sexta-feira, 31 de outubro de 2014

14 - Direito Civil 2 - Obrigações - Contratos - Compra e Venda


Contrato de Compra e Venda

1) Conceito

É o contrato pelo qual o vendedor assume a obrigação de transferir a propriedade de um bem corpóreo mediante pagamento em dinheiro. No Brasil, adota-se o sistema romano ou alemão: o simples contrato, ainda que haja pagamento, não transfere a propriedade; esta só é transmitida com a tradição. 
  • Tradição de bens móveis: é a entrega com a intenção de aliená-lo;
  • Tradição de bens imóveis: é o registro no cartório de registro de imóveis (tradição solene).
Ainda que não haja pagamento, se houver tradição, o comprador adquire a propriedade. Se o sujeito vende o imóvel para duas pessoas, será proprietário aquele que registrou primeiro, e não aquele cuja escritura pública tenha sido lavrada primeiro.

Excepcionalmente, há dois contratos que por si só transferem a propriedade, mesmo sem tradição:
  • Alienação fiduciária em garantia - CC, art. 1.361;
No Brasil, a presunção de verdade do registro é juris tantum, isto é, relativa, pois cabe ação judicial para anular o registro (ex.: erro, dolo, coação, nulidades, etc.). Excepcionalmente, o Registro Torrens - Lei nº 6.015/73, art. 277 gera presunção absoluta, não admitindo prova em contrário. Somente imóveis rurais podem sofrer o registro torrens, o qual deve ser requerido ao Juiz-Corregedor, que o autorizará por sentença.


2) Natureza Jurídica

É um contrato bilateral, oneroso, em regra comutativo, mas por acordo entre as partes poderá ser acidentalmente aleatório. É um contrato translativo do domínio, pois gera a obrigação de transferir a propriedade.

É um contrato de forma livre quando recair sobre bem móvel, pois pode ser verbal. Exceções: compra e venda com reserva de domínio exige forma escrita, e a compra e venda de navio ou aeronave exige escritura pública, admitindo hipoteca, e autorização do cônjuge do vendedor - nesses dois exemplos, o contrato é solene.

A venda de bem imóvel sempre é contrato solene, não havendo exceção a esta regra. Se o imóvel for no valor de até 30 salários mínimos, pode ser por escritura particular. Acima desse valor, exige-se escritura pública, salvo aquisição de casa própria para fins de moradia financiada pelo SFH, caso em que admite-se a escritura particular - Lei nº 4.380/64, art. 61, §5º. 
  • A escritura pública pode ser dispensada em vendas judiciais homologadas pelo Juiz (ex.: acorda na ação de divórcio em que o marido venda a sua metade do bem para a mulher; arrematação de bem em hasta pública). A solenidade se dá pela sentença.
  • O registro de imóveis, antes de registrar qualquer título, ainda que sejam judiciais, faz a qualificação, isto é, o exame do título. Caso apresente alguma imperfeição (ex.: violação do princípio da continuidade do registro), o registro é indeferido.

3) Elementos

São os seus requisitos de existência. São a coisa (rem), o preço e o consentimento - art. 482. Se houver acordo sobre a coisa e o preço, a compra e venda já existe e é obrigatória. A forma prescrita em lei é requisito de validade, e não de existência.


3.1) Coisa (rem)

É um bem corpóreo (que tem existência física). Os bens incorpóreos, isto é, os direitos, são objetos de cessão de direitos, e não de compra e venda.

A coisa deve ter uma existência no mínimo potencial, isto é, aptidão para vir a existir. É possível vender coisa que ainda não existe, isto é, coisa futura, desde que ela tenha possibilidade de existir, caso em que se a coisa não vier a existir, a venda é válida, mas ineficaz.

