quinta-feira, 5 de junho de 2014

10 - Direito Civil 1 - Dos Fatos Jurídicos


Dos Fatos Jurídicos

1) Fatos Jurídicos em Sentido Amplo

Compreendem os acontecimentos naturais e voluntários em virtude dos quais os direitos e as obrigações nascem, se modificam e se extinguem. Portanto, eles se subdividem em:

a) Fatos jurídicos em sentido estrito: são os acontecimentos naturais, alheios, portanto, à vontade humana, que criam, modificam ou extinguem direitos (ex.: morte natural, nascimento, maioridade, aluvião, avulsão, etc.);

b) Atos jurídicos e os negócios jurídicos: são os acontecimentos emanados da vontade lícita do homem em virtude dos quais os direitos nascem, se modificam e se extinguem (ex.: casamento, contratos, testamento, etc.);

c) Atos ilícitos: são aqueles emanados de dolo ou culpa, lesivos, portanto, aos interesses alheios (ex.: a reparação prevista para o caso de dano).

Enquanto os atos e os negócios jurídicos dizem respeito às ações humanas de efeitos voluntários, os atos ilícitos compreendem as ações humanas em que os efeitos jurídicos são involuntários, operando-se, portanto, independentemente, da vontade do agente.
Distinção entre ato e negócio jurídico:
  • Primeira corrente: distingue quanto à sua formação 
  • Ato jurídico é aquele que se forma com uma só vontade. Ele é unilateral (ex.: testamento). 
  • Negócio jurídico é aquele que se forma pelo acordo de vontades, portanto, ele é bilateral (ex.: casamento, contratos). Quanto ao reconhecimento de filhos, em se tratando de menor e incapaz é ato porque unilateral, mas se for maior e capaz, é bilateral porque depende de consentimento. 
Essa corrente, portanto, está ultrapassada; 
  • Segunda corrente: mais moderna, distingue quanto aos efeitos 
  • Ato jurídico: é aquele em que os efeitos emanam da lei, ou seja, a vontade da parte não pode controlar os efeitos. Aqui a vontade é simples (ex.: casamento, reconhecimento de filhos, entre outros); 
  • Negócio jurídico: neste a vontade da parte pode determinar os efeitos, ou seja, o negócio só produz as consequências que a parte desejou. Aqui a vontade é qualificada (ex.: contratos, testamento - porque produz os efeitos que o testador quer).
Dentro dessa corrente, alguns autores ainda, distinguem o ato jurídico do ato-fato jurídico, em que não existe sequer vontade inicial de praticá-lo, mas, quando ocorrido, os efeitos emanam da lei. A vontade é irrelevante (ex.: descoberta ocasional de um tesouro, os atos socialmente aceitos praticados por criança). Entende-se também que a posse é ato-fato jurídico.
O negócio jurídico exige agente capaz, ao passo que a capacidade só é requisito do ato jurídico nos casos em que a lei a exigir (CC, art. 185). Assim, o absolutamente incapaz que descobre um tesouro, adquire-lhe também a propriedade. Se fosse exigida dele capacidade, esse ato seria nulo.
2) Requisitos de Existência do Ato e do Negócio Jurídico

São aqueles necessários para a formação do ato jurídico e do negócio jurídico. 

O Código Civil não os disciplina, pois o legislador parte do pressuposto de que eles já existem (e que se analisaria somente a validade). 

No entanto, de acordo com o Professor Orlando Gomes, são os seguintes os requisitos de existência: 

a) Declaração de vontade

b) Objeto

Outros autores, no entanto, exigem a Forma como terceiro requisito de existência. 
  • Negócios jurídicos inexistentes são aqueles que não reúnem os elementos necessários para a sua formação (ex.: casamento realizado pelo Delegado de Polícia);
  • O negócio inexistente e o ato inexistente não se confundem com o ato nulo e o negócio nulo, isso porque, aquele (inexistente) não produz qualquer efeito e nunca poderá convalidar-se (já o ato nulo pode produzir efeitos em homenagem à boa-fé de uma ou de ambas as partes, nos casos de putatividade).

3) Requisitos de Validade

Quanto à validade, os requisitos encontram-se previstos no art. 104:
Art. 104. A validade do negócio jurídico requer:
I - agente capaz;
II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável;
III - forma prescrita ou não defesa em lei.
O negócio jurídico eficaz é aquele que está apto a produzir efeitos. Portanto, após análise de todos esses requisitos (existência, validade) temos que o ato jurídico e o negócio jurídico podem ser: 

a) Válido e eficaz: válido porque preenche os requisitos do art. 104 e eficaz porque está pronto para produzir efeitos; 

b) Válido e ineficaz: válido porque preenche os requisitos do art. 104, porém, não está produzindo efeitos (ex.: pendência de uma condição suspensiva); 

c) Inválido e eficaz: não preenche os requisitos do art. 104, todavia, está produzindo efeitos (ex.: casos de nulidade relativa enquanto esta não for pronunciada judicialmente).


