quarta-feira, 25 de junho de 2014

13 - Direito Civil 1 - Dos Fatos Jurídicos - Prescrição e Decadência


1) Prescrição e Decadência (ou Caducidade)

1.1) Conceitos

Prescrição extintiva é a perda do direito de ação, e de toda a sua capacidade defensiva, em razão do decurso de tempo.

Com a prescrição, opera-se não só a perda do direito de ação como também a do direito de exceção - CC, art. 190. É neste aspecto, inclusive, que a prescrição se distingue da perempção que inviabiliza apenas o direito de ação, podendo a matéria ser ventilada em exceção (defesa). 

Modernamente, a prescrição vem sendo conceituada como a perda da pretensão, que consiste no poder de exigir o direito, em razão do seu não exercício no tempo. 

O fundamento da prescrição é a paz social, já que a ordem pública estaria comprometida se a ação tivesse prazo indeterminado para ser ajuizada.

A prescrição, portanto, é perda do direito de ação e demais pretensões, em razão do tempo, remanescendo, porém, intacto o direito material, tanto é que o pagamento de dívida prescrita é válido, não podendo ser objeto de restituição.

Já a decadência, por sua vez, é a perda do direito material, em razão do tempo, eliminando-se, por consequência, o direito de ação e demais pretensões.

Sobre a distinção entre prescrição e decadência, o Código adotou um critério objetivo, eliminando qualquer dúvida, enunciando taxativamente os casos de prescrição nos arts. 205 e 206, sendo de decadência todos os demais prazos previstos em imediata conexão com a disposição normativa que a estabelece.


1.2) Do Regime Jurídico Prescricional e Decadencial

Prescrição
Decadência
O prazo pode ser interrompido, suspenso e impedido - CC, art. 197 a 202
Em regra, o prazo não pode ser interrompido, suspenso e impedido  - CC, art. 207, salvo, excepcionalmente, disposição legal em contrário (ex.: art. 208, que remete ao art. 197: não correrá a decadência contra os relativamente incapazes. Outro ex.: CDC, art, 26, §2º).
Só pode ser legal.
Emana da lei, mas se o direito for disponível, pode advir da vontade da(s) parte(s).
O Juiz deve conhecer de ofício - Lei nº 11.280/06, revogou o art. 194.
O Juiz deve conhecê-la de ofício se for legal. Se for convencional, não - art. 210.
Não pode ser alterado pelas partes, nem para aumentar nem diminuir - art. 192.
Se for legal, o prazo não pode ser alterado. Se convencional, sim.
É possível a renúncia à prescrição, desde que o prazo esteja consumado e não haja prejuízo a terceiros - art. 191
Se for legal, nula será a renúncia. Se for convencional, é possível renunciá-la, estando o prazo em curso ou já consumado.

Quanto ao regime jurídico, a prescrição e a decadência distinguem-se em vários aspectos.


Com efeito, o prazo prescricional pode ser impedido, suspenso e interrompido, nas hipóteses previstas nos arts. 197 a 202 do CC. 

Quanto à decadência, dispõe o art. 207 do CC: “Salvo disposição legal em contrário, não se aplicam à decadência as normas que impedem, suspendem ou interrompem a prescrição”. 

Saliente-se, contudo, que, por força do art. 208 do CC, não corre o prazo decadencial contra os absolutamente incapazes; trata-se da única hipótese de impedimento e suspensão da decadência, prevista no Código Civil. Outro caso de suspensão da decadência verifica-se no CDC, quando se tratar de vício redibitório, pois a reclamação do consumidor suspende o prazo para a propositura das ações edilícias até a resposta do fornecedor, outrossim, a instauração do inquérito civil, nessas hipóteses, também suspende o prazo até que seja concluída a investigação.

O prazo prescricional só pode emanar da lei; o prazo decadencial advém também da lei, mas se o direito for disponível, pode ainda resultar da vontade unilateral ou bilateral. Nada obsta, por exemplo, um prazo decadencial fixado pelo testador.

O Juiz deve decretar de ofício a prescrição, por força da Lei nº 11.280/06, que revogou o CC, art. 194. Quanto à decadência, preceitua o art. 210 do CC: “Deve o juiz, de ofício, conhecer da decadência, quando estabelecida em lei”. Observe-se, contudo, que a decadência convencional, estabelecida pela vontade das partes, não deve ser decretada de ofício. 

Finalmente, os prazos prescricionais não podem ser alterados por acordo das partes - art. 192. Assim, as partes não podem ampliá-los nem suprimi-los. Em contrapartida, os prazos decadenciais, desde que o direito seja disponível, pode perfeitamente ser ampliado ou reduzido por convenção das partes.


