terça-feira, 14 de outubro de 2014

12 - Direito Civil 2 - Obrigações - Contratos - Extinção


Extinção dos Contratos

1) Introdução

A extinção normal dos contratos se dá com o pagamento, que é o cumprimento da prestação devida, e não necessariamente dinheiro.

A extinção anormal ocorre quando não há pagamento. As causas são as seguintes: nulidade absoluta ou relativa, resolução, resilição e morte em contratos personalíssimos.
  • O termo rescisão é um gênero que abrange duas espécies: a resolução e a resilição.

2) Nulidade Absoluta ou Relativa

Nulidade é o defeito que contamina o negócio desde o seu nascimento. Pode ser absoluta ou relativa. Ambas extinguem o contrato e geram o efeito de obrigar as partes a devolver as prestações, retornando-as ao status quo ante, isto é, situação anterior ao contrato. Ambas são vícios que surgem antes ou concomitante ao nascimento do contrato. Não existe nulidade por fato superveniente ao contrato, posterior; é sempre um vício de origem. Um negócio nunca se torna inválido; ele já nasce inválido. 


2.1) Nulidade Absoluta 

É decretada de ofício pelo Juiz, e nunca se convalida, isto é, a ação pode proposta a qualquer tempo, não prescrevendo. A sentença é meramente declaratória, pois esta nulidade opera-se por força de lei, e não por força de sentença. Logo, é pacífico que o efeito da sentença é ex tunc, retroagindo à data do negócio. 

Hipóteses de nulidade absoluta:
  • Contratante absolutamente incapaz, sem representação;
  • Objeto ilícito, ou impossível, ou indeterminado;
  • Violação da forma prescrita pela lei;
  • Violação de formalidade que a lei considera essencial;
  • Simulação;
  • Causa ilícita conhecida por ambas as partes;
  • Nulidade textual (quando a lei usa a expressão "é nulo");
  • Nulidade virtual ou tácita (quando a lei exige certo requisito para o contrato, e não prevê a sanção, caso em que entende-se que a sanção é a nulidade absoluta);
  • Fraude à lei de ordem pública, isto é, negócios para violar a lei.
Causa é o motivo do negócio. Objeto é a prestação (ex.: aluga casa sabendo que será prostíbulo. A prestação é lícita, é a casa. O motivo é ilícito. Se o locador sabia, o negócio é nulo).


2.2) Nulidade Relativa

Ou anulabilidade, não é decretada de ofício pelo Juiz. É preciso que seja arguida pelo interessado.

A ação de anulação deve ser proposta dentro do prazo decadencial, sob pena de convalidação do vício.

É possível a ratificação expressa ou tácita, que é o ato de vontade que confirma o negócio (ex.: após tomar ciência do vício, pagou a primeira parcela).

  • A sentença, segundo uma corrente, tem eficácia ex nunc, isto é, o negócio só é anulado a partir da sentença (MHD); 
  • Uma segunda corrente diz que tem efeito ex tunc, isto é, é anulado retroativamente (Antunes Varella). 
O CC, em caso de erro, dolo, coação, lesão e fraude contra credores, prevê expressamente o efeito retroativo, e anula-se o negócio desde sua celebração. Em negócios de prestação continuada (ex.: locação) é pacífico que se anula com efeito ex nunc, isto é, a partir do trânsito em julgado da sentença.

Hipóteses de nulidade relativa:
  • Contrato celebrado por relativamente incapaz sem assistência;
  • Erro, dolo, coação, lesão, estado de perigo e fraude contra credores;
  • Nulidade textual (em que a lei diz textualmente "é anulável");
  • Quando a formalidade violada não é de ordem pública, mas de interesse particular.

2.3) Conversão do Contrato

É a transformação do contrato nulo em outro válido (princípio da preservação dos negócios jurídicos). Requisitos:
  • Que o contrato nulo preencha os requisitos formais de um outro contrato válido (requisito objetivo);
  • Que a intenção real das partes seja realmente a de celebrar este outro contrato (requisito subjetivo);
  • Ex.: venda de uma casa por R$1,00 por escritura pública: como venda é nula, pois o preço é fictício, mas converte-se em doação. Venda de bem superior a 30 salários mínimos por escritura particular: como venda é nula, pois se exige escritura pública, mas converte-se em compromisso de compra e venda, que admite a escritura particular.

3) Resolução

É a extinção do contrato em razão da inadimplência, isto é, do descumprimento do contrato. A resolução pode ser por inexecução voluntária ou fortuita, ou ainda por onerosidade excessiva.

