sexta-feira, 10 de outubro de 2014

05 - Direito Civil 3 - Sucessões - Testamentária


Sucessão Testamentária

1) Do Testamento

Testamento é o ato pelo qual alguém dispõe de seus bens para depois de sua morte, ou determina a própria vontade sobre certas situações de ordem estritamente moral ou pessoal (ex.: reconhecimento de filho, nomeação de tutor aos filhos, etc.).

1.1) Características do Testamento

a) É ato unilateral, porque se aperfeiçoa com uma só vontade, a do testador;

b) É ato gratuito, porque em regra implica a transferência de bens ou outro tipo de disposição sem que haja qualquer contraprestação;
  • Excepcionalmente, há o testamento com encargo, que acaba onerando o beneficiado.
c) É ato unipessoal, porque não pode ser feito em conjunto. O Código Civil proíbe o testamento conjuntivo, também chamado de testamento de mão comum - art. 1.863;

d) É ato solene, porque deve observar a forma prescrita em lei;

e) É ato revogável, reputando-se nula a cláusula de irrevogabilidade porventura constante no testamento. No entanto, duas cláusulas contidas no testamento são irrevogáveis:
  • A que reconhece filho;
  • A que perdoa o indigno.
  • Nada impede, no entanto, que sejam anuladas se decorrentes de erro, dolo ou coação.
f) É ato causa mortis, porque só produz efeitos após a morte do testador;
  • O CC proíbe a doação causa mortis. Portanto, a disposição de bens para depois da morte só deve ser feita por meio de testamento.
g) É ato personalíssimo, não se admitindo testamento por procuração.


1.2) Capacidade Testamentária Ativa - art. 1.860

De acordo com o dispositivo, NÃO podem testar:

a) Os menores de 16 anos, ainda que emancipados;

b) Os enfermos mentais e os deficientes mentais sem discernimento - art. 3º, ou com discernimento reduzido - art. 4º;

c) Os que, mesmo por causa transitória, não possam exprimir sua vontade;

d) Os ébrios habituais e os viciados em tóxicos que tenham o discernimento reduzido;

e) Os excepcionais sem desenvolvimento completo;

f) Qualquer pessoa que no ato de testar não tenha pleno discernimento - art. 1.860 (ex.: sob violenta emoção).
  • Quanto ao pródigo, em se tratando de disposições de caráter pessoal, pode testar. Questão polêmica diz respeito às disposições de caráter patrimonial, e duas são as posições:
  • Uma primeira, fazendo uma interpretação literal do art. 4º, diz que não pode; 
  • Já outra posição afirma que pode sim, por força do art. 1.782, que elenca os atos em que o pródigo está proibido de praticar, e entre eles não consta o de testar.
  • O Código admite o testamento feito pelo cego e pelo analfabeto. Idade avançada e proximidade com a morte não anulam o testamento, salvo se houver falta de discernimento;
  • Quanto ao surdo-mudo, só pode testar pela forma cerrada - art. 1.868, desde que tenha desenvolvimento mental completo; 
  • Nos termos do art. 1.861, a capacidade para testar deve existir  ao tempo da facção do testamento.

2) Tipos de Testamento

2.1) Testamentos Ordinários ou Comuns

a) Público - arts. 1.864 a 1.867: é aquele ditado, de viva voz, ao tabelião;
  • Exige a presença de 2 testemunhas;
  • Deverá ser reduzido a escrito no livro de notas;
  • As declarações deverão ser feitas em língua nacional;
  • O testamento do surdo analfabeto exige uma terceira testemunha. É a denominada testemunha suplementar - art. 1.866;
  • O mudo e o surdo-mudo não podem testar por esta forma;
  • O cego somente pode testar por esta forma;
  • A desvantagem do testamento público é o fato de que pode ser do conhecimento de todos. Em contrapartida, tem a segurança como sua grande vantagem.