1.3) Renúncia à Prescrição

Renúncia à prescrição é o ato pelo qual o devedor abre mão do direito de argui-la.

O Código proíbe a renúncia prévia, antecipada. Noutras palavras, não se pode renunciar a um prazo prescricional ainda em curso. Consumado, porém, esse prazo, a renúncia torna-se lícita. Assim, por exemplo, um prazo prescricional de 10 (dez) anos só poderá ser renunciado após o decurso desse decênio.

No tocante à decadência, quando o prazo é fixado em lei, é nula a renúncia, seja ela prévia ou consumada, por força do art. 209 do CC. Tratando-se, porém, da decadência convencional, a renúncia é sempre admitida, pouco importando se o prazo encontra-se em curso ou já consumado. 

A renúncia pode ser expressa ou tácita. Na primeira, o prescribente declara por escrito que não pretende argüir a prescrição; na segunda, ele pratica algum ato positivo, incompatível com o desejo de alegar a prescrição, como uma carta reconhecendo a dívida ou um pedido de parcelamento do débito.

Convém ainda esclarecer que a renúncia, além de exigir uma prescrição consumada, não pode prejudicar terceiros. Urge, portanto, que o renunciante seja solvente. Se for insolvente, a renúncia poderá ser cancelada pelos credores, através da ação pauliana.


2) Disposições Gerais

Dispõe o art. 195 do CC que: “os relativamente incapazes e as pessoas jurídicas, têm ação contra os seus assistentes ou representantes legais, que deram causa à prescrição, ou não a alegarem oportunamente”. Essa ação só pode ser movida se houver dolo ou culpa, devendo esse dispositivo ser interpretado conjuntamente com o art. 186 do CC.

Preceitua o art. 196 que: “a prescrição iniciada contra uma pessoa continua a correr contra o seu sucessor”. Assim, a morte não suspende nem interrompe a prescrição, que continua a fluir normalmente contra os herdeiros e legatários, a não ser quando presente uma das causas suspensivas, previstas nos arts. 197 e 198 do CC. A expressão “sucessor” compreende os sucessores causa mortis, isto é, herdeiros e legatários, e os sucessores inter vivos.

De acordo com o Código a prescrição deve ser invocada pela parte a quem aproveita (art. 193). Todavia, nada obsta seja arguida pelo Ministério Público, em nome do incapaz ou dos interesses que tutela. 

Como esclarece Washington de Barros Monteiro, no silêncio do Código, a melhor orientação será no sentido de admitir a alegação pelo Ministério Público, conferindo-se-lhe assim todos os meios para o bom desempenho de sua alta missão.

Por outro lado, a prescrição dos direitos principais provoca também a prescrição dos acessórios, como os juros, a cláusula penal, a hipoteca, etc., mas a prescrição dos direitos acessórios não atinge a principal.

Finalmente, de acordo com a hermenêutica, os prazos prescricionais em curso podem ser ampliados ou reduzidos por lei superveniente, cuja aplicação é imediata, porquanto a prescrição em curso não gera direito adquirido, mas apenas uma expectativa de direito. Não obstante, o art. 2.028 das Disposições Finais e Transitórias enveredou por outro caminho, salientando que: “serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada”. 

Assim, os prazos em curso, que foram reduzidos, continuam regidos pelo Código de 1916, desde que, aos 11 de janeiro de 2003, data da entrada em vigor do novo Código Civil, tenham transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada.

Os prazos em curso, que foram reduzidos, mas não tenham transcorrido mais da metade do tempo estabelecido pela lei revogada, regem-se pelo novo Código Civil. Corre-se o risco, porém, de serem imediatamente atingidos pela prescrição. Imagine-se, por exemplo, um prazo de 20 anos, que havia transcorrido apenas 9 anos, tenha sido reduzido para 4 anos. Ao entrar em vigor o novo Código estaria irremediavelmente atingido pela prescrição. Diante disso, alguns juristas sustentam que, nesse caso, o prazo reduzido só começaria a fluir a partir de 11 de janeiro de 2003, data da entrada em vigor do Código.

