Licitações
1) Conceito
Licitação é o procedimento administrativo mediante o qual a Administração Pública seleciona a proposta mais vantajosa para a celebração de contrato, assegurada a igualdade entre os participantes do certame, promovendo o desenvolvimento nacional sustentável.
1.1) Objetivos da Licitação
Na redação original da Lei nº 8.666/93, a licitação destinava-se ao duplo objetivo de selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração Pública e de garantir o princípio constitucional da isonomia. A partir da Lei 12.349/10, um terceiro objetivo foi acrescido à licitação, qual seja o de promover o desenvolvimento nacional sustentável.
1.2) Pessoas Obrigadas a Licitar
Estão obrigadas a licitar as pessoas políticas (União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios), as autarquias, as fundações públicas e as empresas estatais (empresas públicas e sociedades de economia mista) e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.
O parágrafo único do art. 1º da Lei ainda acrescenta os fundos especiais entre os obrigados a licitar. Todavia, como bem esclarece Celso Antônio Bandeira de Mello, “estes fundos estão mencionados superabundantemente, pois são órgãos da Administração direta. Se não o fossem, seriam fundações governamentais”.
2) Disposições Legais Aplicáveis
A CF/88, art. 37, inciso XXI, estabelece que a Administração direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, devem realizar licitação para posterior contratação de obras, serviços, compras e alienações, ressalvados os casos especificados na legislação.
O art. 22, XXVII, prescreve competir à União estabelecer normas gerais a respeito de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1º, III.
O art. 173, § 1º, III, por sua vez, estatui que a lei disporá sobre a licitação para as empresas públicas, as sociedades de economia mista e suas subsidiárias, observados os princípios da Administração Pública.
No entanto, até que a lei referida no artigo 173, § 1º, III, seja editada, continua-se a aplicar a legislação infraconstitucional existente.
Para Celso Antônio Bandeira de Mello, a lei que vier a regular o disposto no artigo em apreço somente será aplicada às empresas públicas e sociedades de economia mista que explorem a atividade econômica, enquanto as demais estatais, prestadoras de serviço público, continuarão a serem regidas pela Lei nº 8.666/93.
O autor ressalva que as estatais exploradoras da atividade econômica não são obrigadas a licitar se o procedimento da licitação inviabilizar o atendimento dos fins para os quais foram criadas, já que “quem quer os fins, não pode negar os meios”. Fora dessa hipótese, a licitação é exigível.
A Lei nº 8.666/93, que sofreu inúmeras alterações por leis supervenientes, regulamenta a CF/88, art. 37, XXI, da Constituição Federal, instituindo normas gerais para licitação e contratação.
A competência da União para instituir normas gerais acerca de licitação e contratação (art. 22, XXVII - competência privativa) não exclui a competência das demais pessoas políticas para editar normas específicas sobre a matéria. A dificuldade está, como adiante será referido, em estabelecer a diferença entre normas gerais e normas específicas.
Existe, ainda, a Lei nº 10.520/02, que instituiu a modalidade de licitação denominada pregão, no âmbito de todas as pessoas políticas.
Para as concessões e permissões de serviços públicos, a principal é a Lei nº 8.987/95, com aplicação subsidiária da Lei 8.666/93, conforme dispõe o art. 18, caput.
Também merece destaque a Lei nº 12.232/10, que institui normas gerais sobre licitação e contratação para os serviços de publicidade, destacando-se que os tipos de licitação serão, obrigatoriamente, melhor técnica ou técnica e preço.
Recentemente, foi editada a Lei nº 12.462/11, que instituiu o Regime Diferenciado de Contratação - RDC, para as licitações e contratações necessárias à realização dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, da Copa das Confederações da Fifa de 2013, da Copa do Mundo Fifa 2014 e das obras de infraestrutura e de contratação de serviços para os aeroportos das capitais dos Estados da Federação distantes até 350 Km das cidades sedes dos mundiais referidos. Embora editada para ter vigência temporária, a lei já foi alterada por outras quatro novas leis, a fim de instituir o mesmo regime para:
- Ações integrantes do Programa de Aceleração de Crescimento (PAC) - Lei nº 12.688/12;
- Realização de obras e serviços de engenharia no âmbito dos sistemas públicos de ensino - Lei nº 12.722/12;
- Realização de obras e serviços de engenharia no âmbito do SUS - Lei nº 12.745/12; e
- Construção, ampliação e reforma de estabelecimentos penais e unidades de atendimento socioeducativo - Lei nº 12.980/14.