4) Elementos dos Atos e dos Negócios Jurídicos 

Os elementos dos atos e dos negócios jurídicos podem ser assim classificados: 

4.1) Elementos Essenciais

São aqueles sem os quais o ato ou então o negócio simplesmente não existe (ex.: na compra e venda, são elementos essenciais a coisa, o preço e o consentimento);


4.2) Elementos Naturais

São as consequências automáticas do ato ou do negócio, e dispensam menção expressa (ex.: na compra e venda, a obrigação do vendedor é de entregar a coisa e a do comprador é de pagar o preço);


4.3) Elementos Acidentais

São as cláusulas acrescentadas ao ato ou ao negócio jurídico e que têm por finalidade modificar suas consequências naturais. Necessitam de menção expressa. É o caso da condição, do termo e do modo ou encargo. 
  • Em regra, todos os atos e negócios jurídicos admitem condição, termo e encargo, principalmente aqueles que têm caráter patrimonial. No entanto, embora tenham caráter patrimonial, a aceitação e a renúncia da herança não admitem condição e termo - art. 1.808. Ademais, referidos elementos não podem ser inseridos nos atos que digam respeito ao estado da pessoa e naqueles referentes ao direito de família puro (ex.: emancipação, casamento, reconhecimento de filhos etc.).
Passa-se ao estudo desses elementos acidentais dos atos e dos negócios jurídicos.


5) Da Condição 

Condição é o evento futuro e incerto que subordina a eficácia do negócio jurídico. 

Conforme previsto no art. 121, o legislador trata apenas da condição que deriva exclusivamente da vontade das partes. Ele não cuida da condição legal ou necessária, pois a sua inclusão é inócua, já que ela decorre da própria natureza do ato ou do negócio (ex.: Antônio será meu herdeiro se sobreviver a mim). 


5.1) Elementos da Condição

a) Futuridade do evento: evento futuro é aquele que ainda não aconteceu. Se já aconteceu, não é condição, mas ato puro e simples, ainda que a parte ignore a sua ocorrência, mas no entanto somente produzirá efeitos se realmente se verificou;

b) Incerteza do evento: evento incerto, por sua vez, é o que pode ou não ocorrer. É necessário que a incerteza seja objetiva, real, e não meramente subjetiva, fruto da ignorância do agente. Tratando-se de evento futuro e certo, como por exemplo a morte, haverá termo e não condição (ex.: eu te dou a minha casa no dia em que Pedro morrer). Não será caso de termo, mas sim de condição se o sujeito disser “eu te dou a minha casa se Pedro morrer antes de Antônio”. 


5.2) Classificação das Condições 

5.2.1) Quanto à Participação da Vontade do Agente

a) Casual: é aquela que depende de acontecimento fortuito, ou seja, do acaso, sobre o qual a vontade não exerce qualquer controle. Ela é válida (ex.: eu te dou R$ 1.000,00 se amanha chover);

b) Potestativa: é aquela subordinada a vontade de uma das partes, e subdividem-se em:
  • Puramente potestativa: é aquela que se sujeita ao arbítrio exclusivo de uma das partes, independendo, portanto, de qualquer fator externo. Ela é ilícita, conforme art. 122, 2ª parte, e invalida todo o negócio jurídico, por força do art. 123, II;
  • Simplesmente ou meramente potestativa: é aquela que se sujeita ao arbítrio de uma das partes, mas também de fatores externos que escapam ao controle da parte. Referidas condições são lícitas, de forma que o negócio praticado é válido. 
c) Mistas: são aquelas que dependem da vontade de uma das partes e também de um fato casual, ou então, da vontade de uma das partes juntamente com a vontade de terceiro. Elas são lícitas e, portanto, o negócio praticado é válido (ex.: “te dou R$ 1.000,00 se você se casar com Maria” = depende da vontade dele e de Maria. Ex.: te dou R$ 1.000,00 se você caminhar na chuva amanhã = depende da vontade dele e de um evento da natureza).