b) Cerrado, secreto ou místico - arts. 1.868 a 1.875: é elaborado em duas fases, quais sejam, a da facção da cédula e a do auto de aprovação;
  • É feito pelo próprio testador ou por alguém a rogo deste;
  • O próprio testador deverá entregá-lo ao tabelião, fechado, diante de duas testemunhas. O tabelião deverá providenciar o auto de aprovação que por ele será lido na presença de todos. O conteúdo do testamento é secreto, pois o que é lido pelo tabelião é apenas o auto de aprovação;
  • O que é reduzido a escrito no livro de notas é o auto de aprovação;
  • O surdo-mudo pode testar por esta forma, desde que o escreva;
  • É aberto pelo Juiz.
  • A vantagem deste testamento é o fato de ser o seu conteúdo secreto. A desvantagem diz respeito à segurança, pois em havendo perda, destruição, etc., dar-se-á a nulidade ou inexistência do testamento.

c) Particular - arts. 1.876 a 1.880: o testamento particular pode ser ológrafo (se feito e assinado pelo próprio testador) ou alógrafo, quando escrito por outra pessoa a pedido do testador e assinado por este. Isto porque, no que tange a este último caso, a lei permite que o testamento seja feito por processo mecânico;
  • O testador o escreve e assina, ou então pede que terceiro o redija e depois assina, e o lê diante de três testemunhas;
  • As declarações poderão ser feitas em língua estrangeira, desde que as testemunhas a compreenda;
  • Morto o testador, as testemunhas serão chamadas em juízo para confirmarem o testamento;
  • É possível o testamento sem testemunhas, desde que na hipótese prevista no art. 1.879;
  • A vantagem do testamento particular é o fato de ser menos formal. Tem por desvantagem o fato de que pode ser revogado a qualquer tempo em razão de perda, rasura, etc.

2.2) Testamentos Extraordinários ou Especiais

Os testamentos especiais revestem-se de duas características: excepcionalidade e provisoriedade. Com efeito, somente podem ser elaborados em situações excepcionais, extraordinárias. Se feitos em situação normal haverá nulidade absoluta.

a) Marítimo: somente pode ser feito nas seguintes situações:
  • Navio em auto mar;
  • Navio ancorado ou no curso de uma viagem, mas o testador não pode desembarcar para testar pela forma ordinária. Se pode desembarcar, o testamento é nulo.
b) Aeronáutico: somente pode ser feito quando o testador estiver em viagem, a bordo de aeronave miliar ou comercial.
  • Os testamentos marítimo e aeronáuticos - arts. 1.888 a 1.892, podem ser:
  • Público: ditado ao comandante, diante de duas testemunhas; 
  • Cerrado: escrito pelo testador, ou por outrem a seu rogo, e entregue ao comandante diante de duas testemunhas. 
  • Em ambos os casos, o registro do testamento será feito no diário de bordo, além do que o testador ficará sob a guarda do comandante - art. 1.890 
c) Militar: somente pode ser feito nas seguintes situações:
  • Militar em campanha, dentro ou fora do país (e demais pessoas a serviço das forças armadas);
  • Militar em praça sitiada (ou demais pessoas a serviço das forças armadas), ou que esteja com as comunicações interrompidas;
  • O testamento militar pode ser:
  • Público: ditado ao comandante ou diretor do hospital, diante de duas testemunhas. Se o testador não souber ou não puder assinar o testamento, há a necessidade de uma terceira testemunha para assinar por ele; 
  • Cerrado: escrito de próprio punho pelo testador, o qual será apresentado, aberto ou fechado, ao oficial diante de duas testemunhas. 
  • Nuncupativo - art. 1.896: é aquele feito oralmente diante de duas testemunhas. O militar (ou demais pessoas a serviço das forças armadas) está ferido ou em combate. Se não morrer na guerra ou se convalescer do ferimento, o testamento caduca. No caso de morte, o testamento deve ser confirmado em juízo pelas testemunhas. Como esse testamento é feito oralmente, as testemunhas podem ser analfabetas.
Por outro lado os testamentos especiais são provisórios, porque caducará se o testador não morrer nos 90 dias subsequentes, após se encontrar em lugar onde podia testar pela forma ordinária. No entanto, testamento militar cerrado pode ser definitivo, desde que preencha as formalidades previstas no art. 1.894, Parágrafo único.