4) Normas Gerais
São gerais, em matéria de licitação, as normas que:
a) Definem a obrigatoriedade da licitação;
b) Enunciam os princípios da licitação ou definem os direitos deles decorrentes;
c) Definem as modalidades de licitação.
- Fora do âmbito das normas gerais, de competência da União, todas as pessoas políticas poderão dispor sobre normas específicas a respeito de licitação e contratação.
5) Princípios da Licitação
O artigo 3º da Lei nº 8.666/93 enumera, de modo exemplificativo, os seguintes princípios da licitação: legalidade, impessoalidade, moralidade, igualdade, publicidade, probidade administrativa, vinculação ao instrumento convocatório e julgamento objetivo.
A doutrina acrescenta outros princípios, tais como: o procedimento formal, o sigilo na apresentação das propostas, a adjudicação compulsória ao vencedor e o princípio da ampla defesa.
5.1) Legalidade e Procedimento Formal
A Administração Pública deve obediência às leis que regem a licitação, a eventuais regulamentos existentes e também ao instrumento convocatório (Edital), erigido à categoria de lei interna da licitação.
A observância da legalidade dar-se-á pela observância do procedimento formal, dispondo o artigo 4º da Lei nº 8.666/93 que “todos quantos participem de licitação promovida por órgãos ou entidades a que se refere o art. 1º têm direito público subjetivo à fiel observância do pertinente procedimento estabelecido nesta Lei”.
Adverte Hely Lopes Meirelles que procedimento formal não deve ser confundido com formalismo, caracterizado por exigências inúteis e desnecessárias, de tal sorte que não se anula o procedimento diante de meras omissões ou irregularidades formais na documentação ou nas propostas desde que, por sua irrelevância, não causem prejuízo à Administração ou aos licitantes”.
5.2) Impessoalidade
A impessoalidade está intimamente relacionada com a igualdade e com o julgamento objetivo. Significa que os licitantes devem ser tratados de maneira igualitária, sem favoritismos ou discriminações indevidas. Tanto é assim que no julgamento das propostas não é possível levar em consideração vantagem oferecida pelo licitante e não prevista expressamente na lei ou no instrumento convocatório.
5.3) Moralidade e Probidade Administrativa
A moralidade impõe atuação honesta, ética, de boa-fé, tanto por parte da Administração Pública quanto dos licitantes durante todo o procedimento licitatório.
Para a Administração Pública, a observância da moralidade ainda é reiterada na menção à probidade administrativa. É sabido que a probidade administrativa foi erigida à categoria de mandamento constitucional, dispondo o artigo 37, § 4º, da CF, que “os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível”.
5.4) Igualdade
Pelo princípio da igualdade, veda-se à Administração tratar os licitantes de maneira diferenciada, favorecendo alguns em detrimento de outros.
A CF/88, art. 37, XXI, assegura a igualdade entre todos os participantes da licitação, como também o faz o artigo 3º, caput e § 1º, da Lei nº 8.666/93.
O caput do artigo 3º, da Lei 8.666/93, garante a observância do princípio constitucional da isonomia e ainda se refere a outros princípios, entre eles o da igualdade.
O inciso I, do § 1º do artigo em apreço, veda aos agentes públicos admitir, prever, incluir ou tolerar, nos atos de convocação, cláusulas ou condições que comprometam, restrinjam ou frustrem o seu caráter competitivo, inclusive nos casos de sociedades cooperativas, e estabeleçam preferências ou distinções em razão da naturalidade, da sede ou domicílio dos licitantes ou de qualquer outra circunstância impertinente ou irrelevante para o específico objeto do contrato, ressalvado o disposto nos parágrafos 5º a 12 deste artigo e no art. 3º da Lei nº 8.248/91.
O inciso II, do mesmo parágrafo, veda aos agentes públicos estabelecer tratamento diferenciado de natureza comercial, legal, trabalhista, previdenciária ou qualquer outra, entre empresas brasileiras e estrangeiras, inclusive no que se refere a moeda, modalidade e local de pagamentos, mesmo quando envolvidos financiamentos de agências internacionais, ressalvado o disposto no parágrafo seguinte e no artigo 3º da Lei 8.248/91.