Aquela venda poderá ser eficaz se for emptio spei (venda de coisa futura em que o comprador assumiu o risco da existência - contrato aleatório):
  • Se a possibilidade de a coisa existir for fisicamente impossível, a venda é nula (ex.: máquina que ressuscita mortos); 
  • Se o bem vendido perece, isto é, é totalmente destruído antes da tradição, sem culpa do vendedor, a venda será extinta sem perdas e danos;
  • Se o bem já havia perecido antes do contrato e o vendedor estava de boa-fé (não sabia), a venda será inexistente por falta de objeto, mas será válida e eficaz na hipótese do art. 461, caso que será a venda poderá ser anulada como dolosa se o prejudicado provar que o outro sabia que o risco não existia (ex.: mercadoria em zona de guerra: se o vendedor não sabia que a guerra havia acabado, e vende a mercadoria, mas o comprador já sabia e se calou, o vendedor resta prejudicado; se o vendedor sabe que a mercadoria foi consumida na guerra e se calou, o comprador resta prejudicado).
A coisa deve ser determinada (individualizada) ou determinável (indicada pelo gênero e quantidade) (ex.: venda de 10 sacas de café).
  • Venda de bem inalienável: é nula, salvo se houver alvará judicial. A cláusula de inalienabilidade só pode ser inserida nos casos em que a lei autoriza, basicamente em bens deixados por doação ou testamento, e bem de família do Código Civil. Quem vende não pode tornar o bem inalienável para o comprador, ainda que este concorde, pois a lei não prevê esta hipótese. 
  • Venda de coisa alheia a comprador de boa-fé: não é nula, mas anulável, pois se o vendedor adquirir a propriedade, convalida-se a venda - art. 1.268, §1º. Se fosse nula, não admitiria convalidação. Se o comprador sabia que a coisa era alheia, o negócio não é compra e venda, mas promessa de fato de terceiro; logo, se o proprietário não anuir ao negócio, o vendedor terá que indenizar as perdas e danos (Sílvio Rodrigues).
  • Venda de coisa litigiosa (objeto de ação judicial): se o comprador foi informado deste fato, a venda é válida. Se o vendedor silenciou sobre este fato, a venda é anulável pelo dolo por omissão.

3.2) Preço

O preço deve ser estipulado em dinheiro. O pagamento, que não é requisito nem de existência nem de validade da compra e venda, pode ser feito em cheque ou outros títulos de crédito. Não confundir a estipulação do preço com o pagamento.
  • Se o preço for estipulado em serviço, trata-se de contrato inominado, e não compra e venda (ex.: dou a carcaça do Ômega pro mecânico que transferir o motor e o câmbio automático pra minha C10);
  • Se o preço for estipulado em coisa, o contrato será de permuta ou escambo;
  • Se uma parte do preço for estipulada em coisa e a outra em dinheiro, o negócio será compra e venda se a maior parte for em dinheiro, e permuta se a maior parte for em coisa.
O preço deve ser real, isto é, representar uma contraprestação. Se for fictício, isto é, irrisório (ex.: venda de uma casa por R$1), a venda é nula, mas pode ser convertida em doação.
  • Preço injusto: é o que não corresponde ao valor do bem, isto é, desproporcional (ex.: vende por R$30 um imóvel de R$100). Em regra é válido, salvo se houver lesão, a qual exige dois requisitos: preço desproporcional e vendedor inexperiente ou em situação de necessidade econômica. Presentes estes requisitos, o negócio é anulável, ainda que o comprador estivesse de boa-fé, não soubesse da necessidade ou inexperiência.
É possível compra e venda sem fixar o preço? Em regra, é negócio inexistente, salvo se for venda habitual - art. 488 (ex.: feita por empresário). Nesse caso, entende-se que o preço é o tabelado (preço oficial); caso não haja tabelamento oficial, como ocorre nos dias de hoje, entende-se que é o preço corrente, isto é, usualmente praticado pelo vendedor.


3.3) Consentimento

É o acordo de vontades sobre a coisa e o preço. 

O vendedor casado, para alienar imóveis, precisa da autorização do cônjuge, salvo: 
  • Empresário individual - art. 978: pode alienar os imóveis que integram o patrimônio da empresa (porém, para integralizar imóvel no capital social, depende da outorga uxória - art. 1.641, I);
  • Regime de separação de bens;
  • Regime de participação final nos aquestos, em cujo pacto antenupcial consta expressamente a dispensa da autorização do cônjuge. Nos demais regimes, esta cláusula de dispensa é nula. 
Fora dessas hipóteses, exige-se a autorização do cônjuge ainda que o imóvel pertença exclusivamente ao outro cônjuge.