Não se admite qualquer outra forma de testamento, salvo na hipótese do estrangeiro que elabora o seu testamento no exterior. Neste caso, observa-se a lei do lugar da feitura do testamento, podendo este testamento ser cumprido no Brasil, ainda que tenha forma testamentária desconhecida diante das nossas leis.

De acordo com o art. 1.863, é proibido o testamento conjuntivo, seja ele simultâneo, recíproco ou correspectivo.
  • Testamento conjuntivo ou mancomunado: é aquele feito por duas pessoas num só instrumento. A lei não proíbe o testamento simultâneo, o recíproco e o correspectivo, desde que feito em documentos separados;
  • Testamentos simultâneos: são os que beneficiam uma terceira pessoa (ex.: o marido faz o seu testamento em favor de C; a mulher, por sua vez, também faz seu testamento em favor de C);
  • Testamentos recíprocos: são aqueles em que os testadores beneficiam-se mutuamente, sendo herdeiro o que sobreviver (ex.: marido faz testamento em favor da esposa; ela, por sua vez, faz testamento em favor do marido);
  • Testamentos correspectivos: são aqueles em que os testadores efetuam disposições em retribuição de outras correspondentes (ex.: B deixa, por testamento, uma casa para A em retribuição ao fato deste também ter lhe deixado, por testamento, um apartamento).

3) Das Testemunhas Testamentárias

O novo CC não contém dispositivo específico sobre as testemunhas testamentárias. Em razão disso, o assunto é disciplinado pela norma geral do art. 228. Assim, não podem ser admitidos como testemunhas:

a) Menores de 16 anos;

b) Aqueles que por enfermidade mental ou retardamento mental, não tiverem discernimento para a prática dos atos da vida civil;

c) Cegos e surdos, quando a ciência do fato que se quer provar depender dos sentidos que lhes faltam, sendo certo que esses sentidos são essenciais às testemunhas testamentárias;

d) Analfabeto, salvo no caso de testamento militar nuncupativo;

e) Herdeiro testamentário e legatário - art. 1.801, II - bem assim seu "CADI" - cônjuge, companheiro, ascendente, descende e irmão - art. 1.802, Parágrafo único.


4) Dos Codicilos - arts. 1.881 a 1.885

Codicilo é o testamento particular, ológrafo e também alógrafo, assinado pelo codicilante, dispondo sobre seu enterro, sobre esmolas de pouca monta, assim como sobre móveis, jóias e roupas de pouco valor de seu uso pessoal.
  • O codicilo ainda se presta para nomear ou substituir testamenteiros, perdoar o indigno, nomear tutor, e ainda reservar parcelas para sufrágios de sua alma - art. 1.998.
  • Segundo a doutrina, é possível também reconhecer filho por meio de codicilo, pois a lei permite o reconhecimento por meio de escrito particular.
  • O codicilo é documento autônomo, pois sua existência independe do morto ter deixado testamento - art. 1.882. Porém, consideram-se revogados os codicilos se, havendo testamento posterior, este não os confirmar ou modificar.
  • No que diz respeito ao valor da liberalidade que pode ser objeto de codicilo, tem a doutrina entendido que o melhor critério é deixar a questão para ser analisada pelo Juiz de acordo com o caso concreto.
  • Não podem ser objeto de codicilo bens imóveis. 
  • Nos termos do art. 1.885, se o codicilo estiver cerrado, deverá ser aberto do mesmo modo que o testamento cerrado (pelo Juiz);
  • Não se pode nomear nem deserdar herdeiros por meio de codicilos; 
  • O CC não prevê a "cláusula codicilar", que seria aquela segundo a qual o testamento nulo deve ser aceito ao menos como codicilo.

5) Das Disposições Testamentárias em Geral - art. 1.897 a 1.911

5.1) Da Nomeação de Herdeiro ou de Legatário sob Condição, Encargo e Termo

O art. 1.897 admite a nomeação de herdeiro ou de legatário sob condição suspensiva ou resolutiva. É nula a condição puramente potestativa, que é aquela subordinada ao arbítrio exclusivo de uma das partes (ex.: "Maria será minha herdeira se José concordar");
  • Permite também, o mesmo dispositivo, a nomeação de herdeiro ou legatário sob encargo (ex.: "Antônio será meu herdeiro, desde que construa uma escola");
  • Igualmente, referido dispositivo admite que o herdeiro ou legatário seja nomeado por certa causa (ex.: "Antônio é meu herdeiro, pois ele salvou minha vida");
  • Por outro lado, o art. 1.898 veda a nomeação de herdeiro sob termo, salvo na hipótese de fideicomisso. É possível, no entanto, nomear legatário sob termo.

