Concurso de Crimes
1) Introdução
É o instituto que cuida da pluralidade de crimes praticados pelo mesmo agente mediante uma, duas ou mais condutas.
No concurso de crimes, surgem duas situações:
a) Concurso homogêneo: os crimes são idênticos (ex.: dois roubos, dois furtos, etc.);
b) Concurso heterogêneo: os crimes são diferentes (ex.: uma lesão e um homicídio, etc.).
O CP estabelece 3 espécies de concurso:
2) Concurso Material - CP, art. 69
É aquele no qual o agente, mediante duas ou mais condutas, pratica dois ou mais crimes (ex.: João, descuidadamente, engata a primeira marcha e atropela a sua cunhada, ferindo-a; na sequência, engatou a ré e atropela sua sogra, mantando-a; portanto, praticou uma lesão corporal e um homicídio culposos na direção de veículo automotor.
- Consequência: é a somatória das penas, pois aqui o CP adotou o sistema do acúmulo material de penas.
3) Concurso Formal - CP, art. 70
Trata-se de instituto criado para beneficiar o agente, que mediante vontade única, pratica mais de um crime, evitando penas exageradas. Neste caso, o agente, mediante uma conduta, pratica dois ou mais crimes, dando lugar a duas situações:
a) Concurso formal próprio, ou perfeito - art. 70, caput, 1ª parte: neste caso, por excelência, os crimes decorrem de um único propósito (ex.: João, atrasado para o trabalho, descuidadamente engata a 1ª marcha e atropela a sogra, a cunhada e a mulher, ferindo a primeira, e matando as demais);
- Pode acontecer em crimes culposos (como no exemplo acima), bem como em crimes dolosos (ex.: Antônio entra no ônibus e subtrai de 5 pessoas diferentes).
- Consequência: a pena de um dos crimes tão somente, a saber, a do mais grave se diferentes, ou a de qualquer um deles se idênticas, será aumentada de 1/6 até 1/2 (atropela 5, é punido por no máximo por 1 e 1/2; furta de 5 e responde por apenas 1 e 1/2 no máximo);
- O único critério que define este aumento de 1/6 até 1/2: é o número de crimes praticados - STF. Inclusive, doutrina e jurisprudência sugerem a seguinte tabela:
- 2 crimes = 1/6;
- 3 crimes = 1/5;
- 4 crimes = 1/4;
- 5 crimes = 1/3;
- 6 crimes ou mais = 1/2.
Neste ponto, o CP adotou o sistema da exasperação da pena.
b) Concurso formal impróprio, ou imperfeito - art. 70, caput, 2ª parte: neste caso, os dois ou mais crimes praticados mediante conduta única decorrem de desígnios autônomos, isto é, vontade deliberada de praticar cada um dos crimes (ex.: João quer matar, de forma definida, a sua sogra, sua cunhada e sua mulher, e para tanto explode a casa que ocupavam).
- Consequência: somatória das penas, pois aqui foi adotado o sistema do acúmulo material, evitando indevido benefício de criminoso que deliberadamente quer praticar mais de um crime mediante conduta única;
- Concurso material benéfico: trata-se de um instituto previsto no art. 70, Parágrafo único, criado para proteger o benefício sugerido no instituto do concurso formal. Como já visto, o concurso formal próprio foi criado para beneficiar o agente; portanto, não pode prejudicá-lo. Desta maneira, quando a pena resultante da incidência do aumento de 1/6 até a metade for maior que a somatória das penas, este dispositivo determina sejam somadas as penas;
- Isto acontecerá quando dois crimes praticados mediante conduta única têm penas muito discrepantes, isto é, um tem a pena muito alta e o outro muito baixa.
4) Crime Continuado - CP, art. 71
É uma ficção jurídica, pois a realidade demonstra a prática de mais de um crime, mas para beneficiar o agente, evitando penas exageradas, o CP adotou a teoria da ficção, segundo a qual esses crimes praticados mediante mais de uma conduta devem ser considerados um crime só.
O exemplo clássico é o do mordomo que mensalmente subtrai uma garrafa de vinho da adega do patrão.