4) Dívidas Sobre o Imóvel - art. 502

O vendedor responde pelas dívidas sobre o imóvel existentes antes da tradição. O comprador não responde por essas dívidas anteriores, salvo:
  • Tributos e contribuições que recaiam sobre o bem (ex.: IPTU);
  • Despesas de condomínio.
Nessas duas hipóteses, o vendedor e o comprador são devedores solidários, mas o comprador tem direito de regresso contra o vendedor devedor. Se o Fisco, por erro, expedir certidão negativa de débito tributário, o comprador não responderá por tributos anteriores - CTN, art. 130.


5) Venda a Descendente - art. 496

O ascendente, para vender a descendente, precisa da autorização dos demais descendentes, seja o bem móvel ou imóvel. Exige-se ainda a autorização do cônjuge do vendedor, salvo regime da separação obrigatória.

Esta autorização também é exigida no compromisso de compra e venda, dação em pagamento, permuta e cessão onerosa de direitos hereditários, pois são negócios em que há risco de se fraudar a legítima. A razão da autorização é permitir que os filhos fiscalizem e evitem uma doação mascarada de compra e venda.
  • O ascendente, para doar para o descendente, não precisa da autorização dos demais descendentes. Quando o doador morrer, o descendente donatário tem a obrigação de colacionar o bem, isto é, devolver o bem ou seu valor à herança. Na venda não existe colação, razão pela qual exige a fiscalização para impedir doação disfarçada de compra e venda.
A venda sem esta autorização não é nula, mas anulável, no prazo decadencial de 2 anos, contados da venda. Está cancelada a Súmula n. 494-STF que fixava o prazo de 20 anos e considerava nulidade absoluta. 

No NCC, o art. 178 prevê o prazo de 2 anos nos casos em que a lei diz que o negócio é anulável e se omite sobre o prazo.

Para mover a ação anulatória é preciso aguardar a morte do vendedor?
  • Uma primeira corrente afirma que sim, pois não se pode discutir herança de pessoa viva. É o que dizia a Súmula n. 142-STF, cancelada há muito;
  • Uma segunda corrente defende que não, pois na ação anulatória não se reivindica herança, mas simplesmente a anulação de negócio para que o bem volte ao patrimônio do vendedor. Esta é majoritária e correta. Quem pode mover a ação: o cônjuge do vendedor ou o descendente cuja autorização era necessária. Depende apenas da autorização dos descendentes que sejam herdeiros imediatos. 
Na venda ao filho, não é preciso colher a autorização de netos ou bisnetos, salvo se eles forem herdeiros em razão da morte de seu genitor (herdeiros por representação). Avô, para vender a neto, não precisa da autorização dos outros netos, salvo se somente houverem herdeiros netos. Avô, para vender a neto, não precisa de autorização de filhos, salvo se o neto for herdeiro por representação.

Filho que foi reconhecido após a venda pode propor ação, pois o reconhecimento tem efeito ex tunc, retroagindo à data da concepção. O prazo da ação é de 2 anos contados da venda. Filho concebido após a venda não pode mover a ação, pois os requisitos de validade do negócio jurídico são apurados ao tempo da celebração do negócio.

Se um dos descendentes for menor ou nascituro, é preciso que o Juiz lhe nomeie um curador especial para autorizar ou não a venda.

Se um dos descendentes se recusa a autorizar, a posição dominante é que é cabível alvará judicial de suprimento de consentimento, quando a recusa for injusta. Aplica-se, por analogia, o art. 1.517, que prevê o alvará judicial para o casamento do menor quando os pais se negarem a autorizar.


6) Venda por Condômino de Bem Indivisível

Condomínio é o fato de a propriedade de um bem pertencer a mais de uma pessoa. Se o bem for indivisível (ex.: apartamento), o condômino, antes de vender seu quinhão para um terceiro, deve dar preferência aos demais condôminos, notificando-os e informando-os sobre o preço que pretende obter. 