3.1) Resolução por Inexecução Voluntária

É a que decorre do inadimplemento doloso ou culposo. Em todo contrato bilateral, está implícita a cláusula resolutiva tácita, que é a possibilidade de se extinguir o contrato se houver inadimplência voluntária. O código exige que antes de se mover a ação de extinção do contrato por resolução, o contratante notifique judicialmente a outra parte. Sem esta notificação prévia, o processo deve ser extinto sem resolução do mérito, mas o STJ tem aplicado o princípio da economia processual, e manda o processo prosseguir, pois a citação também serve para constituir o devedor em mora.

Vale lembrar que o contratante, caso queira, ao invés de extinguir o contrato, tem a opção de mover a ação para exigir o cumprimento do contrato, além das perdas e danos.
  • Inadimplemento antecipado: é o fato de um dos contratantes revelar de antemão a intenção de não cumprir o contrato, ou então quando se comprova que ele não terá condições financeiras ou técnicas para cumprir a obrigação. É causa de extinção do contrato cumulada com perdas e danos.
  • Diferença entre anulação e resolução voluntária: a causa de anulação é anterior ou concomitante ao nascimento do contrato. A causa da resolução voluntária, que é o inadimplemento, é posterior ao nascimento do contrato. Contratante que alienou bem a terceiro sem saber da causa da anulação pode pleitear a anulação, devolvendo um bem equivalente - art. 182 (ex.: dinheiro). Se ele sabia da causa da anulação quando alienou, o negócio torna-se válido pela ratificação tácita. O contratante que aliena um bem a terceiro não pode pleitear a resolução contratual, pois na resolução ele terá que devolver o próprio bem, e não o equivalente. Na resolução, o contrato é extinto desde o nascimento (efeito ex tunc), salvo contratos de execução continuada cuja resolução será ex nunc. Na anulação, há polêmica se o efeito é ex tunc ou ex nunc.

3.2) Resolução por Inexecução Fortuita ou Involuntária

É a extinção do contrato em razão de caso fortuito ou força maior. A sentença será meramente declaratória, pois a extinção ocorre automaticamente com o acontecimento fortuito. A sentença apenas reconhece uma extinção que já existia; logo, ela retroage à data do acontecimento fortuito.

O caso fortuito ou força maior pode gerar:

a) Extinção do contrato: quando impossibilitar, de forma total e definitiva, o cumprimento das obrigações (ex.: raio destrói, antes da tradição, carro que A vendeu pra B);

b) Suspensão do contrato: quando impossibilitar transitoriamente o cumprimento das obrigações (ex.: enchente impede que A leve o bem a B);

c) Extinção do contrato ou abatimento do preço, conforme vontade do contratante: quando apenas gerar a deterioração do bem, isto é, a danificação parcial - art. 235.


3.3) Resolução por Onerosidade Excessiva

É a extinção do contrato em razão de um fato superveniente, extraordinário e imprevisível que onerou excessivamente um dos contratantes, beneficiando exageradamente o outro (ex.: B vendeu café para entregar em 90 dias a R$100 a saca; um mês depois, em razão de guerra, o preço da saca subiu para R$1.000; logo, B pode pleitear a extinção do contrato). É a chamada teoria da imprevisão.

Em todo contrato bilateral encontra-se implícita a cláusula rebus sic stantibus, isto é, os contratos devem ser cumpridos enquanto a situação permanecer a mesma. Esta cláusula, criada na Idade Média por Neratius, inspirou a teoria da imprevisão, criada no Brasil por Arnoldo Medeiros da Fonseca após a 1ª Guerra Mundial. Não era prevista no CC de 1916, mas desde a década de 30 é adotada no STF. Atualmente, é prevista no CC de 2002.