Há autores que destacam nos incisos I e II do citado artigo 1º da Lei 8.666/93 outro princípio, o da competitividade. É o caso de Toshio Mukai e de Maria Sylvia Zanella Di Pietro, esta quando analisa apenas o inciso I.
5.5) Publicidade
A publicidade impõe à Administração Pública que divulgue o procedimento licitatório para conhecimento de interessados, bem como assegura o conhecimento, a qualquer interessado, de todos os atos praticados no decorrer do procedimento.
O artigo 3º, § 3º, da Lei nº 8.666/93, assim dispõe a respeito da publicidade: a licitação não será sigilosa, sendo públicos e acessíveis ao público os atos de seu procedimento, salvo quanto ao conteúdo das propostas, até a respectiva abertura.
O artigo 4º da mesma lei também assegura a publicidade ao permitir a qualquer cidadão acompanhar o desenvolvimento da licitação, desde que não interfira de modo a perturbar ou impedir a realização dos trabalhos.
- Outros dispositivos ainda garantem a observância do princípio da publicidade, são os artigos: 15, §§ 2º e 6º; 16; 21; 34, § 1º; 39; 41, § 1º; 43, § 1º; 53, § 4º; 113, § 1º.
5.6) Vinculação ao Instrumento Convocatório
Os instrumentos convocatórios são o Edital e a carta-convite; esta última refere-se ao convite, enquanto que a primeira diz respeito a todas as demais modalidades.
O instrumento convocatório é “lei interna da licitação”, devendo ser observado tanto pela Administração Pública, quanto pelos interessados em participar da licitação.
Desse princípio tratam os artigos 3º e 41, da Lei nº 8.666/93. O segundo artigo estabelece que a Administração Pública não pode descumprir as regras e condições do edital, ao qual se acha estritamente vinculada.
Marçal Justen Filho comenta a respeito: “o instrumento convocatório (seja edital, seja convite) cristaliza a competência discricionária da Administração, que se vincula a seus termos”.
5.7) Sigilo na Apresentação das Propostas
Consagrado implicitamente pelo artigo 3º, § 3º, da Lei nº 8.666/93, que ressalva a publicidade quanto às propostas, até sua abertura, visa impedir que um licitante fique em situação de vantagem perante os demais por conhecer uma ou mais de uma proposta de seus concorrentes.
O sigilo também se impõe para a Administração Pública, a fim de que se impeça qualquer tentativa de favorecimento a licitante.
Caso o sigilo seja quebrado, a licitação deve ser anulada, sem prejuízo de eventuais sanções de caráter penal, civil e administrativo.
5.8) Julgamento Objetivo
O princípio está consagrado nos artigos 44 e 45 da Lei nº 8.666/93.
O artigo 44, caput, assim dispõe: No julgamento das propostas, a comissão levará em consideração os critérios objetivos definidos no edital ou convite, os quais não devem contrariar as normas e princípios estabelecidos por esta Lei.
O artigo 45, caput, por sua vez, prescreve: O julgamento das propostas será objetivo, devendo a Comissão de licitação ou o responsável pelo convite realizá-lo em conformidade com os tipos de licitação, os critérios previamente estabelecidos no ato convocatório e de acordo com os fatores exclusivamente referidos, de maneira a possibilitar sua aferição pelos licitantes e pelos órgãos de controle.
O que se pretende é reduzir ao máximo o julgamento da licitação por critério subjetivo, pautando-se a comissão de licitação pelos critérios previamente fixados no edital ou na carta-convite.
Visando ao julgamento objetivo, o instrumento convocatório deverá dizer quais os critérios de julgamento e o tipo de licitação. São os seguintes os tipos de licitação para todas as modalidades, exceto concurso e pregão: menor preço, melhor técnica, técnica e preço ou maior lance ou oferta.
O Regime Diferenciado de Contratação possui critérios próprios de julgamento, abordados mais adiante.
5.9) Adjudicação Compulsória
Concluído o julgamento da licitação, seu objeto deve ser atribuído ao primeiro classificado. A isso se dá o nome de adjudicação compulsória.
A adjudicação compulsória do objeto da licitação ao primeiro classificado no procedimento licitatório impede que a Administração Pública contrate outro que não o licitante vencedor.
5.10) Ampla Defesa
Princípio pouco mencionado em licitação é o da ampla defesa, ao qual poderíamos acrescentar o princípio do contraditório.