Feita a venda sem respeitar o direito de preferência, é cabível a chamada ação de prelação ou preempção, que é uma espécie de ação reivindicatória, pois o autor da ação busca o bem para si, e não anular o negócio. Esta ação só pode ser proposta por condômino. Se houver mais de um condômino, a preferência é na seguinte ordem: 
  • Condômino que fez as benfeitorias de maior valor;
  • Maior condômino;
  • Condômino que primeiro depositar o preço na ação. É pressuposto processual desta ação que o autor, junto com a petição inicial, deposite o valor pelo qual o bem foi adquirido, além do ITBI, despesas com a escritura pública e o valor de eventuais benfeitorias feitas pelo comprador. Se não houver este depósito, o Juiz manda o autor depositar em 10 dias, sob pena de extinção do processo sem resolução do mérito - CPC, art. 267, IV. Os réus são o condômino alienante e o terceiro comprador: trata-se de litisconsórcio passivo necessário. É preciso autorização do cônjuge do autor e do cônjuge dos réus, pois é uma ação real sobre bens imóveis. Só se dispensa essa autorização no regime da separação de bens. O prazo para propositura da ação é de 180 dias a contar da ciência da venda, e não do registro: trata-se de prazo decadencial. A sentença que julga procedente não anula a venda, mas sim atribui o quinhão ao autor da ação e libera o depósito ao terceiro comprador. 
Há ainda esta preferência para reivindicar o bem nas seguintes hipóteses:
  • Herdeiro que quer fazer cessão onerosa de seus direitos hereditários - art. 1.794;
  • Na enfiteuse, o senhorio direto, antes de vender o domínio útil, tem que dar preferência ao enfiteuta, e este, antes de vender a enfiteuse, tem que dar preferência ao senhorio direto - CC 1916, art. 683 e 684, que continuam sendo aplicados às enfiteuses for força do NCC, art. 2.038. Este NCC proíbe novas enfiteuses, salvo sobre terrenos da Marinha, mas as antigas enfiteuses continuam em vigor. É o único aspecto em que ainda vigora o CC 1916.
O inquilino, em regra, não tem direito de preferência, salvo se o contrato de locação estava averbado no registro de imóveis há pelo menos 30 dias antes da venda.


7) Venda ao Cônjuge

É possível vender ao cônjuge apenas os bens excluídos da comunhão. É nula a venda que recaia sobre bens comuns, isto é, que pertença a ambos os cônjuges por força do regime de bens.

A venda ao cônjuge surtirá efeito integral, se o regime for o da separação de bens, caso em que o bem passará a pertencer exclusivamente ao cônjuge comprador. Mas não surtirá efeito integral se o regime for o da comunhão parcial ou total, pois nesses regimes aquisições onerosas se comunicam; logo, metade do bem continuará pertencendo ao cônjuge vendedor.

No regime da separação obrigatória de bens é válida a venda de bem de um cônjuge para outro?
  • A primeira corrente diz que não, pois seria fraude ao regime de bens;
  • A segunda diz que sim, pois o art. 499 não proíbe a venda nesse regime. É a melhor corrente.

8) Vendas Ad Corpus e Ad Mensuram

Trata-se de classificação apenas para bens imóveis.

A venda ad corpus é a que envolve um imóvel certo e determinado cujo preço não está diretamente relacionado à exata dimensão da área (ex.: venda de uma casa, apartamento, terreno murado ou cercado, fazenda em que se descreve os confrontantes, fazenda em que se descreve a área a título meramente enunciativo, isto é, exemplificativo, como mais ou menos tantos alqueires);
  • Efeitos: quer a área seja maior ou menor que a prevista no contrato, nenhuma das partes poderá reclamar, pois na venda ad corpus não cabe ação para discutir a dimensão da área.
A venda ad mensuram, ou por medida de extensão, é aquela em que o preço pago pelo imóvel está diretamente relacionado à exata dimensão da área (ex.: o contrato prevê o valor do metro quadrado, do alqueire, especifica que a finalidade do negócio é para montar algo que exija uma área exata). Toda venda do CDC é ad mensuram, pois é dever do fornecedor informar corretamente a área. Efeitos:

  • Se a área é menor, mas o vendedor tem área contígua, só é cabível a ação ex empto ou ex vendito, além de perdas e danos. Essa ação é a que busca o complemento da área faltante. Alguns civilistas afirma ser ação real, pois reivindica-se área;
  • Se o vendedor não tem área contígua no local, é cabível, além das perdas e danos, uma das ações edilícias: redibitória (rescisão do contrato, com devolução da coisa e recebimento do dinheiro de volta), quanti minoris (pede-se o abatimento do preço). 
  • Frise-se que se houver área contígua, só cabe a ação ex empto, descabendo as edilícias; logo, é errado dizer que há uma tríplice opção de ações para o comprador. O prazo para as 3 ações é de 1 ano, a contar do registro no registro de imóveis. Se, porém, houver o registro, mas a posse, por culpa do vendedor, só for transmitida depois, conta-se o prazo da imissão na posse. O prazo é decadencial; logo, não se interrompe nem se suspende. 
Se a área for maior, é cabível ação de complemento de preço movida pelo vendedor? Depende:
  • Se o erro for inescusável, isto é, culposo, o vendedor não poderá mover nenhuma ação, mesmo sendo a área ad mensuram;
  • Se o erro for escusável, isto é, ele tinha motivos para ignorar a exata dimensão da área, ele pode mover ação para pleitear o complemento do preço ou devolução da área excedente, sendo que o comprador terá opção de permanecer com o excesso, mediante complemento do preço.
Provado que a venda é ad corpus, qualquer que seja a diferença de área, não cabe ação nenhuma. Provada que a venda é ad mensuram, por menor que seja a diferença de área, caberá ação. Todavia, na dúvida se a venda é ad corpus ou ad mensuram, presume-se que é ad corpus se a diferença for de até 1/20 (5%); se for acima disso, presume-se que é ad mensuram - art. 500, §1.

No CDC, toda venda é ad mensuram.


9) Retrovenda ou Contrato de Retrato

É a cláusula que permite ao vendedor do imóvel desfazer a venda no prazo máximo de 3 anos, mediante devolução do mesmo preço da venda. Só é possível esta cláusula na venda de imóveis. É nula na venda de bens móveis.
  • Tem natureza jurídica de contrato acessório. Nula a compra e venda, anula-se a retrovenda. Nula a retrovenda, não se anula a compra e venda. É também um contrato solene, exigindo escritura pública se o imóvel tiver valor acima de 30 salários mínimos; abaixo desse valor, exige-se escritura particular. Ainda, é um contrato personalíssimo, pois o direito de desfazer a venda não pode ser transmitido por ato intervivos, mas transmite-se a herdeiros e legatários com a morte do vendedor - art. 507. 

9.1) Ação de Resgate ou de Retrato

E a proposta pelo vendedor para desfazer a venda em caso de retrovenda.

a) Prazo: é aquele previsto na escritura, cujo máximo é de 3 anos; reputa-se não escrito o que exceder a 3 anos.

  • Se o contrato prevê a retrovenda, mas não fixa o prazo, presume-se que é de 3 anos. É um prazo decadencial que se inicia com o contrato, e não com o registro. 

b) Pressupostos processuais:
  • Antes de mover a ação, o vendedor deve notificar o comprador, convidando-o a desfazer a venda. Se houver acordo, lavra-se a escritura pública de retrato. Na retrovenda, não incide ITBI, pois não é venda, mas sim desfazimento da venda.
  • O vendedor que move a ação tem que depositar o preço da venda atualizado, ITBI, despesas com a escritura pública e valor das benfeitorias feitas pelo comprador. Sem este depósito, o Juiz manda complementar a inicial, sob pena de extinção do processo sem resolução do mérito. Se o depósito for insuficiente apenas quanto ao valor das benfeitorias, o Juiz julga procedente a ação, condicionando que o domínio só será restituído ao vendedor após ele complementar o depósito. É a interpretação do Parágrafo único do art. 506;
  • Se o comprador vendeu o bem a terceiro, mas a cláusula de retrovenda estava averbada no registro de imóveis, é pacífico que cabe a ação de resgate contra o terceiro. Se esta cláusula não estava averbada no registro de imóveis, a corrente dominante afirma que não cabe a ação de resgate contra o terceiro, pois protege-se a boa-fé do terceiro. MHD afirma que cabe sim.
É nula a retrovenda para esconder mútuo usurário, isto é, com juros acima dos juros legais. Trata-se de negócio simulado (ex.: agiota empresta 100 para João com juros absurdos; em vez de lavrar contrato de mútuo, simulou compra e venda com retrovenda no valor de 300, isto é, para João recuperar o bem terá que depositar 300 para o agiota).