Esta teoria permite que o contratante pleiteie a resolução ou revisão judicial dos contratos de vigência sucessiva ou diferida em razão de um fato superveniente extraordinário e imprevisível que o tenha onerado excessivamente, dificultando o cumprimento do negócio. A resolução é a extinção do contrato, e a revisão judicial é o fato de o Juiz, na sentença, modificar as cláusulas contratuais, preservando-se o contrato.
  • Diferença entre teoria da imprevisão e caso fortuito ou força maior: ambos envolvem um acontecimento extraordinário, superveniente, geralmente imprevisível. O caso fortuito ou força maior torna impossível o cumprimento do contrato, que por isso e automaticamente extinto desde o acontecimento fortuito, não havendo sequer opção de se rever judicialmente o contrato. Este acontecimento pode ser geral (ex.: guerra, terremoto) ou pessoal (ex.: doença). Já a teoria da imprevisão é para acontecimentos de índole geral, e não pessoais, que dificultam o cumprimento do contrato, mas não tornam impossível este cumprimento, tanto que é possível a revisão judicial, e a eventual extinção do contrato será a partir da citação - art. 478.
  • Diferença entre teoria da imprevisão e teoria da base objetiva do negócio jurídico: ambas são baseadas na cláusula rebus sic stantibus. A teoria da base objetiva do negócio é adotada no CDC, permitindo que o consumidor reveja judicialmente o contrato se surgir um fato superveniente e extraordinário, previsível ou imprevisível, que o onere excessivamente, mas não dá ao consumidor a opção da resolução do contrato. Já a teoria da imprevisão exige que o fato superveniente gerador da onerosidade excessiva seja extraordinário e imprevisível, conferido, em regra, ao lesado, a opção da resolução ou da revisão judicial. Nada obsta que o consumidor, em vez de invocar a teoria da base objetiva, invoque a teoria da imprevisão, caso em que terá também que provar que o fato era imprevisível.
  • Já a teoria da pressuposição, que não é adotada, permite a resolução do contrato com base na cláusula rebus sic stantibus pelo simples fato de se alterar radicalmente a situação contratual (deve preencher outros requisitos acima mencionados).

3.3.1) Requisitos da Teoria da Imprevisão

São cumulativos.

a) Vigência de um contrato bilateral, de execução continuada ou de execução diferida futura;
  • Contrato de execução continuada é o que envolve prestações periódicas;
  • Contrato de execução futura diferida é aquele em que as prestações são cumpridas posteriormente, e não instantaneamente (ex.: mercadoria deve ser entregue em 90 dias). Esta teoria não se aplica aos contratos bilaterais de execução instantânea, isto é, que devem ser cumpridos imediatamente.
b) Que o contrato seja bilateral e comutativo. Esta teoria não se aplica a contratos gratuitos e nem aos unilaterais;
  • A tendência doutrinária é admitir esta teoria aos contratos onerosos, ainda que unilaterais, como é o caso do mútuo feneratício (mútuo com juros);
  • Em regra, não se aplica esta teoria a contratos aleatórios, isto é, de risco, salvo se o fato novo atingir aspectos estranhos ao risco normal daquele contrato, isto é, atingir aspectos que nada tinha a ver com o risco.
c) Fato superveniente, isto é, surgido após o contrato. Se já existia desde a época do contrato, não cabe esta teoria;

d) Fato extraordinário, isto é, anormal, não rotineiro, difícil de acontecer;

e) Fato imprevisível. O critério é o homem médio da sociedade. Se era previsível para o homem médio, não cabe esta teoria.
  • Se o fato em si é ordinário ou previsível, mas suas consequências são extraordinárias e imprevisíveis, cabe a teoria da imprevisão - Enunciados nº 17 e 175 do CJF:
    17 - Art. 317: A interpretação da expressão “motivos imprevisíveis” constante do art. 317 do novo Código Civil deve abarcar tanto causas de desproporção não previsíveis como também causas previsíveis, mas de resultados imprevisíveis. 
    175 – Art. 478: A menção à imprevisibilidade e à extraordinariedade, insertas no art. 478 do Código Civil, deve ser interpretada não somente em relação ao fato que gere o desequilíbrio, mas também em relação às conseqüências que ele produz.
f) Alteração radical da situação fática existente ao tempo do contrato;

g) Onerosidade excessiva para um dos contratantes: é a quebra do sinalagma, isto é, do equilíbrio contratual;

h) Benefício exagerado para o outro contratante: este requisito está no CC, mas a doutrina o considera secundário;

i) Nexo causal entre o fato novo e a onerosidade excessiva;

j) Ausência de mora: Silvio Venosa, com base no Código Português, inclui mais um requisito: a ausência de mora, dizendo que o devedor em mora responde até por caso fortuito ou força maior - art. 399; logo, como maior razão, se o fato novo surgir durante a mora, ele não poderá invocar a teoria da imprevisão, salvo se ele provar que a onerosidade excessiva ocorreria da mesma forma, ainda que ele não estivesse em mora.
  • É válida a cláusula contratual de renúncia prévia ao direito de alegar a teoria da imprevisão? Em regra não, pois viola a ampla defesa, o direito de ação e a função social do contrato. Todavia, a cláusula será válida se especificar o fato superveniente, caso em que ele se torna previsível.