Com a reforma penal em 1984 surgiram duas situações de crime continuado: a do caput e a do Parágrafo único.
a) Crime continuado simples - art. 71, caput: neste caso o agente pratica dois ou mais crimes da mesma espécie conectados por semelhanças de tempo, lugar, modo de execução, entre outros. Por esta razão, os demais devem ser considerados como parte do primeiro, isto é, como um crime único (ex.: o do mordomo acima);
- Consequência: aumento da pena de um dos crimes tão somente, qual seja, a do mais grave, se diferentes, ou a de qualquer um deles, se idênticas, na proporção de 1/6 a 2/3;
- Aqui igualmente, o único critério que define este aumento é o número de crimes praticados; da mesma forma, doutrina e jurisprudência sugerem a seguinte tabela:
- 2 crimes = 1/6;
- 3 crimes = 1/5;
- 4 crimes = 1/4;
- 5 crimes = 1/3;
- 6 crimes = 1/2;
- 7 crimes ou mais = 2/3.
- O CP define requisitos objetivos na caracterização do crime continuado:
- Crimes da mesma espécie: orientação mais rigorosa exige seja o mesmo tipo penal, ainda que consumado ou tentado, simples, privilegiado ou qualificado. De outro lado, orientação menos rigorosa admite a continuidade entre crimes semelhantes que ofendam o mesmo bem jurídico (ex.: furto e apropriação indébita; roubo e extorsão.
Conexão entre os crimes: semelhanças. As mais comuns são:
- Conexão temporal: entre cada crime, como regra, não pode haver intervalo superior a 30 dias. No caso concreto, poderá haver intervalo superior (ex.: funcionário que todo natal rasga o pneu do carro do patrão);
- Conexão espacial: como regra, os crimes devem ser praticadas ou, no máximo, em cidades vizinhas. No caso concreto, poderá haver conexão espacial entre crimes praticados em cidades bem distantes (ex.: aeromoça que vai furtando durante sua escala de trabalho);
- Conexão modal: os crimes devem ser executados da mesma maneira (ex.: com os mesmos comparsas, todos mediante escalada, etc.);
- Outras formas de conexão (ex.: ocasional, tal qual o ladrão que vai roubar um condomínio, percebe a facilidade e volta nos dias seguintes).
Além dos requisitos objetivos, exige-se requisito subjetivo na caracterização do crime continuado, isto é, o agente deve ter unidade de desígnios na sua prática?
- Orientação majoritária atual exige também requisito subjetivo, consistente na unidade de desígnio. Portanto, está sendo adotada a teoria subjetivo-objetiva - STJ;
- Alguns autores, porém, discordam desta exigência, porque ela tornaria o instituto letra morta no CP; a prova deste elemento subjetivo é muito difícil, além do quê favoreceria apenas criminosos audaciosos que de antemão podem planejar crimes em continuidade.
b) Crime continuado específico - art. 71, Parágrafo único: se verifica diante de crimes dolosos da mesma espécie praticados com violência ou grave ameaça à pessoa, contra vítimas diferentes (ex.: tarado que na mesma semana estupra 7 mulheres diferentes no mesmo bairro).
- Consequência: aumento da pena do crime mais grave (se diferentes) ou a de qualquer um deles (se idênticas), até o triplo.
É pacificado que o aumento mínimo é de 1/3, como acontece no caput;
Aqui, além do número de crimes praticados, outros critérios também definem este aumento, tais como a culpabilidade, personalidade, circunstâncias do crime, etc.;
- Aqui também deve ser respeitada a regra do concurso material benéfico do art. 70, Parágrafo único;
- Também deve ser observado o limite de 30 anos estabelecido no art. 75 do CP;
Quando houver crimes violentos da mesma espécie praticados contra a mesma vítima, somente poderá incidir o instituto do caput. Caso contrário, haveria analogia em malam partem;
Este parágrafo único consagra a possibilidade de continuidade delitiva em crimes violentos, e torna superada a Súmula nº 605-STF, que proíbe continuidade em crimes contra a vida.
5) Prescrição em Concurso de Crimes
A prescrição no concurso de crimes sempre será calculada separada e individualizadamente em relação a cada crime - art. 119.
No crime continuado, a prescrição deve ser calculada diante da pena concreta imposta sem o aumento ou antes do aumento decorrente da continuidade - Súmula nº 497-STF.
A mesma regra vale para o cálculo da decadência.
6) Multa
A multa no concurso de crimes deverá ser somada, conforme o art. 72. Todavia, há uma corrente que entende que no crime continuado, por conta da teoria da ficção jurídica, mesmo a pena de multa deverá sofrer aumento, nos termos do art. 71, e não somatória.
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