao herdeiro (e não ao legatário) - art. 1.932. Ver também art. 1.933;
- Caducará o legado se o legatário falecer antes do testador.
3) Frutos da Coisa Legada
De acordo com o art. 1.923, §2º, os frutos da coisa legada pertencem ao legatário, desde a morte do testador, salvo três hipóteses:
a) Legado sob condição suspensiva;
b) Legado sob termo inicial;
c) Legado de dinheiro.
- Nas duas primeiras hipóteses, os frutos somente são devidos após o implemento do termo ou da condição;
- Na terceira hipótese, os juros são devidos a partir do momento em que se constitui em mora a pessoa obrigada a cumprir o legado - art. 1.925. Neste caso, a mora será ex personae, isto é, depende de notificação (a outra mora seria a ex re - independe de ato do credor).
4) Do Pagamento do Legado
O legatário adquire a propriedade da coisa legada infungível no momento da abertura da sucessão; se fungível a coisa legada, ele adquire sua propriedade após partilha;
- Em se tratando de posse, seja a coisa fungível ou infungível, ele somente a adquire com a partilha.
O pedido de pagamento do legado, isto é, de entrega, deve ser formulado em face do herdeiro designado pelo testador para cumprir com o legado;
- Se o testador não nomeou ninguém, o cumprimento do legado incumbe aos herdeiros;
- Se não houverem herdeiros, cabem aos legatários na proporção do que receberem.
O herdeiro ou legatário incumbido da entrega denomina-se obrigado.
Nos termos do art. 1.935, se o legado consistir em coisa pertencente a herdeiro ou legatário, somente a ele incumbirá cumpri-lo, com regresso contra os coerdeiros, salvo disposição em contrário do testador.
5) Caducidade dos Legados
É a ineficácia do legado por fato posterior ao testamento. As causas de caducidade do legado estão previstas no CC, art. 1.939. Porém, essa enumeração não é taxativa, sendo também casos de caducidade os seguintes:
a) Renúncia do legatário;
b) Legatário que falece antes do implemento da condição;
c) Legatário incapaz de suceder ao tempo da abertura da sucessão.
- Efeitos da Caducidade: em todas as hipóteses de caducidade (ineficácia), a parte cabente ao legatário é revertida aos herdeiros legítimos do testador.
6) Do Direito de Acrescer - arts. 1.941 a 1.946
O direito de acrescer é a absorção, pelos demais sucessores, da parte cabente ao coerdeiro ou ao colegatário que não quer ou não pode aceitar a herança ou o legado. Só é possível na sucessão testamentária. Na sucessão legítima, à exceção da renúncia, não há o direito de acrescer. O CC prevê o direito de acrescer entre coerdeiros e entre colegatários.
6.1) Da Disposição Conjunta
É aquela em que vários herdeiros, ou legatários, são chamados coletivamente para a fruição dos mesmos bens do testador. Referida disposição pode ser:
a) Mista (re et verbis): ocorre quando os vários beneficiados figuram na mesma cláusula do testamento (ex.: deixo 1/3 da herança a Pedro e Paulo; deixo minha casa para A e B);
b) Real: (re tantum): ocorre quando os beneficiados figuram em cláusulas distintas do mesmo testamento (ex.: deixo minha herança para Paulo. Porém, em outra cláusula desse mesmo testamento diz o testador: também deixo minha herança para Pedro);
c) Verbal (verbis tantum): ocorre quando o testador beneficia mais de uma pessoa na mesma disposição, mas especificando a parte de cada um (ex.: deixo minha herança para A e B em partes iguais; deixo minha casa para A e B, sendo que A terá 30% e B terá 70%). No Brasil, não há direito de acrescer na disposição conjunta verbal.
Entre os colegatários, o direito de acrescer é admitido nas disposições conjuntas mista e real. Em se tratando de coerdeiros, só será possível o direito de acrescer na disposição conjunta mista (é certo, no entanto, que o Professor WBM também admite o direito de acrescer entre coerdeiros se a disposição conjunta for real).
6.5) Do Direito de Acrescer no Legado de Usufruto - art. 1.946
Ocorre quando o usufruto do mesmo bem é deixado a mais de um legatário, de forma conjunta, na mesma disposição testamentária, sem distribuição de cotas entre eles. A parte do que faltar acrescerá aos demais colegatários (ex.: o testador deixa o usufruto da sua casa para A, B e C. Se A renunciar, for premoriente, comoriente, indigno ou incapaz de suceder, haverá o direito de acrescer em favor de B e C).
O direito de acrescer abrange a disposição conjunta mista e também a disposição conjunta real.
Em se tratando de disposição conjunta verbal, em que o testador especifica a parte de cada um, exclui-se o direito de acrescer, operando-se a extinção parcial do usufruto, consolidando-se a propriedade em favor do nu-proprietário.
6.1) Da Disposição Conjunta
É aquela em que vários herdeiros, ou legatários, são chamados coletivamente para a fruição dos mesmos bens do testador. Referida disposição pode ser:
a) Mista (re et verbis): ocorre quando os vários beneficiados figuram na mesma cláusula do testamento (ex.: deixo 1/3 da herança a Pedro e Paulo; deixo minha casa para A e B);
b) Real: (re tantum): ocorre quando os beneficiados figuram em cláusulas distintas do mesmo testamento (ex.: deixo minha herança para Paulo. Porém, em outra cláusula desse mesmo testamento diz o testador: também deixo minha herança para Pedro);
c) Verbal (verbis tantum): ocorre quando o testador beneficia mais de uma pessoa na mesma disposição, mas especificando a parte de cada um (ex.: deixo minha herança para A e B em partes iguais; deixo minha casa para A e B, sendo que A terá 30% e B terá 70%). No Brasil, não há direito de acrescer na disposição conjunta verbal.