3.3.2) Efeitos da Teoria da Imprevisão

a) Se o fato novo surge quando nenhuma das partes ainda havia cumprido as obrigações, a parte lesada só tem a opção de pedir a resolução, isto é, a extinção do contrato, mas a outra parte, que figura como réu no processo de resolução, pode pedir a revisão judicial do contrato. Este pedido, para uns, pode ser feito na contestação, enquanto outros sustentam que só pode ser feito em reconvenção;

b) Se a parte beneficiada já tinha cumprido suas obrigações, e a parte lesada ainda não, a parte lesada pode pleitear tanto a resolução quanto a revisão judicial do contrato;

c) Pleiteado por uma parte a resolução e por outra a revisão, o Juiz dará prioridade à revisão, por força do princípio da preservação dos contratos.


4) Resilição

É a extinção do contrato por acordo entre as partes, ou por manifestação da vontade de uma delas (lembrando que a resolução é a extinção pela inadimplência, pelo descumprimento do contrato).

A resilição, seja unilateral ou bilateral, tem efeito ex nunc, isto é, o contrato é extinto a partir da resilição, e para resilir contrato nunca é necessária decisão judicial. A resolução depende de ação judicial, e tem efeito ex tunc.


4.1) Resilição Bilateral, ou Distrato, ou Retrato

É a extinção de um contrato por acordo entre as partes. Qualquer contrato, seja por tempo determinado ou indeterminado, pode ser objeto de distrato. A forma do distrato é a mesma que a lei exige para o contrato, e não necessariamente a mesma forma que as partes adotaram para o contrato (ex.: locação pode ser verbal); se as partes celebraram por escrito, o distrato pode ser verbal ou tácito (ex.: entrega da chave; compromisso de compra e venda pode ser por instrumento particular, se as partes negociaram por escritura pública, ainda assim o distrato pode ser por instrumento particular; venda de imóvel acima de 30 SM exige escritura pública, e o distrato tem que ser por escritura pública).
  • A vende para B uma casa; o pagamento é efetuado e a escritura pública é lavrada. No dia seguinte, eles se arrependem e resolvem lavrar uma escritura pública de distrato. O procedimento não está correto, pois só se distrata contrato vigente, isto é, quando ainda restam obrigações a serem cumpridas (ex.: todas obrigações já tinham sido cumpridas, isto é, o contrato já estava extinto). Logo, o que as partes rotularam de distrato é uma nova compra e venda invertida. Consequências:
  • Compra e venda incide ITBI; distrato não; 
  • Compra e venda gera novo registro; distrato gera uma averbação cancelando o registro anterior.

4.2) Resilição Unilateral

É a extinção do contrato por manifestação de vontade de uma das partes. Portanto, para extinguir o contrato, basta uma notificação (também chamada de denúncia), que em regra é vazia, livre, não precisa fundamentar.

A denúncia cheia, ou motivada, ou fundamentada, só é exigida nos casos expressos em lei ou no contrato (ex.: demissão de empregado por justa causa)


A resilição unilateral só é possível nas seguintes hipóteses:

a) Contrato por tempo indeterminado: o efeito da extinção é quando a outra parte recebe a notificação, mas no comodato, se a parte tinha feito investimentos consideráveis, após ser notificada, ela pode continuar por um tempo que seja compatível com a natureza desses investimentos;
  • O contrato por tempo determinado não pode ser extinto por resilição unilateral, salvo em caso de alienação do bem locado, caso em que o adquirente do imóvel pode resilir, isto é, extinguir a locação por simples notificação - Lei de Locações, art. 8º. Se, porém, o contrato de locação tinha cláusula expressa de vigência em caso de alienação, e ainda estava averbado no registro de imóveis, o adquirente do imóvel terá que cumprir o contrato, e não poderá resili-lo unilateralmente.

b) Direito de arrependimento: desistência unilateral do contrato só possível quando a lei ou o próprio contrato autorizar (ex.: consumidor que compra fora do estabelecimento tem 7 dias para se arrepender; contrato com arras penitenciais, isto é, que permitem o arrependimento). Para MHD, é possível arrependimento em contrato solene antes de assiná-lo. Silvio Venosa discorda, pois o CC não prevê expressamente essa hipótese; logo, caberia ação para exigir a celebração do contrato;

c) Contrato de confiança: tal como o mandato, em que o mandatário pode renunciar a qualquer tempo, bem como o mandante pode revogar a procuração a qualquer tempo.


5) Morte em Contratos Personalíssimos

A morte só extingue contratos personalíssimos. Quanto aos demais contratos, devem ser cumpridos pelos sucessores.


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