Em matéria de prescrição, a lei que reduz ou amplia o prazo em curso tem aplicação imediata, e talvez esta seria a a melhor exegese. Porém a Segunda Seção do STJ (que unifica entendimentos da 3ª e 4º Turmas - Direito Privado), julgou em diversos Recursos Repetitivos da seguinte maneira:
RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. DIREITO CIVIL. FINANCIAMENTO DE PLANTAS COMUNITÁRIAS DE TELEFONIA (PCTs). AÇÃO DE RESSARCIMENTO DOS VALORES PAGOS. PRESCRIÇÃO.
1. Para efeitos do art. 543-C do CPC: A pretensão de ressarcimento do valor pago pelo custeio de Plantas Comunitárias de Telefonia (PCTs), não existindo previsão contratual de reembolso pecuniário ou por ações da companhia, submete-se ao prazo de prescrição de 20 (vinte) anos, na vigência do Código Civil de 1916 (art. 177), e de 3 (três) anos, na vigência do Código Civil de 2002, por se tratar de demanda fundada em enriquecimento sem causa (art. 206, § 3º, inc. IV), observada a fórmula de transição prevista no art. 2.028 do mesmo diploma legal.
2. No caso concreto, o pagamento que se alega indevido ocorreu em novembro de 1996, data a partir da qual se iniciou o prazo prescricional, que se encerrou em janeiro de 2006 (três anos, a contar da vigência do novo Código). O autor ajuizou a ação em fevereiro de 2009, portanto sua pretensão está alcançada pela prescrição.
3. Recurso especial não provido.
(REsp 1220934/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 24/04/2013, DJe 12/06/2013)

2.1) Distinção entre Impedimento, Suspensão e Interrupção da Prescrição 

No impedimento, o prazo prescricional não chega a se iniciar. 

Na suspensão, o prazo prescricional, em curso, sofre uma parada temporária, continuando, de onde havia parado, após a cessação do obstáculo. 

Já na interrupção, o prazo prescricional, em curso, reinicia-se por inteiro, desconsiderando-se o período anteriormente transcorrido. 


2.2) Das Causas de Impedimento e Suspensão da Prescrição 

As causas de impedimento e suspensão da prescrição são as mesmas. O que as distingue é o momento em que elas ocorrem. Com efeito, haverá impedimento se o obstáculo surgir antes do início do prazo; suspensão, se surgir durante o prazo em curso. 

Questão importante é saber se essas causas são taxativas ou não e, sobre este tema duas são as posições: 

  • São taxativas sim, e não admitem o uso da analogia, pois restringem direitos; 
  • Sustentada pelo professor Serpa Lopes que entende que essas causas não são taxativas e admitem o uso da analogia, por razões de equidade, já que “contra o incapaz de agir não corre a prescrição”, como por exemplo nos casos de greve, guerra, caso fortuito e de força maior. 

Com base neste último raciocínio, alguns civilistas sustentam que durante a união estável não corre a prescrição entre os companheiros, por analogia ao art. 197, I, CC. Aliás, entendimento diverso violaria princípio constitucional que protege a entidade familiar. 

Finalmente, as causas de impedimento e suspensão da prescrição são personalíssimas, logo incomunicáveis, salvo quando a obrigação for indivisível (art. 201). Tratando-se, de obrigação solidária ou divisível, a suspensão em benefício de um dos credores não aproveitará aos outros, contra os quais a prescrição fluirá normalmente. Acrescente-se, porém, que a herança, por força de lei, é indivisível, até que sobrevenha a partilha. Portanto, se o crédito do “de cujus” acabou sendo herdado por vários herdeiros, se um deles for absolutamente incapaz, verifica-se a suspensão da prescrição em benefício dele, estendendo-se aos demais herdeiros. 


2.3) Das Causas Interruptivas da Prescrição 

2.3.1) Causas de Interrupção Processuais da Prescrição: 

a) Art. 202, I- despacho do juiz que ordena a citação do devedor. Esse dispositivo deve ser interpretado restritivamente, pois nas comarcas em que há mais de uma vara, a ação se considera proposta desde a sua distribuição, sendo essa a data que marca a interrupção da prescrição (art. 219, §1º, CPC). Portanto a orientação contida no art. 202, I, CC, só vale para as comarca s de vara única, onde não há distribuição. 