Entre os colegatários, o direito de acrescer é admitido nas disposições conjuntas mista e real. Em se tratando de coerdeiros, só será possível o direito de acrescer na disposição conjunta mista (é certo, no entanto, que o Professor WBM também admite o direito de acrescer entre coerdeiros se a disposição conjunta for real).
6.2) Da Renúncia ao Direito de Acrescer em Razão de Encargos Impostos
De acordo com o art. 1.945, em regra, não pode o beneficiário do acréscimo repudiá-lo separadamente da herança ou legado que lhe caiba. Como se sabe, a aceitação e a renúncia da herança ou do legado não pode ser parcial - art. 1.808. Assim, se rejeitar a parte a acrescer, estará renunciando a toda a herança.
Admite-se, no entanto, a renúncia ao direito de acrescer, apesar da aceitação da herança ou do legado, quando o acréscimo comportar encargos especiais impostos pelo testador, caso em que, uma vez repudiado, reverte o acréscimo para a pessoa a favor de quem os encargos foram instituídos (ex.: deixo minha herança para A e B, mas imponho a B o encargo de doar sua casa para C. Se B renuncia à herança, tem A o direito de acrescer. Este, no entanto, tendo em vista o encargo, poderá repudiá-lo, caso em que a cota de B irá para C, pessoa em favor de quem o encargo foi instituído).
6.3) Do Direito de Acrescer entre Coerdeiros
A regra encontra-se prevista no art. 1.941. Requisitos:
a) Nomeação de herdeiros conjuntos, isto é, sobre a mesma porção de bens;
b) Nomeação de herdeiros na mesma cláusula testamentária. Portanto, só há o direito de acrescer entre coerdeiros se a disposição conjunta for mista (lembrar que o Prof. WBM diz também ser possível na disposição conjunta real);
c) Que o testamento não especifique o quinhão de cada coerdeiro;
d) Que um dos coerdeiros seja premoriente (morra antes do testador ou antes de ocorrer a condição suspensiva), comoriente, incapaz de suceder, indigno, deserdado ou renunciante. Eis aí os fatos geradores do direito de acrescer;
e) Que o testador não tenha nomeado substituto para o coerdeiro (substituição vulgar).
- Quando não houver o direito de acrescer, a cota do coerdeiro que não quer ou não pode receber a herança será revertida aos herdeiros legítimos do testador - art. 1.944.
- Observação ao art. 1.943, Parágrafo único: os encargos de caráter personalíssimos são intransmissíveis (ex.: deixo minha herança para A e B, mas imponho que A deva se casar). Se A renuncia à herança, surge para B o direito de acrescer, mas este não precisará se casar.
- Quando o CC, art. 1.941, diz que qualquer dos herdeiros não possa (ou não queira aceitar a herança), deve-se entender o seguinte:
- "Não quer": equivale a renúncia;
- "Não pode": equivale a indignidade, deserdação, premoriência, comoriência ou incapacidade para suceder.
- Questão solucionada pelo CC é a referente à renúncia de um coerdeiro após o outro ter cedido seus direitos hereditários (ex.: o testador deixa a herança para A, B e C. A aliena seus direitos hereditários a D. Uma semana depois, B renuncia à herança). De acordo com o art. 1.793, §1º, o direito de acrescer beneficiará o herdeiro cedente A e o herdeiro C, mas não o cessionário D.
6.4) Do Direito de Acrescer entre Colegatários
A regra encontra-se prevista no art. 1.942. Requisitos:
a) Que os colegatários tenham sido nomeados conjuntamente a respeito de uma só coisa, determinada e certa (disposição conjunta mista) ou quando o objeto legado não puder ser dividido sem risco de desvalorização (disposição conjunta real);
b) Que um dos colegatários seja premoriente, comoriente, renunciante, indigno, incapaz de suceder ou então quando não se verificar a condição sob a qual foi nomeado;
c) Que o testador não tenha especificado o quinhão de cada um (não pode ser disposição conjunta verbal);
d) Que o testador não tenha nomeado substituto para o colegatário que não quer ou não pode aceitar o legado.
- Em não havendo o direito de acrescer entre colegatários, aplica-se a regra prevista no art. 1.944, Parágrafo único. Quando a cota vaga tiver que ser distribuída a todos os herdeiros, estes abrangem legítimos e testamentários, pois a lei fala "em todos os herdeiros".
6.5) Do Direito de Acrescer no Legado de Usufruto - art. 1.946
Ocorre quando o usufruto do mesmo bem é deixado a mais de um legatário, de forma conjunta, na mesma disposição testamentária, sem distribuição de cotas entre eles. A parte do que faltar acrescerá aos demais colegatários (ex.: o testador deixa o usufruto da sua casa para A, B e C. Se A renunciar, for premoriente, comoriente, indigno ou incapaz de suceder, haverá o direito de acrescer em favor de B e C).
O direito de acrescer abrange a disposição conjunta mista e também a disposição conjunta real.
Em se tratando de disposição conjunta verbal, em que o testador especifica a parte de cada um, exclui-se o direito de acrescer, operando-se a extinção parcial do usufruto, consolidando-se a propriedade em favor do nu-proprietário.
- No usufruto instituído por ato intervivos, em favor de dois ou mais usufrutuários, não há o direito de acrescer, salvo se houver cláusula expressa - art. 1.411
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