10) Venda a Contento ou Ad Gustum

É a que só se forma quando o comprador aprovar a coisa. É possível para bens móveis ou imóveis, embora seja mais comum para roupas e outros bens móveis (ex.: mulher leva pra casa diversas roupas para experimentar, e só ficará com as que aprovar). 
  • É uma venda sob condição suspensiva, pois só nasce com a aprovação do comprador. Esta aprovação é ato personalíssimo, intransmissível por ato intervivos ou causa mortis; logo, se o comprador morrer antes de aprovar, a venda é ineficaz. Se morrer o vendedor, persiste o direito de o comprador aprovar perante os terceiros. 
a) Venda a contento sob condição suspensiva: é aquela em que o comprador, ao tomar posse do bem, adquire desde logo a propriedade, mas a venda será desfeita caso ele não aprove o bem.
  • Na condição suspensiva, a venda só nasce quando a coisa é aprovada pelo comprador. Antes disso, ele tem a posse como mero comodatário; logo, se a coisa perecer por caso fortuito ou força maior, o dono (vendedor) sofrerá o prejuízo, por força da regra res perit domino;
  • Na condição resolutiva, o comprador adquire desde logo a propriedade; logo, se a coisa perecer por caso fortuito ou força maior, ele, por ser o dono, é que sofrerá o prejuízo. 
b) Venda ad gustum sob condição resolutiva: 
  • MHD diz que não é possível, pois o CC só prevê sob condição suspensiva. Fundamento: gostar ou não do bem é uma condição potestativa, pois depende exclusivamente do arbítrio de uma das partes - art. 122. 
  • Uma segunda corrente diz que é possível com base na liberdade de contratar. Fundamento: a aprovação ou não do bem não depende exclusivamente da vontade, mas também de outras circunstâncias, como o preço, a ocasião, etc. Parece mais correta.

11) Venda de Ensaio, ou de Coisa Sujeita a Prova, ou de Experimentação

Tal qual a venda ad gusto,  a venda de ensaio é sob condição suspensiva, isto é, só se forma após o comprador aprovar o bem. A diferença é que na ad gusto o comprador pode rejeitar a coisa sem precisar fundamentar; o seu veto é soberano, ao passo que na venda de ensaio, o comprador só pode rejeitar o bem fundamentando que ele não reúne as qualidades prometidas pelo vendedor ou então não se presta ao fim a que se destina, sendo vedada a rejeição por outros motivos.


12) Direito de Preempção, ou Prelação, ou Preferência

É a cláusula inserida na compra e venda que assegura ao vendedor a prioridade para comprar o bem na hipótese de o comprador futuramente pretender revendê-lo. Ao decidir vender, o comprador deve notificar o antigo vendedor, informando-lhe o preço, dando-lhe assim o direito de preferência.

O prazo para exercer o direito de preferência, no silêncio, é de 3 dias para bens móveis e 60 dias para imóveis. O contrato pode prever outros prazos menores ou maiores, mas o prazo máximo é de 180 dias para bens móveis e 2 anos para imóveis. O direito de preferência é personalíssimo, isto é, intransmissível, por atos intervivos ou causa mortis.

Enquanto a retrovenda permite o desfazimento da venda pelo mesmo preço, e não incide ITBI, nem há registro (mas averbação da retrovenda), o direito de preferência enseja uma nova venda ao antigo vendedor com ITBI e novo registro.

Vendido o bem sem respeitar o direito de preferência, resta ao antigo vendedor a ação de perdas e danos, pois o direito de preferência contratual é mero direito pessoal. Não é direito real, não permitindo a reivindicação do bem, ao contrário do direito de preferência legal, isto é, do condômino de bem indivisível.


13) Retrocessão

O Poder Público que desapropria um bem e depois não lhe dá a finalidade pública deve oferecer este bem ao expropriado, para que ele tenha a oportunidade de comprar o bem pelo valor atual. Se o Poder Público não oferece o bem ao expropriado, este pode mover uma ação de retrocessão por ter sido violado seu direito de preferência.