Ademais, trata-se de uma interrupção sob condição suspensiva, ou seja, só se interrompe se o réu for efetivamente citado no prazo de 100 dias (10 dias pelo art. 219,§2º do CPC; 90 dias pelo §3º do mesmo artigo). Se faltar um dia para prescrever e o autor entrar com a ação, temos: 
  • Foi feita a citação dentro do prazo de 100 dias: o efeito interruptivo da citação retroage à data do ajuizamento da ação; 
  • Só citou após os 100 dias: já prescreveu. Nesse caso, a citação não interrompe a prescrição, salvo se a demora ocorreu por culpa do judiciário, conforme súmula 106, STJ. 
  • A citação válida feita em processo depois anulado ou então extinto sem julgamento do mérito mantém o seu efeito interruptivo da prescrição, pois a propositura da ação demonstra inequivocamente que o autor não está inerte. Frise-se, ainda, que a citação deve ser válida; se for nula, não ocorrerá a interrupção da prescrição. Ressalte-se, contudo, que, nas ações movidas contra a Fazenda Pública, a citação inicial não interrompe a prescrição quando, por qualquer motivo, o processo tenha sido anulado, conforme dispõe o art. 7º do Decreto 20.910/32; 
  • Citação nula não interrompe a prescrição, ainda que ordenada por juiz competente; já a citação válida interrompe a prescrição, ainda que ordenada por juiz incompetente. 

b) Art. 202, IV, CC- apresentação do título de crédito em juízo de inventário ou em concurso de credores. A interrupção se dá com a simples apresentação, antes mesmo da decisão de habilitação e só recomeça a correr novamente a prescrição após o indeferimento da habilitação. 

Essas duas causas são processuais por que ocorrem dentro do processo, e a prescrição somente recomeça a corre após o trânsito em julgado do mesmo, conforme art. 202, parágrafo único, CC. Isso por que não há no direito processual civil prescrição intercorrente, que é aquela que corre junto com o processo, salvo uma exceção, prevista no processo de execução suspenso por falta de bens à penhora (em não se localizando bens em 05 anos, ocorrerá a prescrição). 


2.3.2) Causas Extraprocessuais de Interrupção da Prescrição: 

a) Art. 202, II, CC- protesto judicial, ainda que ordenado por juiz incompetente. Trata-se de uma simples notificação judicial (art. 867 do CPC); 

b) Art. 202, III, CC- protesto cambial dos títulos de crédito, encontrando-se cancelada a Súmula 153 do STF que dispunha em sentido contrário; 

c) Art. 202, V, CC- qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor; 

d) Art. 202, VI, CC- qualquer ato, ainda que extrajudicial, em que o devedor reconhece o direito do credor. (Ex: o envio de uma carta ao credor pedindo o parcelamento do débito). 

A prescrição interrompida por atos extraprocessuais recomeça a correr da data do ato que a interrompeu. Assim, efetuado o protesto cambial, por exemplo, a prescrição se interrompe e se inicia novamente, a partir desse protesto. 

Obs: o disposto no art. 202 “caput”, CC, no sentido de que a interrupção da prescrição somente poderá ocorrer uma vez, deve ser interpretado restritivamente, somente sendo aplicável às hipóteses dos incisos II a VI do art. 202 do CC, excluindo-se, portanto, a interrupção oriunda da citação válida, sob pena de violação do princípio da universalidade da jurisdição. 


3) Da Prescrição Superveniente 

É aquela que começa a corre após o trânsito em julgado. É a prescrição da execução e o seu prazo é o mesmo do prazo da ação de conhecimento. 

Exceção: a prescrição contra a Fazenda Pública é em regra de 05 anos. Porém, quando se interrompe a prescrição contra a Fazenda Pública o prazo se reduz de metade, caindo para 2 anos e 6 meses, conforme dispõe o art. 9º do Decreto nº 20.910/32 . 

Visando minimizar esse benefício concedido à Fazenda Pública, o STF editou a Súmula 383: “A prescrição em favor da Fazenda Pública recomeça a correr, por dois anos e meio, a partir do ato interruptivo, mas não fica reduzida aquém de 5 (cinco) anos, embora o titular do direito a interrompa durante a primeira metade do prazo”. 

Portanto, se a prescrição for interrompida na segunda metade do prazo de cinco anos, a fase de execução contra a Fazenda Pública prescreverá em dois anos e meio. Se, porém, a interrupção se der durante a primeira metade do prazo de cinco anos, a fase de execução prescreverá no prazo remanescente de cinco anos, superior, portanto, aos dois anos e meio. Se, por exemplo, no primeiro ano do prazo, o credor moveu a ação de indenização contra a Fazenda Pública, após o trânsito em julgado da sentença, ainda terá quatro anos para mover a fase de execução. 

Quanto à legitimidade para promover a interrupção da prescrição, o art. 203 do CC a confere a qualquer interessado. Exemplos: credor; credor do credor; fiador do credor etc. Por fim, a interrupção da prescrição, em regra, é incomunicável, não beneficia os outros credores, nem prejudica os demais devedores. Essa regra, porém, comporta exceções, que estão dispostas nos §§ do art. 204, CC.



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