Segundo o disposto no artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal, em qualquer tipo de processo administrativo que haja litígio, devem ser observados a ampla defesa e o contraditório, com os meios e recursos a eles inerentes.
Os princípios citados devem ser observados para a aplicação de penalidades administrativas, conforme artigo 87 da Lei nº 8.666/93.
O § 3º do artigo 49 igualmente determina a observância do contraditório e da ampla defesa na hipótese de desfazimento da licitação em decorrência da anulação ou da revogação do procedimento.
6) Obrigatoriedade de Licitação
A licitação é obrigatória, segundo a Constituição Federal, para os contratos de obras, serviços, compras, alienações, concessão e permissão de serviços públicos (artigos 37, XXI e 175).
O artigo 2º da Lei nº 8.666/93 impõe a licitação para as obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações, concessões, permissões e locações.
A realização de licitação prévia à contratação é, portanto, a regra.
Excepcionalmente, a licitação não será realizada, por não ser obrigatória; isso ocorre nos casos de inexigibilidade e dispensa de licitação.
6.1) Inexigibilidade de Licitação
Para diferenciar a dispensa da inexigibilidade de licitação, deve ser indagado se há ou não possibilidade de competição.
- Há inexigibilidade de licitação sempre que há impossibilidade de competição, seja em razão da singularidade do objeto pretendido pela Administração Pública, seja em decorrência da singularidade do sujeito a ser contratado;
- Há dispensa de licitação nos casos em que, embora possível a competição entre interessados em contratar com a Administração Pública, a lei autoriza a não realização da licitação.
Tanto na hipótese de inexigibilidade de licitação, quanto na de dispensa, a contratação feita pela Administração Pública será direta, ou seja, sem prévio procedimento licitatório.
A licitação é inexigível se houver inviabilidade de competição. A inviabilidade de competição existe em duas hipóteses:
a) Em razão da singularidade do objeto: só existe um objeto pretendido pela Administração Púbica, daí porque a competição é inviável (ex: um selo único; a espada que D. Pedro I proclamou a Independência; uma obra de Picasso);
b) Em razão da singularidade do sujeito: embora possam existir vários objetos pretendidos pela Administração Pública, só existe um ofertante. Nossa legislação a isso denomina produtor ou fornecedor exclusivo (ex.: detentor de patente; fornecedor exclusivo; profissional de notória especialização; artista).
- O artigo 25 da Lei 8.666/93 enumera casos em que a licitação é inexigível, embora tal rol não seja exaustivo ou taxativo, mas simplesmente exemplificativo.
6.2) Dispensa de Licitação
A dispensa de licitação se biparte em: licitação dispensada e licitação dispensável.
6.2.1) Licitação Dispensada
É aquela declarada como tal pela própria lei, está contida no artigo 17, I e II.
O inciso I trata da alienação de bens imóveis, enquanto que o inciso II cuida da alienação de bens móveis (ex.: é dispensada a licitação para dação de bem imóvel em pagamento; é dispensada a licitação para venda de bens produzidos ou comercializados por órgãos ou entidades da Administração Pública em virtude de suas finalidades).
6.2.2) Licitação Dispensável
É aquela que a Administração Pública pode deixar de fazer, segundo um juízo discricionário. Os casos estão enumerados no artigo 24, segundo quatro critérios:
a) Em razão do pequeno valor;
- Exemplo de licitação dispensável em razão do pequeno valor é o que consta do inciso I, para obras e serviços de engenharia de valor até 10% do limite previsto na alínea a do inciso I do artigo 23, com ressalvas constantes no mesmo inciso.
b) Em razão de situações excepcionais;
- Exemplo de licitação dispensável em razão de situações excepcionais é o que consta do inciso III, nos casos de guerra ou grave perturbação da ordem.
c) Em razão do objeto;
- Exemplo de licitação dispensável em razão do objeto é o que está no inciso XII, para compra de hortifrutigranjeiros, pão e outros gêneros perecíveis, no tempo necessário para a realização dos procedimentos licitatórios correspondentes, realizadas diretamente com base no preço do dia.
d) Em razão da pessoa.
- Exemplo de licitação dispensável em razão da pessoa é o que está no inciso XXII, para contratação de fornecimento ou suprimento de energia elétrica e gás natural com concessionário, permissionário ou autorizado, segundo as normas da legislação específica.
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