5.2.2) Quanto aos Efeitos Produzidos

a) Suspensiva: é aquela que impede a eficácia do negócio jurídico até a realização do evento futuro e incerto. Aqui, o negócio só adquire eficácia após o implemento da condição (ex.: vou te dar a minha casa se o Brasil ganhar a copa do mundo de futebol). Referida condição deve ser analisada sob 3 estados diferentes: 
  • Estado de pendência: é aquele que perdura enquanto não se verifica o evento futuro e incerto. Nos termos do art. 125, nesse estado, não há direito adquirido. No entanto, e nos termos do art. 130, o titular do direito condicional pode praticar atos destinados a conservá-lo;
  • Estado de implemento da condição: é aquele que gera a aquisição do direito que, portanto, de condicional passa a ser adquirido (ex.: o Brasil ganhou). 
  • Estado de frustração: dá-se quando não se verificar o evento futuro e incerto (ex.: o Brasil perdeu). Neste caso, é como se a estipulação nunca houvesse existido. 
Obs.: com o implemento da condição, a parte passa a ter o direito adquirido. Referida aquisição, porém, opera efeitos ex tunc, ou seja, desde o início da celebração do negócio jurídico.
b) Resolutiva: é o evento futuro e incerto que, uma vez ocorrido, provoca a extinção do direito. Aqui, o negócio aperfeiçoa-se desde logo, mas a sua eficácia fica ameaçada pelo acontecimento futuro e incerto (ex.: dou a Antônio a minha casa em comodato, mas referido direito se extinguirá no dia em que ele passar no concurso). Referida condição também deve ser analisada sob 3 diferentes estados: 
  • Estado de pendência: neste caso, a parte desfruta do direito que, no entanto, está ameaçado de extinção pelo implemento da condição (ex.: ele ainda está morando na casa);
  • Estado de implemento da condição: aqui, o negócio é desfeito automaticamente, extinguindo-se, portanto, o direito anteriormente adquirido (ex.: ele passou); 
  • Estado de frustração: o direito continua sendo exercido diante da inocorrência da condição (ex.: ele reprovou). 

5.3) Distinção entre Condição e Encargo

Encargo é a cláusula imposta nos negócios gratuitos e que acaba por restringir a vantagem do beneficiado (ex.: eu faço a doação deste terreno a você, para que nele seja construído um hospital).

O encargo não se confunde com a condição suspensiva, pois a condição impede a aquisição e o exercício do direito, enquanto que o encargo não suspende nem a aquisição nem o exercício do direito  (ex.: o lote já é seu, você deve construir, sob pena de execução da obrigação de fazer). O encargo é coercitivo, pois a pessoa pode ser constrangida a cumprir com a obrigação imposta, salvo se esse encargo tiver caráter personalíssimo. Já a condição não coage, porque ninguém pode ser obrigado a submeter-se a uma condição. Com efeito, se o encargo não for cumprido, o interessado pode mover ação judicial visando o adimplemento da obrigação. Já na condição, não lhe assiste essa faculdade. Percebe-se, portanto, que no encargo, antes mesmo que a obrigação seja cumprida, a pessoa já adquire o direito, porque ele não suspende nem a aquisição nem o exercício do mesmo.

  • Nos termos do art. 137, considera-se não escrito o encargo ilícito ou então impossível, mas o negócio avençado é válido (ex.: te dou o carro se você mesmo consertá-lo). No entanto, se esse encargo foi posto como sendo a razão determinante para a prática do negócio, ele invalida todo o negócio (ex.: te dou o carro se você atropelar fulano). 

6) Do Termo

Termo não se confunde com o prazo. Termo é o acontecimento futuro e certo em que começa ou termina a eficácia do negócio jurídico. Prazo, por sua vez, é o lapso de tempo entre o termo inicial e o termo final (ver art. 132 e §§). O termo pode ser: 


6.1) Elementos do Termo

Futuridade e certeza.


6.2) Dos Termos

6.2.1) Inicial ou Suspensivo

É aquele que suspende o exercício do direito (ex.: a doação da casa terá início a partir do dia 1º de agosto de 2020). Nos termos do art. 131 do CC, o direito sob termo é considerado direito adquirido;


6.2.2) Final ou Resolutivo

É aquele que extingue o direito (ex.: o contrato de locação se extinguirá no dia 1º de agosto de 2020).
  • A extinção em razão do advento do termo produz efeitos ex nunc. Já na condição resolutiva, os efeitos são ex tunc, salvo quando se tratar de negócio de execução continuada ou periódica. 
  • Conforme art. 135, as disposições relativas à condição suspensiva e resolutiva serão aplicadas, no que couber, ao termo inicial e ao termo final.
6.2.3) Certo

É aquele que se reporta a um fato certo e com data certa (ex.: eu te darei um carro quando você completar a maioridade civil ou então no início da primavera). 


6.2.4) Incerto

Não se confunde com a condição, a qual é sempre incerta.

Termo incerto é aquele que se refere a um fato certo, mas cuja data de ocorrência é incerta (ex.: eu te dou uma casa no dia em que Pedro morrer - a morte é um fato certo, mas não se sabe quando ocorrerá). 


6.3) Distinção entre Termo e Condição

Termo é evento futuro e certo (o termo incerto é o que vai acontecer, só não se sabe quando). Condição é evento futuro e incerto (pode não acontecer).

Termo final tem efeitos ex nunc (na data do termo, incide a extinção do negócio, extinção esta que vigorará desde então). Condição resolutiva tem efeitos ex tunc (o negócio vige até que se resolva, quando então se extingue; portanto, o direito vigeu até a condição, isto é, todo o período anterior à resolução, por isso é assim considerado 'retroativo').


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