5.2) Da Interpretação do Testamento - art. 1.889

De acordo com o dispositivo, na interpretação do testamento, deve prevalecer a exegese que melhor assegure a vontade do testador. 

O objeto da interpretação é o próprio testamento, sendo certo que a vontade do testador deve ser extraída diretamente do testamento, e não de elementos extrínsecos a ele, salvo na hipótese prevista no art. 1.903, ou seja, quando houver erro na designação da pessoa do herdeiro, do legatário ou da coisa legada - ver arts. 1.902 a 1.908.


5.3) Nulidade das Disposições Testamentárias - art. 1.900

São nulas as disposições testamentárias:

a) Que instituam herdeiro ou legatário sob condição captatória de que este disponha, também por testamento, em benefício do testador ou de terceiro (testamento não é ato de troca - ex.: "Antônio será meu herdeiro se ele, em seu testamento, nomear-me seu sucessor") - inciso I;

b) Que se refiram a pessoa incerta, cuja identidade não se possa averiguar - inciso II;

c) Que favoreça pessoa incerta, cometendo a determinação de sua identidade a terceiro - inciso III. Em três hipóteses, porém, é válido o testamento que beneficia pessoa incerta:
  • Quando em favor dos pobres. No silêncio do testamento, entende-se que são os pobres do lugar do domicílio do testador ao tempo de sua morte - art. 1.902;
  • Em favor de instituições de caridade. No silêncio, são as do domicílio do testador, sendo que as particulares preferirão às públicas;
  • Quando se atribuir a um terceiro a nomeação dentre duas ou mais pessoas mencionadas pelo testador, ou pertencentes a uma família ou corpo coletivo, ou estabelecimento por ele designado - art. 1.901, I.

5.4) Da Cláusula de Inalienabilidade - art. 1.911

Referido dispositivo não se confunde com a regra prevista no art. 1.848, que diz respeito à legítima. Neste caso, para que o testador possa impor sobre a legítima as mencionadas cláusulas, deverá fundamentar, e só será possível se houve justa causa. 

Já o art. 1.911 diz respeito à disponível, e sobre esta é possível a aposição das mencionadas cláusulas, sem necessidade de fundamentar em uma justa causa.

Tanto no art. 1.848 (que depende de justa causa), quanto no art. 1.911, a cláusula de inalienabilidade só pode recair sobre bens doados, deixados por testamento, e em relação ao bem de família do CC (não ao da Lei nº 8.009/90).

A cláusula de inalienabilidade pode ainda ser temporária ou então vitalícia. No silêncio, é vitalícia, ou seja, acompanhará toda a existência da pessoa beneficiada. Com a morte desta, extingue-se. Portanto, não pode ser perpétua. Seu cancelamento deve ser pleiteado judicialmente. Pode ser absoluta, quando o testador veda a alienação sem abrir qualquer exceção, ou relativa, quando ele permite a alienação a certas pessoas ou em certas condições.

Se houver cláusula de inalienabilidade, o herdeiro não poderá fazer a renúncia translativa da herança, ou seja, em favor de certa pessoa, mas apenas a renúncia pura e simples. 

A cláusula de inalienabilidade implica impenhorabilidade e incomunicabilidade - art. 1.911. Porém, a aposição apenas da incomunicabilidade, ou apenas na impenhorabilidade, ou então de ambas, não significa a aposição da inalienabilidade, pois esta não se presume, devendo constar expressamente no testamento.

A cláusula de inalienabilidade pode recair sobre qualquer bem móvel ou imóvel, inclusive dinheiro.

A inalienabilidade não atinge os credores do morto, que poderão requerer a penhora do bem. A Fazenda Pública também pode requerer a penhora do bem gravado com a cláusula de inalienabilidade ou impenhorabilidade.


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