Trata-se de uma ação pessoal, isto é, de perdas e danos, cujo prazo para propositura é de 5 anos a contar do momento que expira o prazo para o Poder Público dar ao bem a finalidade prevista no decreto de desapropriação. Não se trata de ação real, pois o expropriado não tem o direito de reaver o bem.


14) Venda sobre Documentos - art. 529

É aquela em que a tradição do bem é substituída por documento que o represente. Ao receber o documento, é como se o comprador recebesse a própria coisa, adquirindo a propriedade do bem, e não poderá se recusar a efetuar o pagamento alegando que a coisa está estragada, salvo se ele comprovar de antemão a avaria.

O pagamento deve ser feito no momento em que recebe o documento, não podendo condicionar tal pagamento à vistoria do bem. Quem responde pelos riscos do transporte do bem é o vendedor, embora ele não seja mais o dono. Esta regra é uma exceção ao res perit domino. Se, porém, houver contrato de seguro, quem responde pelos riscos do transporte é o comprador.


15) Venda com Reserva de Domínio - art. 521; CPC, art. 1.071

É aquela em que o comprador de um bem móvel infungível só adquirirá o domínio após o pagamento da última prestação. A posse é transmitida ao comprador, e ele assume a obrigação de pagar as prestações; logo, trata-se de uma venda a crédito, em prestações. Mas o comprador é mero possuidor. Ao pagar a última prestação, automaticamente, ele se torna proprietário do bem.

É uma venda sob condição suspensiva, pois a propriedade só é transmitida após a quitação. Todavia, o comprador, embora não seja o dono, responde pelos riscos, isto é, pelo perecimento da coisa por caso fortuito ou força maior. É mais uma exceção à regra res perit domino.

É uma venda solene, pois exige contrato escrito, e para valer perante terceiros precisa estar registrado no cartório de títulos e documentos do domicílio do comprador.

Enquanto não pagar todas as prestações, o comprador não poderá vender o bem, sob pena de crime de estelionato (para alguns autores seria caso de apropriação indébita).

Se houver inadimplência, o vendedor tem duas opções:
  • Mover ação para reaver o bem. Trata-se da ação de busca e apreensão, mas alguns julgados admitem também a reintegração de posse, casos em que o vendedor se apropria de uma parte das prestações pagas para se compensar da desvalorização do bem, e devolve o restante ao comprador. Se o bem se desvalorizou mais que as prestações pagas, o vendedor ainda pode mover ação de perdas e danos;
  • Mover ação de cobrança de todas as prestações vencidas e vincendas, caso em que o comprador, caso tenha pago mais de 40% das prestações, pode purgar a mora - CPC, art. 1.071, §2. 
Para mover uma dessas ações, o vendedor antes deve constituir em mora o comprador, através de protesto do contrato ou interpelação judicial.  Todavia, para cobrar apenas as prestações vencidas, e não as vincendas, não é preciso constituir em mora o devedor. 

A ação de busca e apreensão, caso o bem tenha sido vendido a terceiro, só poderá ser movida contra o terceiro se o contrato estava registrado. 

Distinções:
  • Pacto comissório: é venda sob condição resolutiva, isto é, o vendedor tem o poder de desfazer a venda se houver inadimplência. Pode recair sobre bens móveis ou imóveis. Reserva de domínio: é venda sob condição suspensiva, isto é, o comprador só adquire a propriedade após o pagamento. Só pode recair sobre bens móveis infungíveis. Condição resolutiva extingue o negócio, e a condição suspensiva faz nascer o negócio;
  • Alienação fiduciária em garantia: o devedor, em troca de um empréstimo, vende um bem que já possui ou recém adquirido, a uma instituição financeira, mantendo-se na posse do bem. É venda sob condição resolutiva, pois ao efetuar o pagamento a venda é extinta, o banco perde a propriedade do bem. Reserva de domínio: é uma venda sob condição suspensiva. A venda só nasce a partir do pagamento. O vendedor é o credor. Na alienação fiduciária, o vendedor é o devedor. Qualquer pessoa pode fazer venda com reserva de domínio, mas a alienação fiduciária de bem móvel é contrato bancário; é uma venda que só pode ser feita ao banco. Ambos são contratos solenes, dependem de forma escrita.


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